Conselho do Ministério Público investiga utilização de grampos pelas promotorias

O Conselho Nacional do Ministério Público (CNMP) está realizando levantamento inédito em todas as promotorias e procuradorias do País que compraram ou alugaram o Guardião e outros sistemas de escuta telefônica e interceptação de dados. O pente fino busca saber como os equipamentos vêm sendo utilizados a fim de evitar abusos. Informações preliminares dão conta […]

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O Conselho Nacional do Ministério Público (CNMP) está realizando levantamento inédito em todas as promotorias e procuradorias do País que compraram ou alugaram o Guardião e outros sistemas de escuta telefônica e interceptação de dados. O pente fino busca saber como os equipamentos vêm sendo utilizados a fim de evitar abusos.

Informações preliminares dão conta de que entre os 30 ramos e unidades do Ministério Público, incluindo estaduais e federais, ao menos 8 já adotaram o Guardião. Outros 9 compraram modelos análogos de escutas, rotulados Sombra e Wytron, que têm a mesma função. Os sistemas – baseados num poderoso software – podem custar até R$ 1 milhão, dependendo da capacidade do armazenamento de conversas.

O raio X nas escutas do Ministério Público foi provocado por representação do Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), que requereu que “sejam inspecionados e auditados os equipamentos”.

A advocacia alega no “pedido de providências” ao conselho que “convém à sociedade, à cidadania e ao regime democrático conhecer em quais circunstâncias e com que frequência vem sendo usada essa ferramenta”.

O grampo é classificado pelos investigadores como o principal aliado das autoridades públicas no rastreamento de organizações criminosas. O Ministério Público passou a utilizar o sistema de escutas para identificar crimes de corrupção, formação de cartéis e atos ilícitos com recursos do Tesouro. A partir de ordem judicial é possível monitorar simultaneamente dezenas de alvos em tempo real.

O pente fino do CNMP ocorre em meio ao debate sobre o poder de investigação criminal dos procuradores e promotores públicos. Uma proposta de emenda constitucional, a PEC 37, estabelece que só a polícia pode investigar. Caberia ao Ministério Público apenas apresentar a denúncia formal à Justiça a partir do inquérito policial.

Essa proposta, que chegou a ser aprovada em comissão especial da Câmara, passará agora pela avaliação de um grupo de trabalho.

Houve uma época em que o uso de escutas telefônicas era ferramenta quase exclusiva da inteligência da Polícia Federal – e até hoje ela abastece suas operações. Faz alguns anos, foi acolhida também pelas promotorias e procuradorias para o combate a desvios e fraudes na administração pública.

Ao CNMP incumbe, por expressa disposição constitucional, o controle da atuação administrativa e do cumprimento dos deveres funcionais dos promotores e procuradores.

No dia 14 de março, o relator do Procedimento 1328/2012-95, conselheiro Fabiano Augusto Martins Silveira, expediu circular a todos os braços do Ministério Público do Brasil, solicitando informações “a respeito da aquisição e utilização do Sistema Guardião ou de congêneres de interceptação telefônica ou de dados”.

O expediente do conselho foi endereçado aos procuradores gerais de Justiça dos Estados e do Distrito Federal e também aos procuradores gerais da República, Militar e do Trabalho.

Silveira, advogado há 15 anos, doutor em Ciências Penais, cumpre seu primeiro mandato no conselho. Foi indicado para integrar os quadros do conselho pelo Senado, do qual é consultor legislativo para as áreas de direito penal, processual penal e penitenciário desde 2002.

No questionário enviado aos chefes locais do Ministério Público, existem indagações sobre licitações para a compra dos sistemas e sobre o valor pago. Também há perguntas sobre quais os serviços previstos no contrato de compra e se estão programadas capacitação de pessoal e manutenção das máquinas do grampo.

O conselheiro também quer saber se há equipe técnica especializada para operar os aparelhos e se as interceptações são submetidas à inspeção periódica das corregedorias internas.

“Queremos saber como se dá, na prática, a utilização desse mecanismo”, diz Silveira. “A meta é obter um retrato fiel de como isso vem sendo feito. Acredito que o emprego desse sistema deve se dar da forma mais transparente possível. Teremos condições de eliminar quaisquer dúvidas”, afirma.

As polêmicas sobre escutas

Desde os anos 2000, quando a adoção de escutas telefônicas se tornou ferramenta central nas investigações, a legalidade de seu uso motivou discussões intermináveis.

Na prática, em muitos casos, a vigilância acabava se estendendo a mais suspeitos que os autorizados judicialmente – e o Superior Tribunal de Justiça começou a acatar pedidos de anulação de denúncias do Ministério Público. A Operação Castelo de Areia, que envolvia pagamentos suspeitos da empreiteira Camargo Correa a políticos, por exemplo, foi emblemática. Teve as escutas telefônicas anuladas.

A discussão sobre o abuso na utilização do expediente também já esteve na agenda das mais diversas autoridades públicas do País.

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