O momento é bastante delicado. Muita gente está frágil, oscilando as emoções e com as percepções afloradas, no primeiro dia pós-eleição. É o extremo dentro de cada um e especialistas dizem que, infelizmente, muitas pessoas deixaram de entender a real necessidade de estarmos em grupo e em família e aconchego.

“É a ideia de manter o pensamento do outro atrelado às próprias convicções e isto, neste período, fez com que muitas relações perdessem o verdadeiro sentido, o ombro amigo, a cumplicidade e o companheirismo. Nesta ausência abriu-se espaço para cobranças, julgamentos e rejeições duras e implacáveis com o outro”, afirma ao MidiaMAIS a terapeuta cognitivo comportamental, Alecssandra Sayd Castro, de 49 anos.

Desta forma, ainda segundo a terapeuta, “é preciso resgatar o que me fez querer estar perto daquela pessoa, o que me fez permitir estabelecer elos de confiança, respeito e amizade. Qual o valor desta figura que se fez presente em minha vida por tantos momentos?”

Nestes casos, a terapeuta defende que todos devam se “olhar nos olhos e permitir um novo abraço”, deixando o amor prevalecer. Da mesma forma, a psicóloga Vânia Arashiro, de 61 anos, argumenta que as pessoas precisam entender que o ser humano é único, que “não existem pessoas iguais e que a psique é única, portanto, todos temos formas diferentes de sentir, agir e pensar”.

Foto: Marcos Ermínio/Jornal Midiamax
Foto: Marcos Ermínio/Jornal Midiamax

“As opiniões, os pontos de vista, dependem muito não só da ótica da pessoa, mas, também das emoções, do humor, da aprendizagem, da cultura, de como elaborar e processar mentalmente cada estímulo, em forma de assuntos, de crenças, de ideologias. Muitas vezes podemos nos identificar com outras pessoas e, a partir daí, termos as mesmas opiniões ou, pelo menos, que sejam parecidas e outras vezes não”, comentou Arashiro.

‘O que é certo para um, é errado para outro', diz psicóloga

Quando as opiniões são divergentes, a profissional ressalta que isto não significa que “exista um certo ou errado”. “O que é certo para um, é errado para outro. Lembrando que, em muitas situações, podem existir normas, regras a serem seguidas e ainda assim podem ser contestadas, tudo depende de um conhecimento prévio do que está sendo abordado”, argumentou.

Foto: Marcos Ermínio/Jornal Midiamax
Foto: Marcos Ermínio/Jornal Midiamax

Mas e aí, posso impor as opiniões quando tenho certeza que estou certo? Ainda conforme a psicóloga, a resposta é não. “Posso debater com o outro a minha forma de pensar e meu entendimento, isso pode gerar uma discussão que deve ter uma característica positiva, que possa agregar conhecimento, que possa principalmente trazer um crescimento pessoal para ambos os lados”, explicou.

Isto vale não só para este período, de atrito eleitoral, mas, para qualquer pessoa que queira defender as suas ideias e os seus ideais. “O que não pode é se deixar levar por sentimentos negativos e por extremismos, como ter certeza de que é o dono da verdade e isto não existe, como falado anteriormente. Após o resultado das eleições, a vida segue normalmente, continuamos nossos trabalhos, continuamos com nosso cotidiano e é muito importante que possamos continuar com nossas amizades”, avaliou.

É preciso ter autocuidado consigo e com o próximo

Neste caso, Vânia fala que é preciso ter um autocuidado consigo e com o próximo. “Temos que analisar os fatos ocorridos, os vínculos com as pessoas, saber reconhecer os próprios erros e, principalmente, ter flexibilidade, o que é fundamental em qualquer relacionamento. Passamos por um período pandêmico, onde nos isolamos de muitos amigos, nos tornamos muito solitários, porém, precisamos do momento de um encontro, um abraço, uma palavra de conforto, já que muitos perderam entes queridos, então, não podemos nos deixar levar pela intolerância, pelas diferenças individuais”, afirmou.

Mas, devo continuar com amizades mesmo com divergências políticas?

Vale a pena reatar? Claro que sim! Claro, pensando, principalmente, sobre o significado desta amizade na sua vida, sobre momentos em que esta companhia trouxe crescimento e desenvolvimento pessoal, sobre o quanto pode valer a pena superar os sentimentos feridos e os mal-entendidos. “Pense, reflita, seja flexível, a vida é muito boa para vivermos com mágoas e ressentimentos, somos seres relacionáveis, não individuais”, disse Arashiro.

‘Excluí, fui excluída e não me arrependo', diz cuidadora de idosos

A cuidadora do idosos Glória Maria Arce, de 61 anos, que se diz “PT até morrer” e comemora a vitória do candidato Lula, comenta que excluiu pessoas do seu perfil e também foi excluída, sendo que não se arrepende de nenhuma destas situações.

“Nestes dias todos que se passaram muita gente me excluiu, eu excluí também, só não perdi a amizade, porque cada um tem a sua opinião. Não me arrependo. A gente tem direito de votar em quem a gente quiser. No recebi um monte de coisas que não gostava e não bloqueei ninguém, mas, no sim, fui desfazendo amizades. Faz parte, é assim mesmo”, disse.

O balconista de farmácia, Neto Sandim, de 38 anos, ainda amarga a derrota do candidato Jair Bolsonaro. No entanto, está levando na esportiva e diz que ele é quem vai “ser político” agora.

“Somos um país em que a fala que somos livres para escolhas. Mas, para mim existem pessoas que votam sem saber ou ler sobre o que o candidato fez no passado. Me envolvi nas brigas porque achei muito triste ver colegas de trabalho e jovens apoiarem a criminalidade”, finalizou.