Justiça nega pedido para suspender ato que liberou abertura de igrejas em Campo Grande
O juiz David de Oliveira Gomes Filho, titular da 2ª Vara de Direitos Difusos, Coletivos e Individuais Homogêneos de Campo Grande negou o pedido do MPMS (Ministério Público de Mato Grosso do Sul) que pedia a suspensão do ato que liberou a abertura das igrejas em Campo Grande. No dia 18 de março, Campo Grande […]
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O juiz David de Oliveira Gomes Filho, titular da 2ª Vara de Direitos Difusos, Coletivos e Individuais Homogêneos de Campo Grande negou o pedido do MPMS (Ministério Público de Mato Grosso do Sul) que pedia a suspensão do ato que liberou a abertura das igrejas em Campo Grande.
No dia 18 de março, Campo Grande declarou situação de emergência e definiu as medidas de prevenção e enfrentamento ao coronavírus. No dia 26 de março, o Município emitiu o Decreto nº 14.219 (publicado do Diário Oficial de Campo Grande na mesma data), permitindo o funcionamento das atividades religiosas de qualquer natureza, revogando a disposição anterior que previa limite de 20 pessoas.
A promotora de Justiça Filomena Aparecida Depólito Fluminhan, titular da 32ª Promotoria de Justiça da Saúde Pública, ajuizou Ação Civil Pública com Pedido de Tutela de Urgência Antecipada pedindo a imediata suspensão dos efeitos que permitia a realização das atividades destinadas ao público/fiéis em Igrejas e Templos Religiosos, durante o período de quarentena e também no caso de prorrogação.
O juiz em sua decisão, ressaltou os perigos que a contaminação está por causar, “pois são tristes os exemplos de outros países em que houve o afrouxamento das medidas de combate ao vírus”, porém por maior que seja o receio , é preciso que as instituições funcionem conforme o programa previsto na Constituição Federal justamente para uma situação assim.
Ainda de acordo com o juiz de direito, o Governo Federal ainda não instaurou “estado de defesa” e, assim, não se pode restringir genericamente e por meios coercitivos o direito de reunião a toda a população.
O MINISTÉRIO PÚBLICO ajuizou a presente ação civil pública em face do MUNICÍPIO DE CAMPO GRANDE, ambos qualificados na petição inicial, alegando, em síntese, que o prefeito municipal editou um decreto proibindo o funcionamento de templos religiosos, posteriormente ele autorizou que estas atividades ocorressem desde que contasse, no máximo 20 pessoas, e agora, no último decreto, permitiu o funcionamento sem limitação de pessoas, mas impôs alguns cuidados de higiene para se evitar contaminação.
Deseja o autor a anulação do art. 20, VII do Decreto Municipal n. 14.195/2020 e do Decreto Municipal n. 14.202/2020, referente à permissão para que templos e igrejas sejam utilizados durante o período de quarentena, para restabelecer o primeiro que era mais restritivo. Pede tutela de urgência neste sentido, suspendendo-se as referidas normas.
É o relatório. Decido.
O Brasil está no início do enfrentamento da pandemia COVID-19, doença de alto grau de contágio. A estratégia de enfrentamento recomendada pela OMS é o urgente isolamento social, pois ele achata a curva de contaminação, proporcionando aos profissionais da saúde que consigam prestar atendimento ao máximo número de pessoas. Sem esta estratégia, o temor é que não existam leitos e equipamentos para todos os doentes graves que viriam concentrados num período muito curto.
Por conta disto, em todo o Brasil, prefeitos passaram aestimular o isolamento social. Deseja a douta promotoria que o prefeito municipal de Campo Grande, não estimule, mas imponha o isolamento social de modo mais eficiente para que vidas sejam salvas. Neste sentido, quer que os decretos municipais n. 14.195/2020 e n. 14.202/2020, sejam anulados na parte em que flexibilizou o funcionamento de igrejas e de templos.
É importante que fique o registro de que não se desconhece os perigos que a contaminação está por causar, pois são tristes os exemplos de outros países em que houve o afrouxamento das medidas de combate ao vírus e que demonstram a importância de medidas de contenção da contaminação do Covid-19.
É certo, contudo, que existe um procedimento previsto na Constituição Federal para o enfrentamento de situações de crise como esta (art. 136 e 137 da CF). Com efeito, por maior que seja o receio de que uma tragédia esteja muito próxima, é preciso que as instituições funcionem conforme o programa previsto na Constituição Federal justamente para uma situação assim. Não podem os juízes e os prefeitos municipais (milhares em todo o Brasil) atropelarem a norma, diante da aparente inércia do Poder Executivo Federal, pois as medidas de restrição dos direitos fundamentais à toda a população são atos de total exceção e com reflexos muito grandes na vida das pessoas e na própria ordem social.
O Ministério Público, ao fazer menção à Lei 13.979/2020 e à Portaria do Ministério da Saúde n. 356 de 11/03/2020 (art. 4o.) para embasar seu raciocínio pelo isolamento forçado das pessoas, com o fechamento de igrejas, refere-se às medidas de isolamento e de quarentena previstos naquelas normas conforme o entendimento coloquial das expressões usadas, mas não percebeu que o próprio art. 2o. da Lei n. 13.979/2020 definiu o que é “isolamento” e o que é “quarentena” para os efeitos de interpretação da lei e são sempre medidas aplicáveis a pessoas doentes, contaminadas ou suspeitas de contaminação.
Aquelas normas não fazem referência a pessoas saudáveis e nem poderiam, porque não estamos num estado de exceção.
O reconhecimento formal de situação de emergência, também alegado pela autora, é uma das etapas que antecede a decretação de calamidade pública. Ambas são providências usualmente utilizadas pelos prefeitos e governadores que os habilitam a suspender as metas fiscais previstas na lei de responsabilidade fiscal e a obter auxílios extraordinários do Governo Federal. Foi isto que o Estado de Mato Grosso do Sul e que o Município de Campo Grande fizeram recentemente. Não há espaço, nesta medida para restrições abrangentes das liberdades individuais.
Recentemente, o governo federal também solicitou ao Congresso Nacional o reconhecimento da situação de calamidade pública justamente para suspender os efeitos da Lei de
Responsabilidade Fiscal para o ano de 2020, mas ele ainda não decretou “estado de defesa” e, assim, não se pode restringir genericamente e por meios coercitivos o direito de reunião a toda a população.
O que acontece hoje é um ato de adesão voluntária de todos que, com sacrifício pessoal, reconhecem o perigo que se aproxima e agem de acordo com as orientações dos médicos e dos cientistas a respeito. É um ato de consciência e não de imposição.
Assim, por mais que se reconheça a nobreza da pretensão da douta promotora de justiça e por mais que este magistrado torça pela vitória no combate ao vírus, não há como dar seguimento à presente ação, pois está ausente o requisito probabilidade do direito reclamado e a liminar será indeferida. Sem a liminar, o processo perde sua utilidade porque o tempo de tramitação da ação será maior do que a validade dos atos combatidos (decretos do prefeito municipal).
Assim, está ausente o interesse processual. Diante de todo o exposto, indefiro a petição inicial por ausência de interesse processual e julgo extinto o processo, nos termos do art. 485, I do CPC. Sem custas.
Publique-se, registre-se e intimem-se. Decorrido o prazo para o recurso voluntário, subam os autos ao e. Tribunal de Justiça para o recurso de ofício.
Intimem-se.
Campo Grande/MS, 31 de março de 2020.
David de Oliveira Gomes Filho.
Juiz de Direito.
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