Campo Grande é uma das capitais do agronegócio, onde a carne vermelha é amplamente consumida. Mas, por aqui, outra iguaria ganhou tanto espaço nos últimos 10 anos, que quase é possível encontrar um restaurante a cada esquina: os famosos sushis, de origem japonesa, fazem sucesso na cidade e ganharam diversas versões com o ‘toque brasileiro', servido com cheddar, bacon, azeitona e até Doritos.

Com 27 anos de carreira, Carlos Antônio Duarte – o ‘' – é pioneiro nesse ramo e foi um dos precursores da culinária em Campo Grande. Fã do estilo tradicional, ele até tentou manter a linha clássica nos restaurantes ao longo dos anos, mas não teve jeito: o campo-grandense gosta mesmo do bandejão.

China tem 42 anos de idade e metade da sua vida foi dedicada ao sushi. Nascido em Corumbá, ele é o sushiman mais antigo de Campo Grande, atualmente, uma vez que o seu mestre — responsável por trazer a iguaria à Capital — faleceu. Então, ele segue com o legado até hoje. E apesar de não ser fã dos novos sabores de sushis, ele afirma que não tem o que fazer se o cliente gosta.

Mas afinal, como o China entrou para o ramo e o que, exatamente, ele comemora com 27 anos de carreira? É o que você vai descobrir agora.

De lavador de pratos a sushiman

Carlos Antônio nasceu em Corumbá, cidade pantaneira a 420 quilômetros de Campo Grande. Ele se mudou para a Capital ainda criança com a mãe, que conseguiu um emprego no antigo restaurante ‘Nikko', do Airton Miyahira, o primeiro a comercializar sushi em Campo Grande a partir de 1989.

Ele acompanhava a mãe no trabalho quando, aos 11 anos, conseguiu emprego de lavador de pratos para ajudar nas despesas de casa. Ao longo do tempo, ele foi recebendo cada vez mais responsabilidades.

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‘China' virou sushiman aos 14 anos de idade (Foto: de França/Midiamax)

“Eu comecei a aprender a cozinhar comida japonesa, demorou um pouco e o restaurante trouxe sushi para Campo Grande, porque não tinha. O primeiro restaurante foi o Nikko”, recorda.

China já trabalhava há muitos anos no restaurante e fazia a função de auxiliar do primeiro sushiman da cidade, conhecido como ‘Toninho'. Ele era paraguaio e viajou por várias regiões de São Paulo, onde a cultura japonesa era forte. Numa dessas aventuras, descobriu o sushi e trouxe para Capital sul-mato-grossense.

China afirma ao Jornal Midiamax não ter gostado do peixe cru no começo. Porém, ao passar a trabalhar com a iguaria, acabou se apaixonando pelo sabor e elegeu o Filadélfia como o seu preferido desde então.

“De primeira, eu tive uma curiosidade e fui experimentar o sashimi. Eu comi sem shoyu, sem nada, e me deu um mal-estar e eu falava ‘que nunca mais ia por na boca'. Mas, ao longo do tempo, eu comecei a experimentar o Filadélfia, que é o salmão enrolado com arroz e cream cheese. Aí comecei a gostar. Daí, passou mais responsabilidade para mim, e passei a ajudar o Toninho”, contou.

Sushi de ‘bandeja'

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Restaurante Hong Kong, o 2º mais antigo a comercializar sushi em Campo Grande (Foto: Leonardo de França/Midiamax)

Assim, o sushi começou a conquistar cada vez mais adeptos quando, em dado momento, Toninho se machucou e precisou ficar afastado do restaurante. Foi dessa forma que, aos 14 anos, China começou de vez na carreira e assumiu a posição do mestre. Depois disso, consolidou-se no cargo e até levou o seu conhecimento para outros restaurantes.

“Já dei curso, até gravo no Forno e Fogão [do SBT], então eu passei para muita gente o sushi, para essa gurizada nova, várias pessoas aprenderam comigo”, afirma.

Além do Nikko, Carlos Antônio também trabalhou no restaurante ‘China', onde ganhou o apelido, e atualmente assume a posição no Hong Kong, o segundo espaço mais antigo a vender sushi na cidade. Sempre adepto da linha tradicional, o que o sushiman não esperava é que outra vertente começasse a crescer na cidade: o sushi de bandeja com combinações inusitadas, como cheddar, bacon, azeitona, calabresa e até Doritos.

Comida popular

Como você viu até aqui, o sushi chegou a Campo Grande em 1989, com o restaurante Nikko. A partir daí, outros espaços passaram a comercializar a culinária, mas sempre na vertente tradicional. No entanto, não é novidade para ninguém que a iguaria japonesa é, e sempre foi, um prato de alto valor aquisitivo, especialmente por causa do preço do salmão.

Foi então que os empresários da Capital adotaram o estilo de rodízio com ‘bandejão' e outros substitutos do salmão, como sushi de cheddar com bacon, Doritos, geleia, calabresa e assim por diante. Com essa mudança estratégica, adotada primeiramente pelo espaço Sushi Express – lá em meados de 2010 – os pratos ficaram mais baratos e se popularizaram na cidade.

Não é à toa que hoje existem diversos empreendimentos com a culinária japonesa, desde a clássica até a acessível. É inevitável negar: o campo-grandense ama sushi. E nesse universo, China diz que até tentou manter a linha clássica nos restaurantes ao longo dos anos, conforme ensinava novos profissionais o ramo. Mas, não adiantou, porque os clientes sempre buscavam essas opções ‘diferentonas'. 

“Eles [restaurantes] modificaram muito, colocaram muito azeitona, pepino, cheddar. Eu não gosto de trabalhar com esse tipo de sushi, eu procuro pegar muito o lado tradicional, mesmo. Eu não acho legal esse tipo, mas tem gente que gosta. Como a gente trabalha nessa área, tem que fazer”, afirma China, com humor.

“Eu cheguei até uma época a criticar para tirar isso aí e manter mesmo o tradicional. Alguns tentaram, mas a casa dava uma caída, porque o povo daqui, o sul-mato-grossense, gosta disso daí, de sushi de cheddar, bacon, calabresa. Essas coisas eles pedem muito […]. Dá uma dor muito forte no coração a gente ver o sushi crescer em Campo Grande e agora a gente vê isso”, brinca o sushiman.

Pioneiro no sushi de Campo Grande, ‘China' afirma seguir a linha tradicional (Foto: Leonardo de França/Midiamax)

 

Professor

Apesar das diferentes gostos e estilos, China afirma que sempre dedicou a sua vida ao preparo e ensinamento do sushi. Independente da vertente, o profissional da área sempre trabalha com higiene, precisão, detalhes e organização para entregar o melhor resultado possível. Foi nessa premissa que o sushiman trabalhou nos últimos 27 anos e levou seu conhecimento a outros espaços.

Considerado parte da história de Campo Grande, foi por meio da sua experiência que novos profissionais, empreendimentos e amantes da culinária nasceram na região. Questionado como se sente em relação à sua contribuição para a disseminação do sushi aqui, ele afirma se sentir muito realizado. “Eu fico muito feliz de ver que se popularizou, há muitos restaurantes e que estão se dando muito bem. Eu acho bacana”, finaliza o sushiman.