Crítica: Em ‘The Babadook’, monstro saído de livro é metáfora para tabu social
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Não é incomum que no segmento cultural do terror que engloba o cinema, muitos monstros, demônios e entidades nas produções representados sejam uma grande metáfora para temas importantes, alguns ligados até mesmo a tabus sociais. Os monstros do cinema assombram os seres humanos com a mesma intensidade que os problemas que encontramos pelo caminho. E lidar com um tabu – a falta de amor de uma mãe por seu filho, o fato de que ela é incapaz de cuidar de uma criança, derrubando na tela o mito da mãe amorosa e terna – o filme “The Babadook” faz com certa maestria.
O filme está disponível na Netflix há algum tempo, e neste fim de semana decidi assistir. Já me posiciono como uma pessoa que não gosta de filmes de terror e não os vê com frequência. Dou poucas chances à títulos do gênero por ser uma pessoa que não gosta muito de levar sustos. Mas o monstro Babadook me surpreendeu. O filme entrega o suspense que promete e não se prende a nenhum tipo de susto muito óbvio – embora abuse um pouco da subjetividade.
“Mr. Babadook” conta a história de uma mulher que, pouco antes de dar à luz ao filho, perde o marido num terrível acidente. Seis anos depois ela tenta “juntar” os pedaços dessa tragédia, e a princípio o roteiro nos faz crer que seu filho é um peso morto. Ela sofre de insônia, seu filho é retirado da escola pois constrói armas – que ele diz que são feitas para “pegar os monstros” e ela não se relaciona com ninguém. A angústia da mãe é rapidamente absorvida pelo espectador.
Ela não ama seu filho e isso fica muito claro. Ele sente isso, e transmite ao mundo sendo uma criança totalmente esquisita. Todas as noites ela não dorme direito, acorda tarde, perambula pelos cantos com uma expressão cansada e tenta minimizar os danos causados ao filho Sam, só que de um jeito bem relapso. Até que um dia, nessa rotina opressiva que é mostrada com cenas certeiras – a agonia dela quando a criança a abraça, por exemplo – o menino aparece com um livro daqueles do estilo “pop up” (que desenhos pulam nas páginas) chamado “Mister Babadook”, onde um monstro terrível assombra um menino.
Subjetividade
O filme deixa a entender que o livro sempre esteve ali. Será que Babadook também não esteve sempre ali, à espreita, como uma ideia nociva que todo ser humano tem mas oprime, e ela se externaliza de uma forma totalmente distorcida? Ponto para o filme.
O mais legal é que Babadook é quase uma versão australiana do “Homem do Saco”, aquele personagem genérico que nossos pais usavam para nos assustar quando crianças. Munido de uma cartola, mãos pretas assustadoras e uma sombra preta, sua caracterização não poderia ser mais culturalmente adaptada. Nosso pesadelo agradece: qualquer sombra na parede vira Babadook.
Quando o monstro ganha forças sugando a vida da mãe, ela vai se tornando o próprio Babadook, até tentar matar o próprio filho. Ou será que ela sempre teve esse desejo assassino e pouco natural de matar sua própria cria? O filme coloca o dedo justamente nesse tabu. Essa mãe jamais amou seu filho, de uma forma inconsciente o culpa pela morte do marido, se culpa por tudo e “deixa Babadook entrar”, como o próprio Sam define em um diálogo.
É a simplicidade de “Mr. Babadook”, além da trilha sonora acertada, que faz com que o filme seja uma boa distração para quem gosta do gênero. Nele, menos é mais, e os monstros humanos é que são os mais preocupantes.
Confira o trailer do filme.
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