Há 11 anos vivendo em MS, Júlia eternizou na pele a saudade do Nordeste
No dia do nordestino, jornalista é exemplo de quem deixou cidade natal em busca de novas oportunidades em MS
Clayton Neves –
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Na pele da jornalista Júlia Kaifanny a cidade de Alegrete do Piauí foi eternizada em forma de tatuagem. “Fiz pra nunca me esquecer das minhas origens”, explica. No braço, as coordenadas geográficas do município que fica ao leste do Estado e a 387 quilômetros da Capital Teresina.
Para a jornalista, a cidade pequena, com pouco mais de cinco mil habitantes, é o motivo para a imensa saudade que nunca deixou de existir, mesmo após anos vivendo em Mato Grosso do Sul. “Lá é o lugar onde sou livre e consigo ser eu por completo. Sonho em voltar, mas, por enquanto, isso não é uma realidade”, comenta.
No dia do nordestino, comemorado neste sábado (7), Júlia é exemplo de muitos que deixaram a cidade natal em busca de novas oportunidades em Mato Grosso do Sul. No caso dela, o primeiro contato com o Estado aconteceu aos 4 anos, quando os pais saíram de Alegrete do Piauí e vieram morar em Campo Grande. “Uns tios já moravam aqui e viemos também. Fiquei por aqui até os 7 anos e depois voltamos para lá”, conta.
De volta ao Nordeste, Júlia conta que viveu os melhores anos da vida. Na memória, lembranças da região rica em cultura que se dissolvia em diversas áreas. “Sinto que a fé é algo muito forte por lá. Em maio, por exemplo, todo mundo usava branco o mês inteiro por causa de Nossa Senhora de Fátima, que é a padroeira da minha cidade. Também tinham as festas de São João que movimentavam a cidade”, aponta.
Entre as recordações, a comida também ocupa lugar de destaque. “Comemos bastante beiju, cuscuz e carne de porco. Recentemente fui pra lá visitar e viajei ansiosa pela matança de porco para comer torresmo com beiju”, afirma.
Aprovada na universidade em Campo Grande, a jornalista deixou o Nordeste aos 19 anos, deixando para trás a família e amigos, e trazendo com ela a saudade e o desejo de um futuro melhor. “O período de adaptação foi difícil porque lá as pessoas são muito mais abertas. Aqui todo mundo é mais fechado e fica mais difícil fazer amizade. Minha sorte é que tive minhas primas”, revela.
Hoje, há 11 anos vivendo em Mato Grosso do Sul, Júlia procura manter rotinas que a mantenham ligadas à cultura nordestina, seja na alimentação, no cultivo de cactos ou em peças de decoração pela casa. “Eu divulgo a palavra do cuscuz, faço para todo mundo. Quando vejo um nordestino já me junto a ele para divulgar a palavra do nordeste”, brinca.
Aliás, com orgulho da terra de onde veio, a jornalista ressignificou um apelido dado ainda na época da faculdade. “Me chamavam de Piauí para encher meu saco, mas me apropriei disso e fiz com que realmente me conhecessem assim. Hoje, nas minhas redes sociais, sou a Piauí”, destaca.
Em meio a divergências políticas que colocaram a região no centro de ataques xenofóbicos, a piauiense se emociona ao comentar os ataques.
“Fico arrasada. O que mais escuto é gente perguntando porque não voltamos para lá. Independente de bandeira política, tem muita gente que é daqui, mora lá e é muito bem recebido. É triste escutar algumas coisas, ainda mais sabendo que a gente só sai de lá porque fomos invisibilizados e negligenciados pelo governo durante muito tempo”, finaliza.
Migração nordestina
Em Mato Grosso do Sul, o processo de migração nordestina começou na década de 40, quando os primeiros moradores chegaram ao Estado atrás de terras e oportunidades, concentradas a partir da construção de um grande complexo agrário federal em Dourados, que resultou no surgimento de assentamentos no sul de MS.
Reportagem do Jornal Midiamax publicada há um ano explica bem essa migração. Na época, o historiador e professor universitário, Eronildo Barbosa — paraibano que se fixou em MS há 35 anos – relatou que nordestinos vieram na condição de camponeses. “Na região de Dourados, o plantio era todo feito pelas mãos dos nordestinos”, contou Barbosa.
A reportagem ainda traz que os nordestinos continuaram migrando para MS em busca de oportunidades através de outros programas de reformas agrárias como em Terenos e Rochedo, inclusive nas décadas seguintes. “Aos poucos foram se espalhando, criando gerações e Campo Grande era a cidade que recebeu parte deles”, conta o professor.
Com o potencial agrário de MS sendo desenvolvido, o povo nordestino continuou chegando, inclusive nos dias atuais como é o caso de Chapadão do Sul, que recebeu muitos trabalhadores nordestinos recentemente. O município localizado no nordeste de MS, além de ter mais proximidade com a região Nordeste do país, também já possui grande comunidade nordestina, principalmente no bairro da Esplanada.
O mesmo ocorre em Três Lagoas e até na grande obra da fábrica de celulose em Ribas do Rio Pardo. “Três Lagoas tem composição nordestina imensa devido às obras na região de Três Lagoas e Ribas do Rio Pardo. Se for ali, vai encontrar gama de trabalhadores do nordeste”, finalizou Barbosa.
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