Empresários suspeitam de direcionamento em licitação de R$ 14,9 milhões na Capital
Segundo empresários, edital repete vícios de 2009, quando a empresa Itel Informática venceu a licitação, e desrespeita TAC assinado quando MPE descobriu ‘esquema’ para terceirizar mão de obra na atividade-fim da Prefeitura
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Segundo empresários, edital repete vícios de 2009, quando a empresa Itel Informática venceu a licitação, e desrespeita TAC assinado quando MPE descobriu ‘esquema’ para terceirizar mão de obra na atividade-fim da Prefeitura
Empresários de Campo Grande que sonhavam participar da disputa marcada para escolher quem vai prestar serviços de informática para dois órgãos municipais com um contrato milionário foram surpreendidos pelo edital da licitação. Eles suspeitam de que alguns itens são capazes de direcionar o resultado.
A licitação sob suspeita vai definir quem leva R$ 14.988.000,00 da Prefeitura de Campo Grande no período de um ano para supostamente prestar serviços de ‘digitalização de documentos, manutenção de sistemas de informação e operacionalização de soluções do IMTI (Instituto Municipal de Tecnologia da Informação) e da Agetran (Agência Municipal de Trânsito).
Os possíveis concorrentes, empresários campo-grandenses que geram emprego e pagam impostos na Capital, suspeitam que o edital do Pregão Presencial 127/2014 deve levar à contratação de alguém ligado à empresa Itel Informática nesta sexta-feira (17), quando a licitação será aberta. “Isso, se não tiverem a cara de pau de recontratar ela mesma”, duvida um empresário que há 24 anos atua no ramo em Campo Grande.
A empresa já atua na administração municipal desde a gestão de Nelson Trad Filho (PMDB), se manteve no curto mandato de Alcides Bernal (PP) e agora, com Gilmar Olarte (PP) no cargo, continua empregando diversos funcionários nas secretarias municipais.
Um dos pontos que chamam a atenção no edital é a união de objetos diferentes em uma mesma licitação. Dos três serviços diferentes solicitados, somente a Itel tem o tipo solicitado de sistema desenvolvido da Agetran para o Detran-MS (Departamento de Trânsito de Mato Grosso do Sul), já que ela também é a prestadora de serviços no órgão estadual.
O sistema, com custo mensal de R$ 17 mil, seria operado apenas por uma pessoa que digitaria as multas da Agetran para serem ‘lidas’ no sistema do Detran-MS.
Outra observação é de que a empresa teria de depositar uma caução de 5% do valor do contrato, ou seja, R$ 749.400,00, um valor considerado elevado e fora dos padrões de quem enfrenta o mercado ‘de verdade’.
“Se esse Olarte estivesse pensando realmente em economizar o dinheiro público e democratizar, gerando emprego, abriria licitações para contratos menores, e não concentrariam tudo para atender aos gigantes doadores de campanhas políticas”, diz um dos empresários que chegou a pegar o edital, mas não viu sequer chances de concorrer.
Quem fala sobre as suspeitas prefere se preservar com o tradicional medo de represálias comerciais. “Ninguém é doido de ir contra esse esquema de peito aberto. Os caras estão dentro da Prefeitura, podem te ferrar no mercado de mil e uma formas”, justifica. “Mas eu tenho muita vontade de um dia abrir a boca. Como emprego atualmente quase 50 pais de família, tenho toda essa carga no ombro e não posso ser inconsequente”, desabafa.
‘Imensurável’
Outro ponto considerado obscuro pelos concorrentes é o serviço de digitalização de documentos e microfilmagem. A Itel Informática está há anos recebendo o teto do contrato, ou seja, o valor mais alto possível, para realizar um trabalho que, segundo a denúncia, é de difícil aferição.
“Na verdade, ninguém nem sabe como isto está sendo feito. Há até rumores em alguns setores da Prefeitura de que muita coisa nunca passou pelo processo”, diz um empresário que também oferece os serviços de arquivo remoto digitalizado.
A dificuldade de aferição, segundo os empresários, seria um dos trunfos do contrato milionário. “Não é estranho que a empresa sempre receba no teto do contrato? Será que em nenhum mês houve menos documento do que o máximo previsto no edital? É uma coisa imensurável”, pondera.
Mesmo assim, o novo contrato prevê gastos em torno de R$ 208 mil ao mês, estimando um serviço de digitalização e microfilmagem de 650 mil documentos da administração municipal a R$ 0,32 por página.
Cabide de empregos indireto
Além disso, o primeiro objeto do contrato, que prevê a análise, produção e operacionalização de sistemas de informação, não deveria nem fazer parte da licitação. Isso porque a Prefeitura contrata através desta cláusula funcionários para a manutenção de softwares, além dos nomeados pela própria Prefeitura.
O esquema já foi flagrado pelo MPE (Ministério Público Estadual) e deveria ser eliminado em cumprimento a um TAC (Termo de Ajustamento de Conduta) firmado entre a administração municipal e o Ministério Público Estadual no dia 20 de outubro de 2012.
No documento, a Prefeitura se comprometeu a regularizar a contratação de mão de obra para o exercício das atividades-fim da administração.
A ideia era impedir, por exemplo, que funcionários contratados através da Itel, e atuando como auxiliares administrativos em órgãos públicos municipais, recebam até duas vezes mais do que servidores ou contratados diretamente pelo poder público. A situação era comum e foi o que levou à denúncia.
A partir de então, a SAD (Secretaria Municipal de Administração), a Semre (Secretaria Municipal de Receita) e o IMTI (Instituto Municipal de Tecnologia da Informação) deveriam, em até 30 meses, rescindir todos os convênios e contratos firmados de terceirização para gerenciar suas atividades.
Segundo levantamento do qual o Jornal Midiamax teve acesso, cerca de 80 funcionários são terceirizados pela Itel. Desses, 40 são da área de TI (Tecnologia da Informação). Outros funcionários seriam contratados por “favores políticos” e abrigariam parentes e amigos da administração. Com um agravante: o salário é diferenciado e definido arbitrariamente de acordo com o contratante, dentro do teto de pagamento.
Neste novo edital, a previsão de gastos com o pessoal para gerir e atualizar os softwares é de R$ 1.024.000,00 mensais. Dividido pelos 80 contratados, a média salarial para cada um deles seria de R$ 12,8 mil.
Pregão e doações
A previsão da abertura das propostas é para esta sexta-feira (17), às 8 horas, na Central de Compras da Prefeitura. No momento, a Itel continua prestando serviços para a Prefeitura. O primeiro contrato com a Prefeitura, número 357, de 21 de setembro de 2009, é de R$ 13 milhões.
Nesta quarta-feira (15), a Prefeitura publicou o sétimo termo aditivo com a empresa, feito de maneira emergencial, por mais 90 dias, até que o resultado desta nova licitação seja acertado.
A Empresa Itel Informática, de João Baird, mantém mais de R$ 71 milhões em contratos com o governo do Estado e doou em 2010 para a campanha ao governo de André Puccinelli (PMDB), R$ 500 mil. Na campanha de 2012, a empresa doou mais R$ 535 mil para dois candidatos a prefeito.
O dono, João Baird, por sua vez, também mantém generosas doações nas últimas campanhas eleitorais. Em 2010, ele ‘ajudou’ o futuro cliente, Puccinelli, com R$ 1,7 milhão. Dois anos mais tarde, ele doou mais R$ 350 mil para dois candidatos a prefeito.
Em 2014, a Itel ajudou a campanha a governador de Delcídio do Amaral (PT), até o momento, com R$ 450 mil. Doou ainda R$ 50 mil para Luiz Henrique Mandetta (DEM), que foi reeleito deputado federal, e R$ 100 mil para Flávio Kayatt (PSDB), eleito deputado estadual.
Nas eleições atuais Baird também ajudou candidatos em MS. Até o momento, ele doou R$ 300 mil para a campanha do petista Delcídio do Amaral e ajudou Luis Henrique Mandeta com R$ 100. Ajudou ainda Maria Eloir Rodrigues Vilante (PMDB), candidata a deputada federal e Marilza Carlos da Silva (PTN), candidata a deputada estadual, com R$ 5 mil e R$ 3 mil, respectivamente.
“Se essa relação entre os fornecedores e os políticos não configura o famoso toma-lá-dá-cá, não sei mais o que configuraria. É nítido neste Estado, em várias instâncias, a relação entre quem o poder público contrata, e quem distribui dinheiro entre os políticos. Isso aí parece mais uma devolução de gordura inserida nos contratos para o contribuinte pagar a conta no final”, reclama um dos empresários que não concorrerá amanhã por falta de dinheiro na conta bancária.
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