Com leitura labial e ‘aulas visuais’, Isaac se tornou 1º doutor surdo da Engenharia de MS
Isaac é do Rio Grande do Norte, mas se mudou para MS em 2016 e decidiu seguir para o doutorado
Fábio Oruê –
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Do interior do Rio Grande do Norte para a banca examinadora da UFMS (Universidade Federal de Mato Grosso do Sul), Isaac de Medeiros, de 45 anos, tornou-se o 1º doutor surdo no programa de Ciência e Engenharia da universidade.
Nascido em Caicó (RN), Isaac se mudou para Mato Grosso do Sul em 2016, acompanhando a esposa, que assumiu um cargo no IFMS (Instituto Federal de MS) em Corumbá. Ele é surdo com resquícios da audição. Com isso, ele consegue se comunicar verbalmente, mas de forma parcial.
“Era muito comum na época que fui alfabetizado induzirem os surdos a falarem. E como eu escutava minimamente os sons, também foi um processo gradativo me ver como surdo e ser inserido nessa comunidade”, explica ao Jornal Midiamax.
Comunicação verbal
Durante a formação acadêmica, Isaac não teve tradutores, já que era habituado à comunicação verbal. Entretanto, garante que encontrou um ambiente acolhedor em MS.
“Professores e colegas sempre dispostos a repetir, a passar informações que eu não entendia por conta da baixa audição. Eu me sentava sempre na frente, pois também uso leitura labial, e muitos professores passavam texto para auxiliar e tornavam suas aulas mais visuais, o que me auxiliava”, relata.
“Mas observo que precisamos evoluir em vários quesitos de acessibilidade. Se eu só usasse libras, eu só conseguiria me comunicar com a presença de um intérprete”, reflete o doutor sobre a falta de pessoas que conseguem entender a Libras (Língua Brasileira de Sinais).

1º doutor surdo
Isaac entrou no programa de doutorado da UFMS em 2019 e defendeu seu projeto neste mês. No programa, o engenheiro trabalhou com desenvolvimento de materiais que fazem fotocatálise. Ele utilizou a energia solar para produzir hidrogênio a partir da água.
“O tema que mais me atrai é a produção de energia limpa. Precisamos ter outras opções e de preferência que não poluam o meio ambiente”, diz. Segundo Isaac, MS investe muito em educação e inovação e, com o doutorado, penso em continuar estudando o mercado local e abrir uma startup de energia limpa.
Sul-mato-grossense por desejo do destino, o doutor ficou surpreso ao chegar ao Estado em 2016. “Logo que cheguei ao Pantanal fiquei grato por ir para uma região em que a cultura é tão forte, o povo acolhedor e uma natureza que emociona”, revela à reportagem.
Da infância
Isaac é o filho mais novo de quatro irmãos. “Tive uma infância que foi atípica e comigo as coisas aconteciam mais tarde. Falar foi mais tarde que meus amigos. Para escrever também precisei de um tempo a mais. Enquanto isso, não tive atraso nas brincadeiras, tenho boas recordações”, lembra ao Jornal Midiamax.
Para ele, a escola foi um desafio, já que frequentou uma unidade para pessoas ouvintes. Nesse processo, a figura da mãe foi fundamental para Isaac. “Minha mãe contratou uma professora de apoio que me ensinou oralizado. Minha família, especialmente minha mãe, me deram muito suporte quando eu era pequeno para conseguir oralizar”, explica.
Aos 16 anos, ele se mudou para Natal (RN), onde terminou o ensino médio e ingressou na universidade. Conforme ele, a vida acadêmica não era uma possibilidade até que se inscreveu como aluno especial no mestrado da UFRN (Universidade Federal do Rio Grande do Norte).
“Gostei de ter contato com pessoas que nunca param de estudar e que estão antenadas com tudo que acontece. A questão da energia limpa é hoje um assunto atual e inesgotável”, diz.

Apoio
Durante a fase acadêmica, contou principalmente com o apoio da esposa, Samara. “Minha esposa é professora do IFMS e também fez pós-graduação. Ela me incentivou muito durante o período de mestrado e doutorado. Fazer pós-graduação é um exercício solitário e árduo. Quando temos alguém para conversar, e entende nossa rotina e acredita em nós, é muito bom”, reflete Isaac.
Nesses 45 anos de vida, Isaac aprendeu com os livros e com a vida e agora pretende impactar na sociedade com as tecnologias que o levaram a ocupar o lugar onde está. “Que os espaços precisam ser ocupados por nós da comunidade surda de maneira que mais surdos apareçam, para isso precisamos de oportunidades como qualquer pessoa”, finaliza.
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