Campo Grande é rota da Ilza, a ‘baixinha arretada’ que passa semanalmente de carreta pink
Caminhoneira descobriu a paixão pela estrada ainda na infância, quando o pai a levava junto em viagens. Ilza vive este sonho há 16 anos e conta os desafios diários
Graziela Rezende, Nathalia Alcântara –
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Dirigindo um caminhão pink personalizado Brasil afora, Ilza Ferreira, de 45 anos, descobriu a paixão pela estrada ainda na infância, quando o pai a levava junto em viagens, em um veículo que ela definiu como um “caminhãozinho velho”. Baixinha arretada, vive este sonho há 16 anos e tem Campo Grande, como parte da rota, semanalmente.
“Minha paixão pela estrada começou quando meu pai era motorista de caminhão da prefeitura da minha cidade, em Mandaguari, no Paraná. Eu não tinha nem carteira, nem nada. Mas, ele me carregava dentro daquele caminhãozinho velho pra cima e pra baixo e aí eu fui gostando, sabe?! E eu falava: Ah não, quando eu crescer, vou ser motorista de caminhão e aí foram passando os anos, mudei minha carteira e fui atrás das primeiras oportunidades”, afirmou.
Iniciante no ramo, Ilza não teve facilidade. “Bati em várias portas, falei com várias empresas e é lógico, ninguém dava, porque não tinha muita motorista mulher naquela época, mas, eu nunca desisti. Fui batendo em portas, batendo, até que uma empresa me deu uma primeira oportunidade. Lá eu trabalhei um ano, peguei registro e depois as portas se abriram para mim. Eu tinha 24 anos na época e, graças a Deus, estou até hoje. Foi um sonho realizado”, relembrou.
‘Ainda tem motorista que não aceita mulher no volante’
Sobre a rotina, Ilza ressalta que é difícil, porém, já melhorou muito e ela acredita que será ainda melhor no futuro. “A vida do caminhoneiro não é fácil. Na estrada a gente sofre um pouco, sabe. No meu caso, tem ainda muita discriminação pelo fato de eu ser mulher. Tem discriminação até entre motorista homem. Ele não aceita mulher no volante”, comentou.
Quando falam o que pensam, a motorista diz que alguns geralmente dizem: ‘Acho que o lugar da mulher é em casa, cuidando de casa, de filhos, de comida e assim por diante’. “Então, assim, eles mesmo, os próprios motoristas nos discriminam nas estradas. Mas, por outro lado, temos bons postos, com banheiros, comida, pátio com segurança, tudo isso ajuda hoje, principalmente para as mulheres e, em vista de antigamente, está bom até demais e, se Deus quiser, vai melhorar mais ainda”, falou.
Há cerca de 4 anos, quando houve uma greve da categoria, Ilza relembra que permaneceu 11 dias instalada no pátio de um posto. “Foi a coisa que mais marcou na minha vida. Eu fiquei em Cuiabá e, graças a Deus, ele deu um amparo bom para nós todos que estávamos ali naquela greve. A gente comia, bebia, tinha segurança, tinha tudo ali e não nos faltou nada. Fizemos muitas amizades, conhecemos motoristas de vários lugares. Foi a parte que mais me marcou, mais marcou na minha vida”, argumentou.
Caminhoneira deixou tempo mostrar ‘erro’ na fala de gerente
Das amizades às provações, Ilza comenta o episódio, em que ouviu um não de um gerente e ainda foi obrigada a ficar quieta diante de uma fala preconceituosa. “Quando tirei a minha primeira categoria, ninguém dava oportunidade. Teve uma empresa uma vez, que um gerente me respondeu que o meu lugar era na cozinha, lavando roupa e cuidando de casa. E daí eu falei que um dia ele iria se arrepender do que ele estava falando, tanto é que passou o tempo, voltei na mesma empresa dele”, disse.
Ao retornar, o homem não só pediu para contratá-la como disse que compraria um caminhão para ela. “Falei não, muito obrigado, não quero, estou muito bem onde estou. Eu também não desfiz dele. Apenas mostrei para que o que ele tinha falado, da primeira vez, tinha que engolir. E hoje tem bastante oportunidade para mulher. Tem lugar inclusive que, se aparecer mulher, só querem mulher, preferem muito mais para trabalhar”, comenta.
Atualmente, ainda conforme Ferreira, muitos gestores constataram que estas funcionárias “dão menos trabalho no cuidado com o caminhão e são mais atenciosas nas estradas”. “Você pode ver que é difícil ouvir falar que uma mulher bateu um caminhão, discutiu em tal lugar, tombou, então, as empresas hoje, até a seguradora de transportadoras dão descontos para os empresários que compram caminhão e contratam mulher. É mais barato o seguro, então, eles estão dando mais oportunidades para as mulheres”, avaliou.
Mesmo assim, Ilza fala que o público feminino ainda é muito restrito nesta categoria. “Acho uma pena terem poucas, porém, conheço muitas que estão entrando no ramo e dando baile, dando o maior orgulho para nós, mulheres e, principalmente, mostrando que não tem diferença nenhuma entre os homens, que ganham igual e fazem a mesma coisa”, afirmou.
‘Minha carreta é branca e pink’, diz caminhoneira
Quando o assunto passou a ser a carreta personalizada, Ilza falou com brilho no rosto. “A minha é uma carreta container, eu puxo exportação. Transporto carne para exportação nos Portos de Paranaguá, Santos, Itajaí, Itapoá e Navegantes, em Santa Catarina. É branca e pink, personalizada. O patrão pintou por isto, por eu ser mulher ele achou que tinha que fazer uma diferença na empresa. Ela chama atenção, é uma carreta ‘MAN 440’ a marca, é o que eu escolhi”, contou, orgulhosa.
Apaixonada pela profissão, Ilza finaliza dizendo que “jamais pensou em arrumar outro emprego”. “Estou na estrada, profissionalmente, desde 2012. Já trabalhei com caminhão, ônibus, vários tipos de veículos, então, tenho experiência que já dá para contar história. Em Campo Grande, passo toda semana, é o caminho da minha rota, estou sempre por aí com minha carreta pink”, finalizou.
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