Documentos relatam morte de jovem picado por cascavel no Hospital Regional

Pai de rapaz que morreu depois de 11.40h sem tomar soro antiofídico dentro do HR obteve prontuários e laudo da Polícia Civil

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Pai de rapaz que morreu depois de 11.40h sem tomar soro antiofídico dentro do HR obteve prontuários e laudo da Polícia Civil

Laudo da Coordenadoria-Geral de Perícias, datado de 21 de dezembro de 2011,  relativo ao caso de Márcio de Souza, que morreu no PAM do Hospital Regional, em 6 de novembro de 2011, revela uma dúvida dos médicos quanto aos primeiros sintomas apresentados pelos rapaz.
Ao entrar no HR, Márcio declarou ter usado droga em um banho na cacheira Inferninho, em Campo Grande e, no mesmo local, ter sido picado por uma cobra cascavel – a que tem um das piores peçonhas no Brasil.

O documento, baseado no prontuário médico do caso, afirma: “Paciente usuário de basta base, refere ter usado droga quando estava em cachoeira e ter sido mordido por cobra, e era cascavel; Diagnóstico: usuário de droga ou alucinação?”

Estas foram as dúvidas iniciais sobre o que estaria vitimando o rapaz de 28 anos, depois de ter entrado no PAM do Hospital Regional, às 23.50h do dia 5 de novembro de 2011. Antes disso, Márcio passou por um posto municipal de saúde, às 07.30h da noite, e de lá foi enviado para o HR.

A avaliação clínica segue descrevendo que,  apesar de Márcio ter insistido em falar que fora picado por cascavel, não havia sinais da lesão.

Segundo o prontuário, o calcanhar esquerdo não apresentava “porta de entrada e ausência de aumento de volume local”.  Márcio, consciente, se queixava de dores pelo corpo inteiro, e muita sede.

Provavelmente, estes já eram os primeiros efeitos do veneno se espalhando pelo corpo, carregado pelo sangue. Só depois dos resultados de  exames que mediram o tempo de coagulação do rapaz, feitos às 02.50h da madrugada, soube-se que o seu sangue estava “incoagulável” – um efeito do veneno. 

O relatório do caso informa que, ao ser consultado por telefone, o atendente do Civitox (Centro Integrado de Vigilância Toxicológica da secretaria estadual de Saúde) não orientou o médico do HR para que  aplicasse o soro contra veneno de cascavel.

O Civitox operava dentro do HR, mas foi deslocado para o centro da cidade em função de reformas no pronto socorro. Orientações, só via fone, não mais pessoais.

Quadro de saúde se complicou pela manhã

Pela manhã, a avaliação clínica descreve que Márcio tinha fortes dores musculares, dificuldade em movimentar o pescoço, pálpebras dos olhos caídas, muito suor, sangue na urina, mas ainda estava consciente.  O rapaz passou por outros exames às 09.40h .

Os novos resultados revelaram que o sangue de Márcio continuava “incoagulável”.
Um exame que mede a coagulação, chamado TTPA (tempo de tromboplastina parcial ativa) tem um índice normal de 30.6, mas o de Márcio era de 114. E outro exame chamado TAP (tempo de atividade de protrombina) tem padrão de 11,9, mas chegava aos 120.

Depois destes resultados mais graves, o relatório afirma que o Civitox orientou os médicos para a aplicação de soro anticrotálico.

O soro contra veneno de cascavel foi aplicado às 11.30 h, ou seja, depois de 11.40 minutos de Márcio ter entrado pelas portas do PAM do Hospital Regional. Ou 17.30h depois de ter sido socorrido pelo Samu, na porta de casa, com as mesmas queixas de picada de cascavel. 

Rapaz ainda passou por exame psiquiátrico

No final da manhã do dia 6/11, Márcio estava muito agitado com os efeitos neurotóxicos do veneno.

Nesse momento, revelam os documentos, o rapaz passou por avaliação psiquiátrica porque se supôs que a agitação seria decorrente de “abstinência”.

“Paciente apresentando agitação psicomotora, talvez por abstinência, já está com hadol no soro; sugiro lorazepam e dormonid”, registra o prontuário médico. Márcio ainda recebeu midazolam (indutor do sono) às 11.40h.

Àquela altura, o seu ritmo cardíaco era irregular (Rci) e Márcio teve uma parada cardíaca, com perda de pulso (PCR em AESP). Foram 40 minutos de tentativas de reanimação, mas em vão.
A morte do rapaz foi declarada às 12.30h. 

Oficialmente ainda não há respostas sobre o caso

O pai, Milton, conta que “correu atrás dos papéis para conseguir tudo”, como explica, ainda lamentando a morte prematura do filho, há dois meses.

“Sinceramente, eu ainda não acreditei, não estou acreditando no que aconteceu. Talvez agora, depois do acontecido, quem sabe os médicos estão mais capacitados para esses tipos de casos. Deveriam ter feito um exame rápido, para descobrir se era uma coisa ou outra, não só no dia seguinte, aplicar o certo”.

Em relação ao inquérito que está correndo na Policia Civil, e em uma sindicância dentro do próprio HR, Milton de Souza conta que, até agora, não fui procurado por ninguém.
“Ninguém procurou a gente, ninguém vem saber, mas eles devem saber o acontecido com o falecimento dele. Não sei se querem colocar um pano em cima”. 

No começo da tarde de ontem, a reportagem solicitou informação à assessoria de imprensa do governo do Estado sobre o andamento da sindicância anunciada pela direção do HR.

No dia da morte de Márcio, a direção do hospital divulgou nota dizendo que iria investigar o caso “mesmo com as evidências  de que em nenhum momento houve omissão de socorro ao paciente”.
A resposta foi prometida para o dia e hoje.

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