MG: ‘Apuração da morte de Paulinho já dura mais que a vida dele’, diz pai
“É inconcebível perceber que a apuração da morte do Paulinho leve 14 anos, ou seja, mais tempo que toda a vida dele”, disse Paulo Pavesi, em entrevista ao tomar conhecimento do adiamento do júri popular referente à morte do filho em Poços de Caldas (MG). Após 1h40 de atraso, a sessão foi aberta na manhã […]
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“É inconcebível perceber que a apuração da morte do Paulinho leve 14 anos, ou seja, mais tempo que toda a vida dele”, disse Paulo Pavesi, em entrevista ao tomar conhecimento do adiamento do júri popular referente à morte do filho em Poços de Caldas (MG). Após 1h40 de atraso, a sessão foi aberta na manhã desta quinta-feira (31) no Fórum da cidade e logo depois suspensa pelo juiz Narciso Alvarenga Monteiro de Castro após pedido do Ministério Público. Uma nova data para o julgamento foi pré-marcada para o dia 9 de outubro, entre o primeiro e o segundo turno das eleições.
Para Pavesi, o adiamento é um descaso do Estado com o processo. “Em 10 anos, o Paulinho aprendeu a engatinhar, andar, comer sozinho, falar, ler, escrever e amar, e em 14 anos o Estado não conseguiu preparar um promotor e fazer um julgamento”, acrescentou.
Pavesi comparou o caso com dramas de repercussão nacional, como o do menino João Hélio em 2007, da Isabella Nardoni, em 2008 e o Caso Eliza Samúdio, em que todos já foram julgados e condenados. “Até mesmo o goleiro Bruno já foi julgado e condenado e nem o corpo da vítima foi encontrado. O caso do Paulinho, com todas as provas incontestáveis existentes já dura 14 anos e tudo indica que ainda teremos que aguardar por mais outros 14 anos. Seria melhor o Estado absolver todo mundo e admitir que a impunidade faz parte do jogo”, disse.
Quatro médicos, o nefrologista Álvaro Ianhez, o anestesiologista Marco Alexandre Pacheco da Fonseca, o intensivista José Luiz Bonfitto e o neurocirurgião José Luiz Gomes da Silva, são acusados pelo Ministério Público de retirar em 2000 os órgãos do garoto Paulo Veronesi Pavesi, de 10 anos, que caiu de uma área a 10 metros do chão. O exame que apontou a morte cerebral teria sido forjado e o garoto ainda estaria vivo no momento da retirada dos órgãos. Os quatro negam qualquer irregularidade tanto nos exames quanto nos transplantes aos quais o garoto foi submetido.
O adiamento do júri popular
O julgamento dos quatro médicos começaria nesta quinta-feira (31), no Fórum de Poços de Caldas (MG). A sessão chegou a ser aberta, no entanto, o júri popular foi adiado e pré-marcado para o dia 9 de outubro, entre o primeiro e o segundo turno das eleições.
A decisão foi tomada a pedido do promotor de Justiça titular da vara da Comarca de Poços de Caldas, Sidney Boccia. Segundo ele, o motivo do pedido foi uma série de informes publicitários veiculados na região. “Fiquei surpreso com o bombardeio de mensagens subliminares feitas pelo CRM (Conselho Regional de Medicina) e também pela Associação dos Médicos de Poços de Caldas na imprensa. Concluo que houve abuso de poder econômico e político em favor dos réus e que isso pode influenciar um pré-julgamento por parte do corpo de jurados”, justificou em plenário.
Reação da defesa
Os advogados dos réus José Luiz Gomes, José Luiz Bonfitto, Marco Alexandre Pacheco da Fonseca e Álvaro Ianhez conversaram com a reportagem. Todos alegam que seus clientes são inocentes.
“Para a defesa é indiferente o júri acontecer nesta ou em qualquer outra comarca. Temos certeza que as provas encaminharão a sentença para uma absolvição. O que nos incomoda é o fato de que o Ministério Público desconfie da isenção da comunidade de Poços de Caldas, colocando à prova a imparcialidade dos jurados”, disse Leonardo Bandeira, advogado de Álvaro Ianhez.
Orlando Pedro, responsável pela defesa de Bonfitto, pediu mais tempo para pensar sobre o adiamento. “Eu fiquei em dúvida quanto esta decisão da promotoria e ainda não refleti sobre o caso”, disse.
Dorio Ferreira Grossi, advogado de Gomes, falou sobre a linha que defesa está seguindo. “Apesar do processo extenso, eles não praticaram homicídio! Houve uma exumação que provou que o menino morreu em virtude da queda e não de qualquer erro médico”, disse Dorio Ferreira Grossi, advogado de Gomes.
O advogado do réu Marco Alexandre Pacheco da Fonseca também enfatiza a inocência do cliente. “A acusação é de homicídio e ele não matou ninguém. Ele apenas foi chamado para dar uma anestesia e pronto”, comentou Sílvio Arthur Dias da Silva.
O Caso Pavesi
O caso aconteceu em abril de 2000 e ganhou repercussão internacional. Na ocasião, Paulinho, como era conhecido, caiu de uma altura de 10 metros do prédio onde morava e foi levado para o pronto-socorro do Hospital Pedro Sanches. Ainda de acordo com o Ministério Público, o menino teria sido vítima de um erro médico durante uma cirurgia e foi levado para a Santa Casa de Poços de Caldas, onde teve os órgãos retirados por meio de um diagnóstico de morte encefálica que, conforme apontaram as investigações, teria sido forjado.
Após receber uma conta hospitalar no valor de R$ 11.668,62, o pai do menino, Paulo Airton Pavesi, questionou as cobranças e deparou-se com dados que segundo ele não condiziam com o que havia sido feito, inclusive com a cobrança de medicamentos para remoção de órgãos, que oficialmente é custeada pelo Sistema Único de Saúde (SUS).
A descoberta de um suposto esquema para a retirada ilegal de órgãos de pacientes em Poços de Caldas fez com que a Santa Casa da cidade fosse descredenciada para a realização de transplantes e remoção de órgãos no ano de 2002. A entidade que geria os trabalhos na cidade, MG Sul Transplantes, também foi extinta no município. Quatro médicos: José Luis Gomes da Silva, José Luis Bonfitto, Marco Alexandre Pacheco da Fonseca e Álvaro Ianhez foram denunciados pelo Ministério Público por homicídio qualificado do menino Pavesi.
Na denúncia, consta que cada um cometeu atos encadeados que causaram a morte do menino. Entre eles, a admissão em hospital inadequado, a demora no atendimento neurocirúrgico, a realização de uma cirurgia feita por um profissional sem habilitação legal que resultou em erro médico e a inexistência de um tratamento efetivo e eficaz e fraude no exame que determinou a morte encefálica do menino.
Ainda na época, o médico Álvaro Ianhez foi denunciado por chefiar a entidade MG Sul Transplantes, que realizava as retiradas dos órgãos e os encaminhava aos possíveis receptores. A organização foi apontada pelo Ministério Público como “atravessadora” em um esquema de tráfico de órgãos humanos.
Segundo o Ministério Público, a constatação da morte encefálica da criança foi feita de forma equivocada, o que levanta a suspeita de que o menino estivesse vivo no momento da retirada dos rins e das córneas. Outra linha de investigação é de que os órgãos retirados do garoto foram transplantados de maneira irregular. As córneas do menino foram levadas para Campinas (SP), quando deveriam ter sido transplantadas em pacientes da lista de espera de Minas Gerais, já que se trata de um procedimento regionalizado.
Em 2010, a Justiça determinou que a equipe médica responsável pela cirurgia de retirada dos órgãos do menino Paulo Veronesi Pavesi fosse a júri popular, o que acontece nesta quinta-feira (31) no Fórum de Poços de Caldas.
Médicos já condenados no caso
Três médicos que foram incluídos posteriormente como réus do Caso Pavesi, por terem participar da remoção de órgãos do menino, foram condenados em janeiro de 2014 a penas que variam de 14 a 18 anos de prisão em regime fechado por participação no caso. Eles não foram a júri popular.
Os médicos Celso Roberto Frasson Scafi e Cláudio Rogério Carneiro Fernandes chegaram a ficar presos por 30 dias e ganharam na Justiça o direito de recorrer da sentença em liberdade. Já Sérgio Poli Gaspar ficou foragido por um mês e após se entregar passou apenas um dia preso. Ele também pode recorrer em liberdade. As condenações provocaram também a reabertura do inquérito referente à morte de Carlos Henrique Marcondes, o Carlão, que foi diretor administrado do Hospital Santa Casa até o ano de 2002. Ele foi encontrado morto na época com um tiro na boca dentro do próprio carro.
Médicos condenados por retirada de órgãos de pedreiro
Dois dos médicos julgados no Caso Pavesi já foram condenados em fevereiro deste ano pela remoção e suposto tráfico de órgãos e tecidos do pedreiro José Domingos de Carvalho, morto aos 38 anos em abril de 2001, na Santa Casa de Poços de Caldas. Os profissionais Celso Roberto Frasson Scafi e Cláudio Rogério Carneiro Fernandes receberam as sentenças junto com outros dois médicos, João Alberto Góes Brandão e Alexandre Crispino Zincone. Eles receberam penas que variam de 8 a 11 anos e seis meses de prisão em regime fechado por homicídio doloso, compra e venda de órgãos humanos, violação de cadáver e realização de transplante irregular.
Além do Caso 1, do pedreiro José Domingos de Carvalho, cuja sentença já foi dada, tramitam na Justiça o ‘Caso 2’, referente à morte de Adeleus Lúzio Rozin, em 2001. O médico neurologista José Luiz Gomes da Silva, é o principal acusado neste processo. Ele responde por homicídio. As circunstâncias da morte da paciente Alice Mezavila Tavares, de 49 anos, que recebeu um rim de Adeleus, também é investigada no ‘Caso 3″. Segundo a família, as causas apontadas pela Santa Casa na morte da mulher foram infecção generalizada e insuficiência renal crônica.
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