Trabalho de ser mãe em MS: valor da dedicação solitária que não é somado na hora da pensão

As despesas são divididas, mas os esforços diários não são

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árduo trabalho
Paternidade é algo sem muita burocracia, mas o número de crianças sem o nome do pai no registro civil aumentou

Acordar mais cedo, levar ao hospital, precisar faltar no trabalho, ter aquela péssima noite de sono com o filho doente, são apenas alguns dos obstáculos enfrentados no dia a dia por mães de todo Brasil e do mundo. Trabalho este que não é considerado quando o assunto é o valor da pensão.

Joana* tem 27 anos. Ela trabalhava durante o dia em Mato Grosso do Sul e cursava enfermagem durante a noite. Mesmo tomando anticoncepcional, a jovem engravidou e as dificuldades começaram. O pai do bebê não aceitava e só assumiu a paternidade após realizar o pedido de DNA.

“Quando meu filho nasceu eu precisei parar a minha faculdade. Não tinha com quem deixá-lo no horário das minhas aulas e não tinha dinheiro para pagar uma babá. A gente acaba se deixando muito de lado, mas os nossos esforços diários não são vistos pela sociedade. Eu engravidei tomando anticoncepcional e as pessoas nos julgam. Amo meu filho incondicionalmente, mas todos precisam parar de romantizar a maternidade. As despesas são divididas, mas os esforços diários não são”.

A Defensora Pública Thais Dominato atende mulheres que são vítimas de violência doméstica. Ela conversou com o Midiamax e explicou que existem falhas na Justiça, ressaltando que falta perspectiva de gênero na fixação do valor da pensão alimentícia.

“Quando o valor da pensão é aplicado, não consideram o trabalho da maternidade. Em regra, a mãe que tem a guarda dos filhos e acaba ficando com toda responsabilidade de cuidar da criança. O amor não tem preço, mas os cuidados e o tempo gasto das mulheres são muito maiores. Noites sem dormir, levar e buscar o filho na escola e várias outras tarefas que passam despercebidas no momento que o valor da pensão é aplicada. Dividem os gastos, mas não os cuidados”, disse a defensora.

Paula* tem 34 anos, após ficar casada por quase uma década, ambos optaram pela separação. Uma criança de 5 anos foi fruto da relação do ex-casal, mas que praticamente foi ‘esquecida’ pelo pai.

“Ele cuidava da criança, mas depois que nos separamos deixou o próprio filho um pouco de lado e também não se preocupava se precisava de alguma coisa. Nunca barrei a relação de pai e filho, mas enquanto eu estava cuidando do menino sozinha, o pai estava nas festas. É um pouco triste dizer, mas ele preferia curtição, enquanto eu não tinha outra opção. Precisei entrar na Justiça para meu filho conseguir receber a pensão. É muita humilhação, mas é um direito da criança e o pai precisa ter responsabilidades. Mulher não faz filho sozinha”, desabafou.

Camila* de 28 anos passou pelo mesmo dilema de ter que acionar a justiça para conseguir que o filho receba a pensão que não estava sendo paga pelo pai.

“Quando a gente vai falar para o pai que o filho está precisando de fralda, de leite ou medicamento, meu ex ainda achava ruim, dizia que não tinha dinheiro. E se fosse comigo? E se eu deixasse de alimentá-lo por simplesmente estar sem dinheiro? O dinheiro que meu filho recebe não paga nem 30% dos gastos que ele realmente tem. Os gastos financeiros e as tarefas do cotidiano sempre acabam ficando com a mãe. As pessoas precisam parar de romantizar a maternidade, não é nada fácil. Não somos mães guerreiras, somos mães sobrecarregadas”, disse.

Número de crianças sem paternidade

Paternidade é algo sem muita burocracia, mas o número de crianças sem o nome do pai no registro civil aumentou, conforme o (Arpen-Brasil), Associação Nacional dos Registradores de Pessoas Naturais.

Ainda segundo o Arpen, em 2021, Mato Grosso do Sul teve quase 3 mil crianças sem o nome do pai no registro civil, sendo 786 em Campo Grande.

*Para não expor as mulheres, os nomes usados nesta reportagem foram fictícios.

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