Justiça determina fim do uso do pátio do Detran-MS para vistoriadoras terceirizadas sem licitação

Apesar de constatada a irregularidade, ex-diretor-presidente ‘se livrou’ de ação

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Detran-MS
Vistoria no pátio do Detran-MS. (Foto: Guilherme Cavalcante, Arquivo, Jornal Midiamax)

A 1ª Vara de Direitos Difusos, Coletivos e Individuais Homogêneos de Campo Grande anulou parte de uma portaria do Detran-MS (Departamento Estadual de Trânsito de Mato Grosso do Sul) que dava às ECVs (Empresas Credenciadas de Vistoria) o direito de atuar dentro das dependências do órgão. O diretor-presidente à época, Luiz Carlos de Rocha Lima, foi excluído da lista de réus.

Esta é uma ação civil pública proposta pelo Sindetran (Sindicato dos Servidores do Detran). Em setembro de 2020, mesmo sob críticas, a autarquia terceirizou os procedimentos no interior do Estado, renunciando a uma receita estimada em R$ 28 milhões.

O sindicato sustentou na petição inicial que a Portaria “N” 68/2020 viola a Resolução Contran 466/2013, ao permitir terceirizadas nos pátios. Assim, pediu a anulação do parágrafo 2º do artigo 6º, que permite às empresas atuarem dentro das dependências do órgão.

O Detran não apresentou contestação e alegações finais no processo. Mas, em defesa prévia, alegou que o fim da exclusividade “causaria grande prejuízo à administração pública por ocasionar a interrupção do serviço de vistoria”.

A defesa de Rocha Lima apontou que apenas o Estado poderia denunciá-lo por qualquer ato suspeito. Além disso, o direito administrativo prevê o uso de bens públicos por particulares.

Na sentença, o juiz Ariovaldo Nantes Corrêa observa que a permissão de empresas atuando dentro do Detran-MS “fere os princípios constitucionais administrativos e da livre concorrência”.

“Ao longo dos anos, houve sistemática depredação do patrimônio público com a redução de servidores efetivos (defasagem de pessoal), sobretudo em atividades finalísticas do órgão, como é a vistoria veicular”, pontuou.

O magistrado ressalta que a permissão de uso de bens públicos por terceiros deve ser de natureza precária, ou seja, temporária. No caso, o serviço deveria ser licitado, e não entregue diretamente às ECVs.

“Como se vê, a autorização de uso das instalações do órgão de trânsito pelas ECVs para fim de atendimento de município que não disponha de meios próprios para a realização de vistoria veicular ou no qual não haja empresa habilitada, ainda que de forma precária como feita pelo artigo 6º, § 2º,da Portaria ‘N’ 68/2022 do Detran-MS, é incompatível com as exigências do artigo 5º da Resolução 941/2022 do Contran (anterior Resolução 466/2013) por criar direitos não autorizados pela norma que lhe deu origem, o que não se pode admitir, pois, com amparo nos princípios da legalidade e da simetria, a lei ou ato normativo secundário não pode modificar, adicionar ou restringir direitos estabelecidos na lei ou ato normativo primário”, conclui.

Por outro lado, Nantes Corrêa entendeu que o ex-diretor-presidente não poderia ser responsabilizado, já a edição da portaria não foi um ato pessoal “de modo que o ato praticado é tido como manifestação de vontade da própria administração pública e não do agente responsável por sua edição, razão pela qual não justifica sua inclusão no polo passivo desta ação”.

Assim, o juiz decidiu pela nulidade do trecho da portaria que permite as vistoriadoras atuarem dentro da autarquia, incluindo nas cidades sem meios próprios ou empresas habilitadas.

A decisão foi assinada em 8 de maio, disponibilizada nos autos na noite de segunda-feira (15) e publicada na edição desta quinta-feira (18) do Diário da Justiça.

Vistorias terceirizadas

Um mês após voltar atrás e afirmar que continuaria realizando as vistorias veiculares, o Detran (Departamento Estadual de Trânsito de Mato Grosso do Sul) informou que parte dos procedimentos no interior do Estado seriam feitos exclusivamente pelas empresas terceirizadas. Com isso, o órgão renuncia receita estimada em R$ 28 milhões.

Na época, diante da decisão do órgão em agosto e do prejuízo milionário, uma denúncia teria sido feita na corregedoria e na ouvidoria. O valor do prejuízo representa 11,6% do orçamento anual do Detran, que gira em torno de R$ 240 milhões.

À reportagem, o Detran-MS justificou que a decisão de transferir a exclusividade nas vistorias é devido ao efetivo, pois, segundo o órgão, muitos servidores estão afastados do trabalho devido à pandemia do coronavírus e seguem trabalhando de casa. Além disso, o órgão afirma que “não há impedimento legal”, diante da Resolução Contran 466/2013, que impeça a medida.

“Nos últimos meses, o Detran-MS tem sofrido com a falta de recursos humanos, em decorrência da pandemia de coronavírus que se espalhou pelo mundo afora, acarretando o afastamento de diversos servidores que se enquadram nos grupos de risco […] as agências do Detran se encontram com o quadro reduzido de servidores nas agências do Detran, levando a falta de recursos humanos para execução do serviço”, disse em trecho de nota.

O Detran-MS afirmou que todas as ações operacionais são decididas e comunicadas aos gerentes regionais e das agências e que, por enquanto, apenas em Campo Grande a medida não foi adotada.

Vale lembrar que, na ocasião, o sindicato argumentou que a terceirização implicaria em prejuízo aos servidores que atuavam na gestão das vistorias executadas no Pátio do Detran-MS. Segundo informou a direção do Detran-MS, na época, os trabalhadores iriam ficar como auditores de vistoria.

Outro ponto levantado pelo Sindetran-MS é o fato de que as ECVs não são autorizadas a vistoriar alterações de característica de veículos nem de chassi e motor.

*(Alteração às 9h13 para correção de informação)

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