Protesto por morte de jovem vítima de erro médico lota Câmara e causa confusão em Bonito
A sessão ordinária convocada pela população, Ministério Público Estadual e vereadores virou palco de disputa política e baderna. Ao final da sessão, após rezar o Pai Nosso, populares foram às ruas e polícia revidou com gás de pimenta.
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A sessão ordinária convocada pela população, Ministério Público Estadual e vereadores virou palco de disputa política e baderna. Ao final da sessão, após rezar o Pai Nosso, populares foram às ruas e polícia revidou com gás de pimenta.
O Ministério Público Estadual, a população organizada pela internet e os vereadores realizaram uma sessão ordinária na Câmara Municipal de Bonito nesta terça-feira (10) à noite. A reunião, que tinha como finalidade fazer os representantes da junta interventora explicarem à população o que pode ter levado à morte da jovem Letícia Gottardi Corrêa, de 19 anos, no último sábado (7), acabou em palco de disputa política, acusações e confusão nas ruas da cidade, considerada pela décima vez o melhor destino turístico do País.
Bonito tem cerca de 19.587 habitantes de acordo com o censo 2010 e segundo Joana Gonçalves, de 68 anos, nunca viu uma movimentação popular tão intensa quanto a da noite de ontem. Jovens amigos da estudante de odontologia Letícia Correa se reuniram em frente à Câmara Municipal para protestar.
Com apenas 56 cadeiras para receber a população no prédio municipal, um telão foi instalado na parte de fora para que pessoas que lotavam a principal avenida da cidade pudessem assistir as explicações da junta interventora do hospital da cidade.
O doutor Roberto Rocca usou a palavra na tribuna para dizer que a jovem morreu às 9h15 de domingo (8) e às 9h49 o diretor do Hospital, Wilson Braga, o sogro da jovem e o noivo dela foram para a delegacia registrar o boletim de ocorrência relatando o que aconteceu durante aquela madrugada.
Ele confirmou a versão da família e disse que a junta interventora conferiu a documentação médica de atendimento daquele plantão, que constava a observação de que Letícia tinha alergia à dipirona, feita pelo doutor que atendeu primeiro a jovem.
A mãe de Letícia, Ivone Maria Corrêa, de 40 anos, conta que tinha viajado com o marido e a filha estava na cidade com o noivo. “Ele me contou que procurou atendimento para minha filha três vezes no hospital porque ela estava com dor de barriga. Na primeira, o médico anotou que ela tinha alergia à dipirona e a mandou embora para casa. Da segunda vez, a médica aplicou dipirona na veia dela”.
O noivo relata que o pai dele disse à médica infectologista Caroline Franciscati que a menina tinha alergia ao medicamento e informou que estava anotado na ficha de atendimento. “Ela só respondeu ‘eu sei’ e deu a medicação na veia de Letícia”, disse o rapaz.
Ela voltou para casa com dores quando por volta das 5h de domingo a família percebeu que ela estava com as costas inchadas. Letícia voltou ao hospital com o noivo, onde a médica teria aplicado novamente a dipirona.
Voltando para casa, a avó percebeu que a menina estava gelada e muito inchada quando a família a levou novamente ao hospital, onde ela teve uma parada cardiorespiratória e morreu. Ao final da sessão pública, a avó de Letícia rezou a oração do “Pai Nosso”.
Movimentação popular
O jovem Genivaldo Marcelino da Luz conta que organizou pelas redes sociais a manifestação em frente à Câmara. Ele falou durante quarenta minutos na tribuna e reclamou da saúde em Bonito. “Sabemos que a prefeitura lamenta, mas não é o primeiro caso neste ano. Além dela, quatro pessoas já morreram vítimas do descaso médico nesta cidade. Quem vai reparar os danos? Até quando os interesses políticos estarão acima dos interesses da população?”, reclamou.
Ele denuncia que a cidade não está preparada para atender aos turistas que chegam e que os 15% destinados à Saúde vão para o asfaltamento da região central da cidade. Durante toda a sessão, as pessoas chamavam pelo prefeito do lado de fora do prédio e gritavam por Justiça.
Bate-boca político
A morte da jovem Letícia virou motivo de disputa política durante sessão na Câmara. O vereador Amir Peres Trindade citou casos como o de um jovem jogador de futebol, Vicente Flor, uma gestante e o bebê há menos de 30 dias que morreram por falta de atendimento médico.
“Vereadores prometeram não aprovar projetos do prefeito enquanto a questão da Saúde não fosse resolvida e quando chega um projeto dele aqui, é o primeiro a votar”.
“Se tem alguém culpado é o prefeito desta cidade. Um homem de nariz empinado que vem aqui na tribuna para dizer que a cidade é ótima porque tem um bom asfalto e esta porcaria de atendimento na Saúde”, disparou.
A vereadora Luisa Cavalheiro de Lima disse que estavam usando a dor dos outros para politicagem. “É vergonhoso”. Ao citar o nome do vereador Amir Peres, o bate-boca tomou conta da sessão. “Não toque no meu nome, veradora”.
Ele a denunciou dizendo que tinha gravações sobre a promessa de agilidade nas obras de asfaltamento como promessa ao prefeito.
Caos na Saúde
Amir Peres acusou os médicos da cidade de formarem uma máfia para manter ou mandar embora médicos que eles não querem que permaneçam na cidade.
“Temos como exemplo o médico Roberto Sanavi, que foi embora logo depois da promeira cirurgia. A população adorava o atendimento dele, porém os médicos fizeram um documento pedindo para ele não permanecer, que foi acatado pelo prefeito”, denunciou.
Para Roberto Rocca, da junta médica interventora, o caos na Saúde está instalado em Bonito há tempos. “Fomos escolhidos praticamente a dedo pelo Ministério Público Estadual para administrar e intervir nestas situações extremas”.
Ele conta sobre o caso da jovem grávida que morreu e perdeu o bebê. “Mandaram ela por ambulância para Campo Grande, que é o nosso centro de referência. Mas nós já oferecemos denúncia no Ministério Público sobre possível adulteração de documento, já que o médico entregou a ficha de atendimento um dia e meio após a solicitação da junta”, alegou.
Sobre a médica infectologista, ele disse que não foi a junta interventora quem a afastou, mas sim ela mesma quem pediu o afastamento para a Secretária de Saúde da cidade, Melissa Durau Macedo. “Ela declarou que estava muito abalada com a situação toda e não tinha condições psicológicas de atender”.
Roberto acredita que o baixo valor salarial é o real motivo da não permanência dos médicos na cidade. “Fizemos um concurso público em 2008 e no ano passado, somente uma médica prestou o concurso e assimiu, graças a Deus, se não nem ela teríamos a mais”.
O interventor relata que, ao todo, cerca de 200 mil reias são repassados pelo Governo do Estado e pela prefeitura para o Hospital. “Contamos com a ajuda de sindicatos e amigos do hospital para mantê-lo, já que gastamos cerca de R$ 250 mil por mês e o Governo do Estado nunca repassou o total previsto, de R$ 143 mil mensais, finalizou.
Tumulto
Após o término da sessão, os manifestantes seguiram pela rua para continuar o protesto. Segundo populares, a esposa do prefeito José Arthur Soares de Figueiredo estava cercada pelas pessoas a duas quadras da Prefeitura, quando ele apareceu em uma caminhonete e tentou tirá-la do tumulto.
Ele ameaçou passar por cima das pessoas quando a polícia militar chegou. A população avançou sobre o carro do prefeito e ele recuou. Para conter as pessoas, gás de pimenta foi lançado no ar, fazendo com que os manifestantes passassem mal.
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