Luiz Carlos Saldanha faz resgate da magistratura em Mato Grosso do Sul
Ele começou a trabalhar aos 16 anos de idade, quando teve os primeiros contatos com a Justiça, durante a época do colégio. Formou-se em direito em 1976, em Campo Grande, na Universidade Católica Dom Bosco, então Fucmat. Ingressou na magistratura em 1983, em Campo Grande. Esse é início da trajetória do advogado criminalista, juiz aposentado, […]
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Ele começou a trabalhar aos 16 anos de idade, quando teve os primeiros contatos com a Justiça, durante a época do colégio. Formou-se em direito em 1976, em Campo Grande, na Universidade Católica Dom Bosco, então Fucmat. Ingressou na magistratura em 1983, em Campo Grande. Esse é início da trajetória do advogado criminalista, juiz aposentado, e professor, Luiz Carlos Saldanha Rodrigues, que também foi presidente do Ttribunal de justiça Desportiva do MS, membro da diretoria da Amamsul (Associação dos Magistrados de Mato Grosso do Sul), além de ter exercido a magistratura em Corumbá .
Conviveu com muitas histórias de transformação do Poder Judiciário desde a década de 1960, antes e depois da divisão do Estado, fatos que, inclusive, pretende reunir em um livro sobre o resgaste histórico da magistratura de Mato Grosso do Sul. “Antes da divisão do Estado, eram muitas as dificuldades, como por exemplo, para chegar à Comarca de Porto Murtinho”, lembra.
Saldanha recorda um fato curioso e lamentável, quando “um impostor tomou posse no lugar do juiz, fez empréstimos, e usou nome do verdadeiro juiz”. O golpista só foi descoberto dois meses mais tarde, na década de 60.
Como juiz, Saldanha atuou em diferentes cidades de Mato Grosso do Sul, como Bataguassu, Nova Andradina, Sidrolândia, Ponta Porã, entre outras. Em 1992, veio para uma vaga distrital em Terenos (a cerca de 35 kms de Campo Grande). Ao mesmo tempo, foi um dos fundadores do 2º Juizado Criminal, na capital. Foi onde criou o sistema de arrecadação de cestas básicas nos julgamentos (nas transações penais), para os casos de delitos de menor potencial.
“O novo sistema de punição era uma verdadeira contribuição social. As cestas recolhidas ajudavam a abastecer muitas entidades locais, como asilos. Mas chegou uma época em que estava até sobrando cestas. Vieram então outras ideias, como as cadeiras de rodas e as doações de sangue”, comentou. “Julgamento é uma transação. Em 60 audiências, em média, se hoje 20% fossem de doações de sangue, já resolveríamos o problema do Hemosul”.
Criou também o projeto “semi-adoção de menores excepcionais”. Nos casos de acidentes de trânsito com vítima fatal, a pessoa ficava responsável pela formação e educação de um menor excepcional. “Um mecanismo que encontramos para amenizar a dor de familiares que perderam entes queridos nos acidentes de trânsito naquele tempo. O resultado foi muito satisfatório”.
Juizado Especial
“Se os juízes fossem escolhidos realmente com ‘perfis para juizados especiais’, tínhamos evoluído muito mais, teríamos mais resultados. Mas (numa vara comum) transformamos o magistrado que apenas pune o réu. Buscávamos o motivo do problema e trabalhávamos em cima da causa. Numa infração cometida por influência do uso de álcool, o culpado tinha que fazer terapia, se tratar. Conseguimos recuperar várias pessoas com projetos assim”, conta.
Até em crimes de sonegação de imposto, lembrando um caso antigo, um grande atacadista foi punido com pagamento de 365 cestas básicas. “Matamos a fome de muitas crianças do Preventório (uma entidade assistencial dedicada à formação e ao atendimento de menores carentes), hoje, Educandário Getúlio Vargas.
Lei 9.099/95
“Mato Grosso do Sul foi o primeiro a lançar esse projeto social, mas quando veio a Lei Federal 9.099, os projetos foram perdendo força”, ressaltou Saldanha.
A Lei Federal 9.009, de 1995, em resumo, trata da criação de juizados especiais, providos por juízes togados, ou togados e leigos competentes para a conciliação, o julgamento e a execução de infrações penais de menor potencial ofensivo. Entre os critérios aplicáveis, se destacam a celeridade, economia processual, informalidade e simplicidade. “Nosso objetivo não era apenas punir o réu, mas contribuir com algo importante em benefício da sociedade. O juiz precisa se aventurar em fazer mais pela ressocialização e colaborar para o avanço da sociedade como um todo”, ressaltou.
Tem tecnologia, mas ainda faltam investimentos
De acordo com Saldanha, a tecnologia ajudou muito o poder judiciário. Ele cita que, atualmente, o SAJ, um programa para movimentar a justiça, pode agilizar o trabalho excessivo dos juízes.
“Mas um juiz apenas não pode dar conta de 5 mil processos. A máquina ajuda sim, porém falta sempre a decisão humana do magistrado. Juiz é só um para julgar, então ele tem que ter tempo, acompanhar o processo e julgar com cautela”. Saldanha criticou também o “repasse do duodécimo, que não permite novas contratações. Com a falta de recursos, não há como criar novas varas, por exemplo.”
“Em São Paulo, atualmente, se alguém entrar com uma ação, só para o processo começar a ser distribuído, leva uns dois anos”, comparou. Já numa ação indenizatória, devido à grande demora, comentou que a pessoa pode esperar um resultado para longo prazo, para o filho ou, em muitos casos, para o neto. Para ele, falta observação dos poderes para uma melhor distribuição de renda no Sistema Judiciário, o que impede também novas contratações e trava o setor.
O risco para os juízes
Outro assunto apontado por Saldanha é o risco que os juízes correm no Brasil. Atualmente, está em pauta a morte de Patrícia Acioli, assassinada no mês passado, no Rio de Janeiro. Mas, para ilustrar ainda mais, Saldanha cita outro exemplo, que vem da Itália, onde foi elaborado “Juízes das Garantias”, usado principalmente na grande luta da “máfia” contra os magistrados.
Em resumo, o projeto “Juízes das Garantias” tira o magistrado da linha de frente, que seria função da polícia e do Ministério Público. “O juiz fica distante das partes, o MP encarregado de trazer provas. O mesmo juiz não pode investigar e julgar. Lá na Itália, os magistrados que vão julgar são aqueles que não têm contato direto com o inquérito policial, são outros juízes”, explica. Saldanha diz que essa é a tendência do modelo de Justiça no Brasil, um dos únicos países da América Latina que ainda não aderiu ao sistema.
Ética na profissão
Em meio a tantos cursos de Direito em atividade no Brasil, Saldanha não poderia deixar de comentar sobre a postura do advogado. Segundo ele, muitos profissionais do Direito deixaram de aprender o princípio da ética. “As instituições de ensino também não podem deixar de colocar em primeiro lugar o comportamento e a ética na profissão”.
Como exemplo, falou desde a aparência (modo de se vestir) até de agir de certos advogados em atuação. Lembrou uma situação registrada em Campo Grande, em que um advogado, para favorecer o cliente, chegou a “falsificar a assinatura do juiz responsável pelo caso”.
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