‘Somos alegres, temos medo de morrer’, diz haitiano detido ao buscar refúgio no Brasil

Professor Joseff Sejeexv, 35, estudou até o 2º ano do Ensino Fundamental e é o professor do grupo de 16 haitianos que após ser detido em Miranda, espera livre a autorização do governo para viver no Brasil

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Professor Joseff Sejeexv, 35, estudou até o 2º ano do Ensino Fundamental e é o professor do grupo de 16 haitianos que após ser detido em Miranda, espera livre a autorização do governo para viver no Brasil

Após sair de um país conhecido mundialmente pela miséria e que foi devastado por um terremoto que causou ao menos 200 mil mortes e deixou 1 milhão de pessoas desabrigadas, um grupo de 16 haitianos foi detido nesta semana em Mato Grosso do Sul, após entrar ilegalmente no Brasil, onde conseguiu refúgio.

Em entrevista ao Midiamax, Joseff Sejeexv, de 35 anos, o comunicativo professor do grupo conta que os haitianos buscam no Brasil aquilo que sempre ouviram de turistas: que o país é um lugar bom para trabalhar e que não tem terremoto.

Joseff sabe ler e escrever um pouco de português. A conversa com a reportagem aconteceu no Cetremi (Centro de Triagem e Apoio ao Migrante), onde os haitianos estão abrigados. Os haitianos falam o dialeto francês, Creole.

Midiamax: Seu nome completo?

Joseff: Joseff Sejeexv

Midiamax: Quantos anos você têm?

Joseff: 35 anos

Midiamax: Que bairro ou cidade você morava no Haiti ?

Joseff: La Maison

Midiamax: Tem Filhos?

Ele não entendeu e passou um número de telefone [73987118]. Depois que entendeu a pergunta caiu em gargalhadas e disse que não tem filhos.

Joseff: Não tenho

Midiamax: Quando você saiu do Haiti com destino ao Brasil?

Joseff: Vim escondido de ônibus e sai de lá dois dias antes do terremoto

Midiamax: Por que decidiu sair do Haiti e vir para o Brasil ?

Joseff: Os turistas que freqüentavam o Haiti sempre disseram que o Brasil era um lugar bom para morar, que não tem terremoto e tem como trabalhar.

Midiamax: Você veio com quantas pessoas?

Joseff: Vim com oito pessoas, somos todos amigos. A minha esposa e família ficaram. Os meus amigos também largaram a família deles e acabaram vindo.

Midiamax: Qual é a música que mais tocava no Haiti e que fazia sucesso?

Joseff: Quando sai de lá a música mais tocada era do músico Seal. Mas, lá, toca vários estilos. São músicas africanas que têm gingado como se fosse um Rock e Reggae misturado.

Midiamax: Conhece a música brasileira? Já ouviu falar em Carnaval?

Joseff: Carnaval é samba (com direito a sapateado tentando sambar)

Midiamax: Você trabalhava do que lá no Haiti ?

Joseff: Trabalhava e trabalho até hoje como professor

Midiamax: Até que série você cursou?

Joseff: Até a segunda série, mas como falo fluentemente o francês e o espanhol, acabei sendo tradutor e professor dos haitianos. E sempre atendi os turistas que visitavam o Haiti.

Midiamax: Por que você não terminou os estudos?

Joseff: Nem sei. Lá e difícil as pessoas continuarem os estudos. A maioria das pessoas aprende a ler e escrever e acaba parando os estudos. Lá tem até a quinta série, acima disso já é considerado superior.

Midiamax: Como você considera o Haiti?

Joseff: Haiti é considerado um país muito pobre, mas não são todas as pessoas que passam fome. Eu mesmo nunca passei fome no Haiti. Já senti falta de ter coisas melhores para comer e para vestir. Somos um povo feliz e não exigimos muita coisa para viver.

Midiamax: Como é o povo haitiano?

Joseff: Somos alegres, temos medo de morrer. Somos assim: basta ter o necessário para sobreviver [ comida e moradia] já ficamos bem.

Midiamax: O que você está achando do Brasil?

Joseff: Brasil tem gente gentil, são pessoas sérias e acolhedores.

Midiamax: E você está casado?

Joseff: Sim. Sou casado mas a minha esposa mora em outra cidade. Lá na Guiana Francesa.

Midiamax: Ela vem para cá?

 Joseff: Não sei. Tem três anos que falo com ela pelo telefone. Mas uso a minha aliança. E tenho esperança de ver ela aqui no Brasil. Eu não tive filhos com ela.

Midiamax: Você já passou por quais cidades ou países?

Joseff: Republica Dominicana, Bolívia, Peru. Aqui no Brasil eu já estive no Rio de Janeiro.

Midiamax: A sua esposa não te acompanha?

Joseff: Sou andarilho e busco um lugar para morar com paz. Lá no Haiti a questão de relacionamento é bem diferente dos outros países. Cada haitiano tem um jeito para namorar.

Midiamax: Como são as mulheres haitianas?

Joseff: São felizes e todas trabalham com vendas, manicure, pedicure, cabeleireira e costureira.

Midiamax: O que você está achando do povo brasileiro?

Joseff: Lá no Haiti não tem isso de beber e fumar em qualquer lugar. É difícil ver alguém com palitinho [ cigarro] na boca. A gente bebe e dança toda hora, mas não é álcool. Aqui é mais liberal isso. Eu mesmo não fumo. As mulheres são bonitas, diferentes.

Midiamax: Você quer voltar a morar no Haiti?

Joseff: Não

Midiamax: Por quê?

Joseff: Lá tem terremoto e não temos muitas coisas para sobreviver. Nunca passei fome porque sempre trabalhei para comer e se vestir.

Midiamax: Você falou com os seus parentes depois do terremoto?

Joseff: Perdi os meus irmãos e primos. Depois do terremoto, eu não consegui falar com a minha mãe. O meu pai já tinha falecido, estava desidratado e acabou morrendo.

Midiamax: Tem algo mais que gostaria dizer?

Joseff: Sim. Quem puder ajudar com roupas e comidas a gente fica mais feliz. 

A entrevista foi possível graças a ajuda do cabeleireiro Ênio Souza, 46, que já morou na França.

(Serviço: Quem puder ajudar os haitianos pode enviar um e-mail para [email protected] ou telefonar para o Midiamax – 3324-0082 com Alessandra de Souza)

 

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