Auditoria apura falta de remédios e sumiço do dinheiro para saúde indígena em Dourados

As irregularidades foram apontadas em relatório de coordenadoria ligada a Secretaria Estadual de Saúde. Keliana Fernandes pede providências ao MPE e MPF quanto à saúde de Dourados

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As irregularidades foram apontadas em relatório de coordenadoria ligada a Secretaria Estadual de Saúde. Keliana Fernandes pede providências ao MPE e MPF quanto à saúde de Dourados

A candidata a prefeitura de Dourados, Keliana Fernandes (PSC), protocolizou pedido de providências no MPF (Ministério Público Federal) e MPE (Ministério Público Estadual) para saber o que está sendo feito sobre a situação de caos em que se encontra a saúde pública naquela cidade. Os pedidos foram feitos com base em um relatório de Auditoria Extraordinária, finalizado em junho 2012.

De acordo com os auditores é indiscutível a situação caótica da saúde na cidade, uma vez que análise apontou que os recursos financeiros estão sendo usados de forma ilegal na aquisição de produtos e serviços. Também avalia que a Oscip (Organização da Sociedade Civil de Interesse Público) Amigo do Índio deve ser objeto de investigação uma vez que não tem qualificação técnica nem operacional para o serviço de saúde junto à comunidade indígena.

O relatório aponta que a supervisão técnica municipal é ineficaz nos programas de Atenção Básica; faltam medicamentos e farmácias nas UBS (Unidades Básicas de Saúde) para distribuição de medicamentos; há dificuldade de agendamento de retornos; demora para coleta e resultado de exames de laboratório; CNES (Cadastro Nacional de Estabelecimentos de Saúde) desatualizado; nomes de profissionais demitidos há mais de oito anos ainda não foram excluídos do sistema; desvio de função de equipes técnicas exercendo atividades clínicas.

Também foram detectadas baixa produção de procedimentos de enfermagem, medicina e odontologia, considerando a capacidade das unidades visitadas. Além disso, as UBS alugadas pela secretaria municipal de saúde não possuem qualquer estrutura arquitetônica, funcionais, sanitárias para boas práticas de saúde.

A ineficiência das unidades básicas de saúde, unidades de saúde da família, CAPS, centro de atendimento a mulher, PAM e outros acabam superlotando o Hospital da Vida e o HU de Dourados. De acordo com reclamação dos administradores dos Hospitais, como a população não encontra atendimento nos postos de saúde acaba recorrendo a eles. Desde o início de 2012 vários pedidos de auxílio financeiro foram feitos por esses Hospitais, com ameaça inclusive de fechar as portas.

Relatório aponta compras superfaturadas

Além das diversas irregularidades, o relatório de auditoria aponta que há indícios de sobrepreços nas compras efetuadas pela Secretaria Municipal de Saúde de Dourados. Dentre outros produtos, são apontados preços de bebedouros e fogões que foram pagos ao custo unitário de R$ 578,00 e R$ 580,00, respectivamente. Uma pesquisa de preços local comprovou que os valores médios são de R$ 459,00 e 300,00, demonstrando variação de 93% nos preços.

A empresa responsável pela venda, Microssun Informática não comercializa fogões, geladeiras e bebedouros, o que sugere que a empresa não tinha os produtos no estoque ou se tinha foi apenas para atender a demanda da secretaria municipal de saúde em um pregão presencial “já ganho”.

Também são citados preços de cadeiras, tanquinhos e um aparelho de fax que foi comprado por R$ 679,00 sendo que o preço de mercado do equipamento é de R$ 420,00. A equipe de auditoria constatou ainda que a maioria das unidades de saúde não recebeu os produtos lançados nas tabelas de compra, o que configura falta de planejamento e aplicação irracional de recursos.

A secretaria adquiriu da empresa Rio Grande Distribuição e Comércio de Produtos e Serviços, mais de R$ 65 mil em saquinhos de multimistura. Entretanto, no endereço da empresa existia apenas um salão fechado e a vizinhança nunca tinha ouvido falar da empresa ou comércio de multimistura no local.

Também foi constatado que a secretaria adquiriu diversões galões de 20 litros de água mineral da empresa Primavera, os quais foram pagos com dinheiro da Atenção Básica. Contudo, foi verificado que a Unidades de Saúde não receberam nenhum desses galões.

Oscip Amigo do Índio sumiu com mais de R$ 1 milhão

De acordo com o levantamento feito pelos auditores junto a Oscip Amigo do Índio de Dourados, não há qualquer registro contábil dos gastos feitos pela entidade, impossibilitando a comprovação de aplicação dos recursos. No relatório é pedido que sejam responsabilizados os culpados pelas inúmeras irregularidades encontradas.

A Oscip recebia cerca de R$ 150 mil mensais. De acordo com comprovantes de despesa do Fundo Municipal de Saúde, até a data da auditoria – setembro de 2011 – a Oscip já havia recebido R$ 1,164 milhão.

Foi constatado que a entidade não comprovou qualificação técnica nem operacional para o serviço e que apenas uma pessoa era da área de saúde, sendo a presidente, Érica Kaneta Ferri, a qual não trabalhava na prestação de serviços. Também não há qualquer evidência de pessoal efetivo para execução de tarefas ligadas a Saúde Básica Indígena, o que demonstra existência de fraude.

Não foi comprovada qualquer estrutura administrativa e muito menos encontrados registros contábeis. Segundo Érica a contabilidade nunca foi feita porque a Secretaria Municipal de Saúde não autorizou a contratação de profissional.

No relatório os auditores descrevem que foram ao endereço da entidade e verificaram que no local indicado – uma sala da Unigran Dourados – não funcionava mais a sede administrativa da Oscip. A informação foi de que a sala era emprestada, sem custo, mas foi localizado contrato de locação com a empresa Z&A, firmado de 02/01/2005 a 31/12/2012, no valor de R$ 300,00 mensais.

O presidente da associação Amigos do Índio explicou que desde março de 2011 o Nam Bororó estava funcionando na aldeia daquela etnia. Não foi encontrado alvará sanitário ou de localização. No local constatou-se que a Oscip – que recebe R$ 150 mil mensais – se restringe a um computador antigo, uma impressora, dois armários e duas mesas.

Na sede da Oscip – identificada como Ponto de Cultura administrado pela Unigran – foram encontrados apenas dois funcionários trabalhando. Érica Kaneta Ferri não conseguiu esclarecer questões como a emissão de relatórios ambulatoriais, endereços fictícios nas certidões e alvarás, pagamento de aluguéis à Unigran e o processo de seleção do pessoal contratado pela Oscip.

De acordo com o edital, a Oscip deveria estar prestando serviços relativos a Atenção à Saúde da Mulher Indígena, Saúde da Criança Indígena, Saúde Bucal dos Povos Indígenas, incentivo das práticas da medicina tradicional indígena, apoio ao funcionamento das Casa de Saúde do Índio, estratégia para uso racional de medicamentos, entre outros.

Procurada pela reportagem a Secretária Municipal de Saúde, Silvia Bosso, declarou que não tem conhecimento sobre qualquer relatório da auditoria da saúde e que não falaria desse assunto por telefone. Em relação a Oscip, Silvia se restringiu a informar que o contrato com a entidade já foi encerrado no início do ano e que eles estão em fase de prestação de contas. Já Érica Ferri confirmou o encerramento do contrato e disse que não é mais presidente da Oscip. Questionado sobre as irregularidades apontadas pela auditoria Érica negou as informações.

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