Erosão da Ceará invade avenida e especialistas culpam crescimento desordenado

Autoridades culpam a chuva, vereadores anunciam audiência e prefeito pede levantamento para anunciar real situação; família diz ao Midiamax ter sorte de não morar no Centro

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Autoridades culpam a chuva, vereadores anunciam audiência e prefeito pede levantamento para anunciar real situação; família diz ao Midiamax ter sorte de não morar no Centro

A erosão que abriu uma cratera no mês de dezembro na Avenida Ceará tomou maiores proporções após a chuva de ontem que caiu no centro de Campo Grande e engoliu literalmente cerca de três quadras da Avenida Ricardo Brandão, perto do prédio da Câmara dos Vereadores, aos arredores do shopping, área nobre da cidade. O morro de pelo menos 20 metros de altura foi ao chão e levou parte da área de lazer do Residencial Cachoeira e ainda a pavimentação asfáltica, tubulações, calçadas. Tudo foi destruído.

A família da dona-de-casa Elisiane Rodrigues, 25, que mora no Coophavila II, distante a cerca de 20 quilômetros da destruição, foi ver de perto o caos na região próxima ao shopping de Campo Grande e disse sentir-se aliviada por morar longe dos prédios luxuosos da área nobre. “Nessa hora é muito melhor morar no bairro longe do Centro”, disse ela.

Para especialistas em obras, o problema urbano tem como causa a falta de planejamento de uma cidade com 755 mil habitantes, dona de muitas áreas pavimentadas que acabam por prejudicar a absorção da água pelo solo e com isso, há uma sobrecarrega nos córregos que não suportam o volume da enxurrada e transbordam.

Segundo o professor de Arquitetura da UFMS (Universidade Federal de Mato Grosso do Sul), Ângelo Arruda, os alagamentos, abertura de crateras e problemas com a drenagem do córrego Prosa, surgidos após a chuva de uma hora e meia que caiu ontem em Campo Grande tem uma só justificativa: “o Plano Diretor da cidade não tem sido respeitado”.

Para o arquiteto, a Avenida Ricardo Brandão, perto da região da Câmara Municipal, aos arredores do shopping Campo Grande, a Prefeitura tem autorizado a construção de prédios, sem se preocupar com a ocupação do solo. Arruda disse que cada edificação deve deixar uma espaço livre para absorver a água da chuva.

“A cidade precisa parar e encontrar um caminho para o seu desenvolvimento. O Plano Diretor precisa ser respeitado, caso contrário a população vai continuar sofrendo as conseqüências pela falta de planejamento”, completou.

O Plano Diretor é um instrumento criado para orientar a atuação do poder público e da iniciativa privada na construção dos espaços urbanos.

Ou seja, esse programa deve dizer, por exemplo, caso confirmada a tese do arquiteto, que ali na região do shopping seria um risco erguer tantos prédios como ocorreu na última década. A região é cercada de nascentes de córregos.

O arquiteto estima que a prefeitura deve investir pelo menos R$ 200 milhões em obras a serem executadas na região onde o córrego Prosa é canalizado. Ele acha que a conclusão dessa obra deve exigir o empenho de ao menos três prefeitos, isto é, uns 12 anos. Caso contrário a cidade vai ficar como hoje: “da noite para o dia tudo sendo levado pela enxurrada”.

Obras ‘quebra-galhos’

Já o engenheiro civil Rui Maribondo, 50 anos, 25 dos quais dedicados a construção de obras em Campo Grande, disse que as “possíveis causas” dos estragos causados podem ter ligação com a drenagem do córrego Prosa e também da construção de prédios aos arredores da região.

O engenheiro disse que ali no local é precisa que se faça uma “obra de verdade” e não “quebra-galho”, como tem sido feito até agora, segundo ele.

A chuva de uma hora e meia que caiu ontem sobre a cidade destruiu o asfalto de três quadras da Ricardo Brandão, via de mão dupla. Por baixo dessa rua atravessa o córrego Prosa, canalizado em 2006. “É preciso fazer um aprofundamento do córrego, mexer melhor na drenagem”, disse o engenheiro.

Maribondo acha que a “obra séria” e não “quebra-galho” demoraria ao menos um ano para ficar pronta.

Chuva ‘forte’

As principais autoridades ligadas à prefeitura de Campo Grande discordam da opinião dos especialistas, que culpam a falta de planejamento pelos estragos surgidos sempre que cai chuva na cidade. O diretor-presidente da Agetran (Agência Municipal de Transporte e Trânsito), Rudel Trindade Júnior viu a crítica do especialista como um “exagero” e acha que os danos foram causados apenas pelas chuvas fortes.

“Dos 88 milímetros de água que caíram ontem 75 caíram nos primeiros 45 minutos [a queda d’água durou uma hora e meia]. As mudanças climáticas ocorreram com maior intensidade e isso tem sido a razão dos danos”, disse Rudel Filho.

O chefe da Agetran informou ainda que os técnicos da prefeitura fazem hoje um levantamento dos pontos críticos na cidade. A ideia, disse ele, é alertar a população sobre os eventuais riscos já na segunda-feira pela manhã.

Rudel Filho disse também que as obras tocadas pela prefeitura são, sim, bem planejadas, contrariando as suspeitas levantadas pelo arquiteto Arruda. “Os estragos ocorrem devido às severas mudanças climáticas. Ontem, por exemplo, a região mais afetada da cidade foi justamente aquela onde choveu mais”, disse.

Já Rodrigo Aquino, secretário de Governo da prefeitura, disse concordar com Rudel Filho e que em conversa com o prefeito Nelsinho Trad, nesta manhã, foi orientado a fazer um levantamento dos estragos que, para ele é provocado pela chuva, não por falta de planejamento urbano, como criticou o arquiteto.

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