Isolamento: Professores relatam como as aulas remotas afetaram o dia a dia

Conversamos com professores sobre como foram alteradas as rotinas diárias diante do coronavírus e a produção e acessibilidade das aulas

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Com a pandemia do coronavírus, o isolamento social forçou alguns serviços principais do dia a dia a se tornarem virtuais para manter o distanciamento seguro e conter a contaminação. Por isso, conversamos com arte-educadores – os professores de artes – sobre como foram alteradas as rotinas diárias diante do coronavírus e a produção e acessibilidade das aulas.

A educação foi um dos pontos mais afetados dessa mudança brusca e nunca antes vivida nessa geração. As aulas remotas passaram a ser a ferramenta principal dos profissionais da educação para não permitir que os alunos percam conteúdo durante o isolamento.

Isolamento: Professores relatam como as aulas remotas afetaram o dia a dia
Mesa da cozinha da professora virou palco para as gravações (Reprodução, Arquivo Pessoal)

A professora Luciana Félix dá aulas há 20 anos para crianças da educação infantil que ainda estão em fase de alfabetização. Segundo ela, as atividades de interação são um dos pontos principais para que as crianças mais novas aprendam, mas com o isolamento esse momento ficou dificultado.

“Esse ano atípico veio colocar na balança até mesmo nossa prática educativa. Estamos nos adaptando (ser humano é extremamente adaptável) da forma que podemos. Não apenas minha rotina, mas de toda família foi alterada”, relata a professora.

Para gravar os vídeos que envia aos alunos, a professora transformou a mesa da cozinha em um estúdio caseiro e conta com a ajuda dos filhos para editar as produções. Além disso, Luciana relembra a necessidade de reinvenção diária e o atendimento aos pais em horários não convencionais.

“Não contamos com horário como temos em tempos de normalidade. Recebo foto às 22h, questionamentos após às 20h. E sei que é o horário que aquela família teve para sentar com meu aluno e realizar a atividade do dia. Em contrapartida, as mães têm acesso e liberdade através do aplicativo para conversar, uma conversa mais demorada do que na porta da sala de aula”, explica.

Isolamento: Professores contam como as aulas remotas afetaram o dia a dia
Atividades lúdicas e experiências são imprescindíveis na educação infantil (Reprodução, Arquivo Pessoal)

Luciana e as colegas de trabalho não descartam as atividade em folha para garantir acesso de todas as crianças. No entanto, ressaltam que a educação infantil não se restringe a registros. A aprendizagem das crianças se dá nas relações com o outro, o que não é garantido nesse momento. Por isso, voltam às atividade para os pais ajudarem com as experiências.

“Não podemos contar uma história e olhar nos rostinhos deles as expressões de surpresa ou deleite. Mandar um vídeo não substitui a leitura feita pela professora, com mudança de voz, uso de fantoche ou acessórios. Não há o momento em que eles perguntam o que aconteceu com o personagem, ou ficam bravos com o desfecho”.

Maior elaboração e ensino democrático

Já a arte-educadora na rede municipal Adriana Klein, há 15 anos como professora, ressalta que a educação pública de qualidade e gratuita sempre se reinventou, e com certeza vai sair dessa, mais fortalecida devido às desigualdades agora mais evidentes.

“Para quem é professor de Educação Básica, as relações interpessoais, fazem parte do trabalho. Toda nossa formação, desde a graduação é feita para o modelo presencial. Só quem tem uma sala de aula sabe as dores e as delícias de se ter aquelas pessoinhas, de todos os tamanhos, interagindo com você”, ressalta Adriana.

Com o isolamento social, o trabalho triplicou na pesquisa e elaboração para uma aula que seja mais autônoma, em que a família, que acompanha o aluno, pudesse auxiliá-lo durante processo de aprendizagem.

Na rede Municipal de Ensino, a professora conta que trabalha com dois momentos: na elaboração de cadernos de atividades, que será entregue ao aluno e por um meio digital as orientações e complementos.

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Adriana Klein é arte-educadora há 15 anos e ressalta a importância da democratização do acesso ao ensino (Reprodução, Arquivo Pessoal)

“Como sou arte-educadora, tenho alunos de 4 a 14 anos. Para os alunos menores, cada orientação vem acompanhada de vídeos explicativos, quase um passo a passo, Tenho que me dirigir aos familiares e orientá-los como proceder, já que esses alunos não leem. Com os alunos maiores, tenho usado uma adaptação de uma metodologia, em que o aluno é orientado ao auto estudo, procuro utilizar plataformas digitais, jogos eletrônicos e até mesmo usando o celular para elaborar e postar suas atividades”, relata a professora.

Além do conteúdo, Adriana frisa que o acesso dos alunos às aulas também é um ponto importante, democrático e com materiais que podem ser encontrados em casa para que não haja saídas desnecessárias arriscando a saída das crianças ou pais.

“Procuro diversificar para que os alunos possam aprender de forma divertida, com os materiais que têm em casa. Temos famílias numerosas com 3 ou 4 crianças e um celular pra todas, por exemplo. Pra mim a maior dificuldade é a anti democratização das tecnologias. Tudo isso tem que ser colocado na conta”, ressalta.

Fora de quadra

Isolamento: Professores contam como as aulas remotas afetaram o dia a dia
Professor Thiago Vaz já estava acostumado com a produção de vídeos no Youtube mas frisa a necessidade da atenção dos pais nas aulas remotas (Reprodução, Arquivo Pessoal)

O professor de educação física Thiago Vaz dá aulas para alunos de 8 a 16 anos e teve que se reinventar para que os alunos assimilassem a nova dinâmica educacional, principalmente na parte prática.

“Eu sou professor da Rede Municipal e como não possuímos material didático impresso – livros que contemplem a todos – eu sempre busquei ferramentas tecnológicas que estendesse a sala de aula para fora dela. Mas ouvi relatos de colegas que tiveram muitas dificuldades para adaptar-se a situação. Sempre trocamos ideias em grupos de WhatsApp para melhorarmos nossas aulas.

Mesmo antes do isolamento, Thiago já criava materiais, apresentações diversificadas e registro em vídeos no Youtube para que os alunos tivessem acesso a qualquer momento. A experiência foi fundamental para adaptar as aulas, mesmo que remotas. O professor também chama a atenção para a necessidade do auxílio dos pais na educação.

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Fora das aulas e das quadras, aulas que eram práticas tiveram que ser adaptadas (Reprodução, Arquivo Pessoal)

“Sabemos da dificuldade, mas eles deveriam estar ao nosso lado e dedicar a atenção aos filhos, incentivando-os a organizar uma rotina, realizar as atividades, retornar suas dúvidas. O explicar, demonstrar, ensinar fica por nossa parte. O que precisa é ter comprometimento. Na educação atual, estamos colhendo o reflexo de uma geração que transmitiu a escola uma extrema responsabilidade que não lhe cabe. A baixa presença dos pais na escola, principalmente dos alunos do ensino fundamental 2 preocupa a nós professores. Na educação básica, é imprescindível a presença dos pais dentro da escola”, ressalta.

Nessa quinzena, o professor de Educação Física planejou um trabalho didático da unidade temática de Brincadeiras e Jogos, onde o tema principal era Jogos de Tabuleiros. Foram executados 3 jogos diferentes, partindo da parte teórica, elaboração dos tabuleiros e experimentação por parte dos alunos.

Sobre os lados bons das aulas remotas, Thiago ressalta que existem mas que os alunos e pais não estavam preparados para uma mudança tão brusca na realidade das escolas. Muitos não possuem a estrutura necessária para acompanhar as aulas, principalmente em tempo real.

“A grande maioria, possui apenas um aparelho celular, internet limitada e muitos pais ainda precisam sair para trabalhar e quando retornam, os alunos não executam e não acompanham o desenvolvimento das aulas” finaliza.

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