Centro de paraquedismo tem atividades suspensas após quatro mortes

O presidente da Confederação Brasileira de Paraquedismo disse esperar que a medida seja temporária

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Depois de registrar quatro mortes este ano, o Centro Nacional de Paraquedismo, referência internacional para esse esporte, suspendeu as atividades por tempo indeterminado, em Boituva, interior de São Paulo. A medida foi anunciada na noite de sexta-feira, 22, depois que a Justiça determinou a paralisação do lançamento de paraquedistas sobre as áreas urbanas.

No dia 19, o aluno de paraquedismo Andrius Jamaico Pantaleão, de 38 anos, morreu após cair sobre o telhado de uma casa. O presidente da Confederação Brasileira de Paraquedismo, Uellinton Mendes, disse esperar que a medida seja temporária.

Segundo ele, apesar da proibição judicial ser somente sobre saltos no trecho urbano no município, foram suspensas todas as atividades, “tendo em vista a necessidade de complexa readequação da operação de paraquedismo com as aeronaves, pilotos, escolas e instrutores”.

A decisão da Justiça de Boituva foi dada em representação judicial feita pela Polícia Civil, no inquérito que investiga a morte de Pantaleão. Conforme o delegado Emerson Jesus Martins, os saltos sobre a área urbana e a malha viária, que inclui um longo trecho da rodovia Castelo Branco (SP-280), podem acarretar novas mortes.

Ele lembrou acidentes anteriores em que os paraquedistas se chocaram com veículos na rodovia ou atingiram fiação elétrica. A decisão da justiça foi tomada “para que se evite que pessoas, coisas, objetos e aviões caiam, literalmente, sobre a cabeça e residência dos munícipes, protegendo-se, dessa forma, a salubridade dos cidadãos boituvenses, ofertando-se mais segurança a todos”.

Foi estipulada multa de R$ 50 mil por dia em caso de descumprimento da medida. A justiça também determinou a suspensão das atividades da escola de paraquedismo da qual Andrius era aluno, até a conclusão do laudo pericial sobre as causas do acidente.

Em reunião na tarde desta segunda-feira, 25, a Confederação Nacional de Paraquedismo, que mantém o Centro Nacional de Paraquedismo (CNP), a prefeitura e a Associação dos Paraquedistas de Boituva decidiram entrar com pedido de reconsideração da medida judicial que implicou a suspensão das atividades do CNP. Advogados da entidade protocolariam o pedido ainda nesta segunda-feira.

Caso a justiça local mantenha a proibição, o caso será levado ao Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP). No encontro, foi anunciado que uma comissão já realiza os estudos para melhorar a segurança dos saltos, evitando que os paraquedistas se projetem sobre a área urbana.

Impacto econômico

O Centro Nacional de Paraquedismo ocupa área de 99 mil metros quadrados, a 116 km da capital paulista, e tem cerca de 20 escolas em funcionamento. De acordo com a prefeitura de Boituva, é o local onde mais se salta de paraquedas no mundo, entre saltos turísticos e profissionais, promovendo aproximadamente 15 mil lançamentos por mês.

Já o CNP informou que são em média 100 mil saltos por ano. O local é utilizado também para o treinamento de atletas do paraquedismo esportivo. Em março deste ano, a cidade foi oficializada como “Capital Nacional do Paraquedismo”.

De acordo com Mendes, o fechamento acontece às vésperas do maior Campeonato Brasileiro de Paraquedismo, realizado pela Confederação Brasileira de Paraquedismo (CBPQ), com 96 inscritos, que tem início nesta terça-feira, 26, em Piracicaba, no interior paulista. “Vale vaga para a Copa do Mundo do paraquedismo, que será realizada em agosto de 2023, na Noruega”, afirmou.

O presidente da confederação, entidade que mantém o CNP, disse que está trabalhando em conjunto com as autoridades locais e a prefeitura para uma solução rápida para o problema. Uma das possibilidades é transferir as áreas de lançamento para pontos mais distantes na área urbana, em fazendas ao sul da atual sede do CNP.

Segundo ele, 300 famílias dependem diretamente das atividades envolvendo o paraquedismo. “Se não reabrir logo, elas vão passar necessidades. O prejuízo só não é maior do que o causado pela pandemia (de covid-19)”, disse.

Mendes disse concordar que é preciso trabalhar com o máximo de segurança, mas lembrou que os acidentes envolvendo paraquedistas nem chegam perto dos números de mortes em acidentes automobilísticos ou em assaltos. “Concordo que é preciso sempre melhorar a segurança, mas nosso código desportivo é muito rígido em relação a isso. São cerca de 5 mil paraquedistas ativos e trabalhamos para reduzir as possibilidades de que os acidentes aconteçam.”

Atualmente, o CNP é o local onde são registrados os principais recordes e realizados os eventos e campeonatos de paraquedismo do País. O presidente da Associação de Paraquedismo de Boituva, Marcelo Costa, disse que a suspensão das atividades no Centro Nacional de Paraquedismo (CNP) implicou na suspensão de cerca de dois mil lançamentos e de 800 saltos duplos apenas neste fim de semana. “O fechamento prejudica o comércio da cidade, incluindo o gastronômico e o de hospedagem. O turismo que vem a Boituva é em função do centro”, disse, pontuando ser importante que os paraquedistas possam “viver em harmonia com a cidade”.

A cidade de 63.310 habitantes convive com os paraquedistas desde a década de 1970, quando o núcleo urbano ainda não tinha se estendido aos arredores do campo de pouso usado para os saltos. Os moradores se dividem sobre o tema.

“Até que enfim uma boa notícia (sobre o fechamento). Não aguentava mais o barulho desses aviões sobre a cabeça o dia inteiro”, disse a dona de casa Adélia Gomes, que mora próxima do Parque Ecológico. Já o microempresário Ricardo Galindo defende o que considera uma marca local. “Boituva só é conhecida pelo paraquedismo e nada mais.”

Morador de Boituva há 38 anos, o advogado Luiz Carlos Paes Vieira disse que a ordem judicial não foi pelo fechamento. “Após a fatalidade envolvendo o aluno, foi decidida em liminar a determinação de não se realizarem saltos sobre a mancha urbana, daí as escolas, a associação de paraquedistas e o próprio centro tiveram o zelo de interromperem as atividades até buscarem protocolos de melhor atender a questão de segurança.”

Ele vê dificuldade em definir um ponto exato para o paraquedista pousar. “Ele salta a até 3 mil metros de altura, é hilário querer prever onde vai cair. O vento pode mudar a direção. A cidade está separada do paraquedismo apenas pela pista da Castelo Branco.

O advogado disse que o paraquedismo tem uma relação histórica com Boituva. “Eu lembro que em 1991 eu estava chegando a Florianópolis para passar o carnaval e me encontrei com rapazes que vinham do Uruguai e Rio Grande do Sul para passar o carnaval em Boituva, no centro de paraquedismo. É óbvio que a segurança vem em primeiro lugar, mas acredito que logo tudo vai ser retomado, tanto pela ligação histórica, quanto pelo acolhimento da população a essa atividade.”

O prefeito Edson Marcuzzo (PSDB) disse que o CNP é uma referência internacional, tanto do paraquedismo esportivo quanto do turístico.

“Em alta temporada chegamos entre 15 e 18 mil saltos por mês. Há mais de 50 anos o paraquedismo está instalado em Boituva, por isso é de extrema importância para a economia do município. Centenas de famílias sobrevivem da prática do paraquedismo em Boituva, por isso a suspensão das atividades é muito preocupante Isso impactará certamente a economia local. Somos municípios de interesse turístico. Acreditamos na justiça, no bom senso e nas medidas que estão sendo tomadas para ter cada vez mais segurança e melhores condições para os turistas, os atletas e a população”, afirmou.

Acidentes

Desde janeiro deste ano, houve quatro mortes por acidentes envolvendo paraquedistas em Boituva. No caso mais recente, do empresário Andrius Jamaico Pantaleão, a apuração inicial indica que não houve a abertura total do paraquedas principal, nem do reserva. Conforme o delegado Martins, é preciso aguardar a perícia para chegar a uma conclusão. A vítima atingiu o telhado de uma casa e foi ao solo, tendo sido encontrado já sem vida. O aluno era acompanhado por instrutor.

Em 11 de maio, dois paraquedistas morreram após o pouso forçado de uma aeronave que decolou do CNP com 15 pessoas a bordo – um piloto e 15 atletas. Outras dez pessoas ficaram feridas. Segundo o Corpo de Bombeiros, o avião apresentou problemas a cerca de 300 metros de altitude e o piloto tentou um pouso de emergência em uma área de pastagem.

A aeronave tocou o solo duas vezes antes de tombar com as rodas para cima. No dia 24 de abril, a sargento paraquedista do Exército Bruna Ploner morreu durante um salto com paraquedas de alta performance.

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