Você já passou por algum problema envolvendo a infraestrutura urbana? Um pneu furado devido a buracos nas vias, acidente causado por falta de sinalização ou até prejuízos por falhas na pavimentação são algumas situações passíveis de processo contra a administração pública, seja ela municipal ou estadual.

Tendo em vista que Campo Grande registrou média histórica de chuva nos últimos meses, especialista afirma que número de processos aumenta nos períodos chuvosos devido aos estragos. Afinal, basta passear pela cidade para encontrar tais irregularidades. 

Acidente de trânsito causado por problemas na via pública, como buracos, falta de sinalização ou problemas na pavimentação, é uma realidade na rotina do campo-grandense. No entanto, muitas vezes, os casos são negligenciados pela administração pública, o que pode resultar em prejuízos materiais ou até mesmo em óbitos.

Segundo os advogados Valéria Scapin e José Reis da Silva Junior, a administração pública tem o dever de manter a infraestrutura das ruas e rodovias em boas condições de uso para garantir a segurança dos usuários. 

bueiro aberto
Bueiro sem tampa em (Foto: Marcos Ermínio/Jornal Midiamax)

Teoria da culpa 

Embora a Constituição Federal não aborde expressamente a questão da responsabilidade civil pelos danos causados por omissão do Poder Público, Valéria e José contam que a jurisprudência construiu entendimento, com respaldo na doutrina, de que essa obrigação é imposta com base na teoria da culpa administrativa.

Isso significa que, caso a administração pública deixe de cumprir essa obrigação, os cidadãos que sofrerem prejuízos em decorrência de acidentes causados por problemas na via pública, por exemplo, têm todo o direito de buscar a reparação pelos danos sofridos.

“Por exemplo, se um motorista sofreu um acidente devido a um buraco na via pública que não estava devidamente sinalizado, ele pode buscar reparação pelos danos sofridos. Nesse caso, uma perícia técnica pode ser realizada para comprovar o nexo causal [relação entre o fato criminoso e a conduta praticada pelo indivíduo] entre o buraco na via pública e o acidente ocorrido, além de apresentar outros elementos de prova, como testemunhos de outras pessoas que presenciaram o acidente ou documentos que demonstrem a existência do problema na via pública. Dessa forma, é possível garantir que os direitos dos cidadãos sejam respeitados e que eles recebam a devida reparação pelos danos sofridos”, afirma o advogado. 

De quem é a responsabilidade? 

A prefeitura de Campo Grande é responsável por manutenções, conservação das vias urbanas e as vias rurais vicinais municipais. Já o Governo de é responsável pelas rodovias estaduais, sejam elas pavimentadas ou não. 

lago do amor
Cratera no Lago do Amor (Foto: Kísie Ainoã, Jornal Midiamax)

Cabe ressaltar que a administração pública pode ser responsabilizada não só pelos acidentes causados por problemas na via pública, mas também pela falta de sinalização adequada, pela má conservação da sinalização existente ou, ainda, pela falha na sinalização de semáforos, seja quando ela está desligada ou intermitente.

Conforme os especialistas, isso ocorre porque a sinalização é um elemento fundamental para garantir a segurança e a falta dela pode causar acidentes graves.

“No entanto, em se tratando de conduta culposa, ou seja, onde não há dolo [crime com intenção], para que a ação de reparação seja bem-sucedida em casos de acidentes de trânsito causados por problemas na via pública, como buracos, falta de sinalização ou problemas na pavimentação, é necessário comprovar o nexo causal entre o problema na via pública e o acidente ocorrido”, ressalta a advogada.

Acidentes podem resultar em sequelas 

Barbara Helene Nacati Grassi é advogada e está à frente de causa em que sua cliente, de 30 anos, foi vítima de acidente de trânsito causado por um buraco na via. O caso ocorreu em 2022, mas a mulher sofre as consequências da falha de infraestrutura até hoje, já que ficou com sequelas e teve seu trabalho de cabeleireira prejudicado por não conseguir ficar muito tempo em pé devido às lesões na perna e joelho. Dessa forma, a mulher moveu ação contra a prefeitura de Campo Grande e o -MS.

Conforme constatado no Boletim de Ocorrência, o acidente ocorreu em 22 de janeiro de 2022, por volta das 22h, na Rua Várzea Seca. A mulher pilotava sua moto quando caiu em um buraco de aproximadamente 01,5 m² – 0,90 m² e sofreu queda brusca. Ela teve danos materiais e físicos com fraturas na tíbia, patela, arranhões, hematomas, etc.

O dano também ocasionou na perda de movimentos da perna esquerda da autora. Segundo sua advogada, a mulher já passou por tratamento e fisioterapia, mas ainda está com dificuldade de locomoção.

Diante disso, a ação pede R$ 50 mil em danos morais, além de R$ 1.461,50 de danos materiais e pagamento de valor perdido pela falta de trabalho. O processo ainda não contém a manifestação do município e nem do Detran. 

buraco
Buraco em Campo Grande – Ilustrativa (Foto: Nathalia Alcântara/ Arquivo/ Jornal Midiamax)

“O município e o Detran têm a obrigação de manter as vias da cidade, que muitas têm buracos e crateras. Pode danificar a do carro, estourar o pneu e gerar danos aos condutores, mas a maioria das pessoas não sabe disso”, afirma Barbara ao Jornal Midiamax.

Dessa forma, a advogada orienta que a pessoa tente se documentar ao máximo em casos de acidentes ocasionados por má infraestrutura urbana para que, judicialmente, não haja alegação de não comprovação dos fatos. Uma vez que os réus tentam se eximir da responsabilidade, o cidadão precisa se munir de provas. 

Riscos à população

Em março deste ano, outra situação divulgada pela equipe de reportagem mostrou o risco de ponto de ônibus situado no Noroeste. A base da estrutura estava toda corroída por ferrugem e com risco de desmoronar em cima de alguém. 

Em janeiro, o Jornal Midiamax encontrou um ponto de ônibus da Avenida Afonso Pena apoiado com tijolos.

Diante desses casos, advogados incentivam os moradores a procurarem por Justiça. 

Prazo para ingressar com ação

Se você chegou até aqui com interesse em ingressar com ação contra a prefeitura ou Estado referente à reparação de danos, precisa ficar atento ao prazo. O Código Civil brasileiro estabelece o prazo de três anos a partir da data do acidente para recorrer à Justiça. 

“Portanto, é fundamental que os cidadãos afetados busquem imediatamente um advogado especializado em acidentes de trânsito para avaliar as medidas cabíveis”, afirma Valéria Scapin. 

Além disso, estar munido de documentação, relatos de testemunhas, fotos e todos os documentos ajudam a dar maior celeridade e resolutividade positiva ao processo.

Reparação de danos morais 

Além da reparação pelos danos materiais, como danos ao veículo, despesas médicas e perda de renda, os cidadãos também têm o direito de buscar reparação pelos danos morais sofridos em decorrência do acidente, que incluem traumas psicológicos, dor e sofrimento, entre outros, como o caso citado acima.

“Havendo uma boa instrução processual, ou seja, com a apresentação imediata das provas da ocorrência do sinistro e do nexo causal entre a falha na prestação do serviço público e os danos sofridos pelo cidadão, os processos judiciais tendem a fluir de maneira rápida. É preciso levar em conta que cada processo é um processo, no entanto, uma demanda bem instruída possui muito mais possibilidades de que a entrega do provimento jurisdicional se dê de forma célere”, diz Valéria.

Ato de cidadania 

Os entrevistados ainda pontuam que a busca pela reparação de danos causados por acidentes de trânsito, decorrentes por problemas na via pública, não deve ser vista apenas como uma questão individual. Para Valéria Scapin e José Reis, é um ato de cidadania e de defesa ao direito coletivo. 

“Ao responsabilizar a administração pública pelos prejuízos causados aos cidadãos, estamos contribuindo para a melhoria da segurança viária e para a construção de cidades mais justas e seguras para todos”, conclui José.

O Jornal Midiamax entrou em contato com a prefeitura de Campo Grande e Governo de Mato Grosso do Sul para entender quais prestações de serviços e apoios são oferecidas a pessoas que se acidentem por falhas na infraestrutura urbana. Espaço segue aberto para manifestações.