Em 6 meses, prefeitura já tentou tirar 500 pessoas das ruas de Campo Grande

Entre a população, a impressão é de que os moradores estão cada vez mais presentes nas ruas

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Para quem anda pelas ruas de Campo Grande, a impressão é de que os moradores de rua estão cada vez mais presentes no cenário urbano. De janeiro a junho deste ano, a SAS (Secretaria Municipal de Assistência Social) já atendeu 500 pessoas em situação de rua. O número equivale a 79% dos atendimentos de todo o ano passado, quando 631 pessoas receberam assistência.

Para a acadêmica Juliana Miranda, de 19 anos, os moradores de rua estão mais presentes na Capital. “Para mim é visível que aumentou. Antes eles ficavam em um local específico, agora você pode encontrá-los por toda a cidade. Moro no bairro Monte Castelo, que antes não tinha mendigos, mas agora eles sempre passam pedindo água, comida e roupa, mas nós tentamos ajudar sempre”, conta.

O artista plástico Guido Drummond mora na região da Orla Ferroviária há cerca de um ano e afirma que também percebe um aumento do número de moradores de rua. “Antes eles ficavam em um local, que era a antiga rodoviária. Agora ficam na Orla, na 14 de Julho, na Calógeras, na Mato Grosso”, explica. A estudante Mirela Salvaterra, de 18 anos, também acredita que a presença dos moradores aumentou no Centro da cidade. “Eu vejo muitos na praça, antes não era assim. Eu sei que é triste viver assim, mas não temos como evitar sentir um pouco de medo com a presença deles”, diz.

Em 6 meses, prefeitura já tentou tirar 500 pessoas das ruas de Campo Grande
Andreia pede dinheiro nas ruas para comprar sustentar o vício e consegue se alimentar com doações. (Foto: Henrique Kawaminami)

Por que eles vão para as ruas

Seja por dificuldades financeiras ou por envolvimento com drogas, muita gente vai morar na ruas e têm chamado a atenção da população, já que geralmente se encontram em praças, calçadas ou em semáforos, como pedintes. No cruzamento entre as avenidas Afonso Pena e Ernesto Geisel, na Orla Ferroviária ou nas proximidades da antiga rodoviária, por exemplo, não é difícil encontrá-los.

A pobreza é um dos principais fatores a levar as pessoas a morar na rua. Só na Capital, 18 mil famílias vivem na extrema pobreza, com renda per capita mensal de até R$ 85. Além disso, a pobreza extrema se alastrou no país no último ano e já abrangia 14,8 milhões de pessoas.

Em 6 meses, prefeitura já tentou tirar 500 pessoas das ruas de Campo Grande
Há dois anos na rua, Andreia se envolveu com as drogas depois que se separou do primeiro marido. (Foto: Henrique Kawaminami)

A decadência financeira levou Andreia, de 36 anos, a viver na região da antiga rodoviária com o marido. Ela conta que após a demissão do marido Thiago, de 30, a vida do casal começou a desmoronar, quando se apegaram ao prazer momentâneo fornecido pelas drogas.

A história do casal já começou nas ruas. Andreia conta que conheceu Thiago quando já era dependente química. Há oito anos, a ex estudante de ciências contábeis se viu abandonada pelo então marido e começou a utilizar substâncias químicas, oferecidas pelos colegas em festas universitárias. Foi quando conheceu Thiago, também dependente, e conseguiram se reerguer juntos. “A gente conseguiu se levantar, ele arranjou um emprego, conseguimos uma casa juntos. Foi então que ele foi demitido, houve toda uma pressão familiar e então nós caímos nesta vida de novo. Viemos parar na rua, isso já faz dois anos”, conta.

Andreia deixou três filhos do outro casamento com a mãe e hoje mora nas ruas do Centro da cidade com Thiago. Para conseguir manter o vício, é o marido quem faz o ‘corre’ e procura quem fornece. Andreia conta que eles pedem dinheiro nas ruas para comprar a droga e conseguem se alimentar com doações. “Para comprar a gente fica pedindo por aí, mendigando mesmo. As pessoas olham para a gente como lixo, mas ainda conseguimos uns trocados para comprar mais [droga]. Para comer, a gente pede de casa em casa. Vamos em casa de pobre, eles nos dão arroz, feijão, carne. Rico é mesquinho, dá pão velho e olhe lá”, explica.

A moradora explica que apelou para a mendicância depois de ter chegado ao fundo do poço e acredita que é a maneira mais honesta de conseguir o dinheiro. “Eu já cheguei a me prostituir, a roubar, tudo pela droga. Hoje a gente só pede, pelo menos mantemos a nossa dignidade”. Ciente da necessidade do tratamento, o casal planeja retornar ao Caps (Centro de Apoio Psicossocial).

Em 6 meses, prefeitura já tentou tirar 500 pessoas das ruas de Campo Grande
O perfil dos moradores de rua é majoritariamente masculino, com 89% da população. (Foto: Henrique Kawaminami)

Assistência Social

Segundo a SAS, a maior dificuldade em ajudar os moradores de rua acontece devido a conflitos familiares, quando há uma fragilização ou rompimento de vínculos. Além disso, pessoas sob uso de substâncias etílicas, psicoativas ou com transtornos mentais também oferecem resistência ao atendimento.

Entre os moradores em situação de rua, o perfil é masculino (89% da população) e com idades entre 18 e 39 anos (65%). Em Campo Grande, duas unidades oferecem abrigo: o Centro Pop (Centro de Referência Especializado para População em Situação de Rua), atende 80 pessoas por dia, e o Cetremi (Centro de Triagem e Encaminhamento do Migrante), faz atendimento para 100 pessoas todos os dias.

Além disso, a SAS alega que toma outras medidas sociais como forma de ajuda à esta população, como o atendimento feito por psicólogos, advogados, educadores sociais, atendimento para necessidades como higiene e alimentação, visitas e reinserção familiares, além de atividades de sociabilidade.

No começo de 2018, a Secretaria lançou a campanha ‘Onde a esmola acaba, o direito começa’, que orientava comerciantes a não ajudarem os moradores de rua com dinheiro. Na época, o secretário de Assistência Social, José Mário Antunes da Silva, justificou que a esmola alimenta uma falsa esperança. “Com isso [esmola], elas se recusam a aceitar o acolhimento da assistência social, que tem todo um suporte de encaminhamento para que haja de fato a retomada da dignidade desse cidadão”, afirmou.

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