Há vida após a pasta base: histórias mostram que luta diária leva à superação

O efeito da pasta base na vida das pessoas é devastador. Um vício que vai além de classe socioeconômica, não escolhe raça, gênero ou orientação sexual. E que, muitas vezes, é um caminho sem volta. Na última reportagem da série especial produzida pelo Jornal Midiamax sobre o aumento do consumo da pasta base em Campo […]

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O efeito da pasta base na vida das pessoas é devastador. Um vício que vai além de classe socioeconômica, não escolhe raça, gênero ou orientação sexual. E que, muitas vezes, é um caminho sem volta. Na última reportagem da série especial produzida pelo Jornal Midiamax sobre o aumento do consumo da pasta base em Campo Grande, vamos contar histórias de superação de pessoas que vencem a luta diária travada contra o vício.

Raros são os depoimentos de usuários que conseguiram vencer. Por ser barata, a droga vicia rápido e pode levar os dependentes químicos para três destinos: a rua, a cadeia ou o cemitério.

Mas é possível vencer a doença. Nossa equipe conseguiu três depoimentos de pessoas que sentiram na pele os efeitos da droga, mas superaram o vício.

Gerson Leão Pinheiro, 40 anos, tem uma vida social tranquila, está há doze anos sem utilizar nenhuma droga e trabalha como mestre de obra. Pastor há 8 anos, auxilia quem luta contra as drogas. Aos 15 anos, começou na cocaína, passou pela maconha, crack e chegou ao fundo do poço ao fazer o uso da pasta base. “Eu cheguei a pesar 55 quilos, tive três overdoses, minha mãe chorava falando que eu iria morrer”, lembra.

Segundo ele, a decisão de parar foi após a última crise de overdose, o uso do alucinógeno foi por curiosidade e, como conhecia muita gente, era o chamado “aviãozinho” não precisava de dinheiro para conseguir, era só levar o cliente até a mercadoria.

Gisele Ribeiro, 35 anos, hoje coordena uma casa de recuperação em Campo Grande e auxilia quem precisa de ajuda. Com dois meses de consumo da pasta base, passou a morar na rua. Ela lembra que começou a usar a droga por curiosidade, mas chegou ao fundo do poço ao se prostituir por R$ 5.

Sem lar, sem amigos e sem trabalho precisou procurar comida no lixo para se manter. “Com nove meses de uso eu já tinha perdido 20 quilos, não dormia, não comia, estava delirando”, relata.

Há vida após a pasta base: histórias mostram que luta diária leva à superação
Foto: Henrique Kawaminami
Há vida após a pasta base: histórias mostram que luta diária leva à superação
Foto: Henrique Kawaminami

A superação só foi possível porque Gisele entendeu que estava doente e precisava mudar pelo filho. “Eu entendi que eu tinha perdido a luta contra as drogas, eu era escrava, eu vi que não conseguiria sozinha”, descreve emocionada. Hoje ela vive bem com o filho na casa de recuperação.

M. A.M, 52 anos, administrador de empresa, já tinha feito uso da maconha na juventude, a pasta base entrou por questões emocionais, perdeu pai, guarda do filho e dinheiro. Viveu de 2009 a 2015 no vício, quando decidiu mudar, a família não acreditava mais, está há nove meses sem usar qualquer entorpecente. A recuperação só é possível se a pessoa pedir socorro. “Sozinho é impossível, a pessoa precisa querer ajuda”, conta.

Recaídas X Criminalidade

Droga com grande popularidade, a pasta base é um alucinógeno de grande potencial, o vício é quase instantâneo, subproduto da cocaína, faz com que raras vezes seus dependentes se livrem do vício.

Recaídas fazem parte do processo e com Gisele não foi diferente. Na primeira internação ficou limpa durante três meses, depois voltou a morar na rua e se prostituir. Sua segunda recaída foi após sair da cadeia, viveu bem durante um período, no entanto ela e o marido voltaram a usar. Decidiu se internar novamente quando o filho tinha um ano, hoje já está limpa há 1 ano e 11 meses.

Em sua terceira internação, M.A.M faz terapia ocupacional e teve duas recaídas de 2015 até 2018, mas segue tentando.  O administrador conta que o relacionamento com a família ajuda no tratamento.

Gerson conta que quando a família percebeu que ele era viciado em pasta base ele já fazia o uso há um ano. “Eu não tinha mais roupa boa, todo dia eu fumava, de segunda a segunda, pegava tênis dos meus irmãos, eles ficaram com medo quando descobriram que eu era viciado, tudo que eu pegava era para a base”, conclui.

A expectativa de vida de quem segue por esse caminho é reduzida: 50% dos usuários vivem apenas de 5 a 10 anos após o primeiro consumo. Gerson perdeu dois amigos para as drogas, um devido a criminalidade e outro foi morto em um assalto.

Luta diária e os danos da droga

É preciso que o adicto queira a libertação e busque por ela todos os dias. A família é importante nesse processo. Para o pastor a verdadeira liberdade só foi possível quando ele conheceu a Cristo, começou a frequentar a igreja.

“O ser humano tem suas motivações, ou a gente sai de um problema porque estamos sofrendo demais, ou na expectativa de que amanhã vai ser um dia melhor, e no meu caso eu percebi que eu não ia durar muito tempo, eu ia acabar morrendo, só parei totalmente quando eu conheci cristo, comecei a ir para igreja” relata o pastor.

No caso de Gisele o medo de perder o filho foi o principal motivo para lutar. Ela conta que após um dia bebendo e fazendo o uso, olhou o filho dormindo e teve consciência que não era o que queria para o filho.

Para manter a mente ativa e sem pensar na base, M.A.M faz artesanato e móveis na clínica onde vive. “A luta é diária”, conclui o administrador.

Os danos causados na mente são grandes: perda de produtividade e consciência fazem parte da recuperação. “A base é tão forte que até hoje eu sonho como se eu estivesse fumando, acordo até assustado, ela causa impacto muito grande na mente das pessoas, ver alguém na rua e você lembrar de tudo que você viveu, ela é realmente destruidora”, conclui Gerson.

Em vídeo, Gisele compartilhou a sua história e a superação da  pasta base:

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