Objetivo era apurar “lesão ao erário causado por agentes públicos estaduais em benefício do governador de MS”

Mais um procedimento de apuração iniciado para investigar possíveis irregularidades em atos do Governo do Estado foi promovido ao arquivamento nesta quarta-feira (2) pelo Ministério Público Estadual de Mato Grosso do Sul. Desta vez foi arquivado um inquérito civil de 2008 que tinha como requeridos servidores da Sub-Secretaria de Comunicação da Secretaria de Estado de Governo.

A decisão foi tomada por unanimidade durante reunião do Conselho Superior do Ministério Público do Estado de Mato Grosso do Sul realizada nesta manhã. Todos os conselheiros acompanharam o relator, Olavo Monteiro Mascarenhas.

O Inquérito Civil, número 6/2008, teve origem na 31ª Promotoria de Justiça do Patrimônio Público e Social e das Fundações da comarca de Campo Grande, que tem como titular o promotor Alexandre Saldanha.

Segundo as informações divulgadas pelo MPE-MS, o objetivo era apurar eventual “lesão ao erário causado por agentes públicos estaduais, em benefício do Governador de MS e outros agentes políticos da administração estadual, devido à criação, produção e divulgação de informes publicitários pelos meios de comunicação (televisão, rádio, jornais e outros), objetivando a promoção pessoal”.

No entanto, segundo o Relator, houve a assinatura de TACs (Termos de Ajustamento de Conduta) e o Governo teria anuído às mudanças exigidas. O Corregedor-Geral do MPE-MS, Silvio Cesar Maluf, chegou a comentar durante a reunião de hoje sobre o procedimento de procuradores realizarem observações nos relatórios de colegas, citando Marcos Antonio Martins Sottoriva como exemplo.

O Corregedor-Geral foi quem publicou, exatamente um mês atrás, uma recomendação para que “os Procedimentos Preparatórios instaurados sejam arquivados, em regra, somente após esgotadas todas as possibilidades de diligências”.

“O arquivamento do Procedimento Preparatório instaurado pelos órgãos de execução das Promotorias de Justiça do Patrimônio Público e Social deve ser promovido fundamentadamente e somente após a realização de todas as diligências possíveis”, ensina o documento assinado por Maluf e publicado no Diário Oficial do MPE-MS de 2 de abril.

Problema antigo

Não é a primeira vez que a forma como o dinheiro utilizado na comunicação oficial do poder público de Mato Grosso do Sul é questionada. Inquérito aberto em 25 de agosto de 2002 (nº 139/2002) pelo Ministério Público se tornou ação que segue no STF com apuração de supostas irregularidades na contratação de agências de publicidade durante o Governo Zeca do PT.

Na época, o inquérito civil foi aberto no Ministério Público do MS a partir de decisões remetidas pelo Tribunal de Contas do Estado de MS a respeito de seis contratos entre o governo de MS e empresas de publicidade. O então chefe do Ministério Público do Estado junto ao TCE, Ronaldo Chadid, informou em ofício que um contrato de valor original de R$ 1 milhão sofreu 12 aditivos, atingindo no total R$ 4,25 milhões.

O valor, que chamou a atenção de Chadid na época, está abaixo dos valores que o atual Governo Puccinelli tem atingido em apenas um mês. No mês de agosto de 2011, por exemplo, foram R$ 5,8 milhões repassados para 14 agências de publicidade que cuidam da propaganda do governador André Puccinelli (PMDB).

Somente no último mês de fevereiro, mais de R$ 6,3 milhões deixaram os cofres de Mato Grosso do Sul para bancar gastos do Governo Estadual com comunicação.

Além disso, a prática de inúmeros aditivos continua. No último dia 24, por exemplo, o Governo Estadual publicou o décimo sétimo aditamento a diversos contratos que mantém com as agências de publicidade. No total, 16 contratações foram prorrogadas por mais três meses.

Segundo a assessoria de imprensa do Estado, a prática de ter contratos com prazos de validades menores e aditamentos constantes facilita a transparência, ajudando a combater fraudes com a verificação da situação cadastral das empresas a cada prorrogação.

Sem detalhamento

Mas o detalhamento de como é gasta a quantia milionária que mensalmente deixa os cofres de Mato Grosso do Sul através dos contratos com as agências de comunicação não é disponibilizado para consulta da população pelo Portal da Transparência.

Listadas como “outros serviços de terceiros – pessoas jurídicas”, as notas de empenho apontam apenas as agências de publicidade que gerenciam as verbas publicitárias do Governo, sem indicar os destinatários reais dos pagamentos. “Tudo é divulgado exatamente como manda a lei”, defende-se o Governo.

O dinheiro da comunicação é usado para pagar material de propaganda e jornais, websites, rádios e emissoras de televisão para transmitires mensagens de interesse do poder público sul-mato-grossense. Não se torna público pelo Portal da Transparência, por exemplo, quais websites de notícias recebem dinheiro do poder público estadual. Nem quanto recebe cada um dos órgãos de imprensa.

As agências garantem que mantêm as notas fiscais referentes aos pagamentos dos serviços custeados com a fortuna da comunicação, mas também não divulgam. Questionado sobre as notas fiscais que recebe dos prestadores de serviços, o diretor de uma das agências contratadas diz que não pode tocar no assunto.

“Isso é entre a agência e o cliente, que é o Governo. Se quiser ver essas notas e a comprovação das veiculações, basta procurar com eles”, explica.

Jornais bonzinhos

Entre os empresários de comunicação, principalmente os pequenos, há questionamentos sobre os critérios para escolher quem ‘entra na lista’. Donos de jornais em municípios do interior de MS dizem que receber mídia do Governo estaria sempre condicionada ao ‘bom comportamento’ dos órgãos de imprensa com relação ao governador André Puccinelli.

“Na verdade ninguém tem nada certo. Se você publicar alguma coisa que não vai agradar, corre o risco de ser cortado sim. Não adianta falarem que não, e a gente nem tem como provar. Mas, se pegar quem tá mamando, pode ver que são só amiguinhos. Nenhum fala mal do governador. Isso é até meio óbvio”, revela um empresário que pediu não ser identificado justamente para evitar as supostas represálias.

O Governo nega a prática. “O único critério utilizado é o técnico. Eu respeito a opinião de quem reclama, mas nem posso comentar. A única coisa que posso garantir é que todos os investimentos em comunicação do Governo Estadual são definidos com base em critérios técnicos”, insiste o subsecretário de comunicação do Estado, Guilherme Filho.

Para tomar a decisão de arquivamento de hoje, os membros do Conselho Superior do MPE-MS consideraram que os questionamentos iniciais do Inquérito Civil Público foram atendidos satisfatoriamente.