Pequena vila na região do Paredão é rota de fuga de garimpeiros em RR

Com casas simples, ruas poeirentas, alguns poucos estabelecimentos comerciais e igrejas, e localizada a duas horas de carro de Boa Vista, Vila Reislândia é um dos principais pontos de parada dos garimpeiros que deixam os locais de mineração ilegal de ouro na região do rio Uraricoera, nas terras yanomami. Depois de uma viagem de barco […]

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(Foto: Rovena Rosa / Agência Brasil)

Com casas simples, ruas poeirentas, alguns poucos estabelecimentos comerciais e igrejas, e localizada a duas horas de carro de Boa Vista, Vila Reislândia é um dos principais pontos de parada dos garimpeiros que deixam os locais de mineração ilegal de ouro na região do rio Uraricoera, nas terras yanomami.

Depois de uma viagem de barco que pode durar alguns dias – ao custo de dois e cinco gramas de ouro – segundo relatos de garimpeiros, eles precisam desembarcar em um ponto chamado de “beira” e ainda encarar uma esburacada estrada de terra de quase 40 quilômetros a bordo de uma caminhonete, em um trajeto que custa R$ 250, para chegar à pequena vila.

Vila Reislândia (RR), 11/02/2012, Vila Reislândia, região também conhecida como Paredão, é passagem para quem vem das áreas de garimpo ilegal de ouro no rio Uraricoera.

Vila Reislândia (RR), 11/02/2012, Vila Reislândia, região também conhecida como Paredão, é passagem para quem vem das áreas de garimpo ilegal de ouro no rio Iraricoera. – Rovena Rosa/Agência Brasil

A área onde fica Reislândia é mais conhecida como Paredão. Ali já funcionava como ponto de chegada e saída daqueles que buscavam o sonho de enriquecer na região do Uraricoera, rio que corta as terras yanomami e vai desaguar no Rio Branco, já na capital Boa Vista.

Rota de fuga

Mas, com a Operação Libertação, que reúne forças governamentais para acabar com a atividade garimpeira ilegal nas terras yanomami, o local virou uma efervescente rota de fuga. Ali, dezenas de motoristas de aplicativo fazem fila, próximo a um posto de gasolina, para ajudar a evacuar os garimpeiros da região.

Uma corrida até Boa Vista custa R$ 150 por pessoa em uma viagem coletiva. O clima entre os motoristas é de desconfiança em relação à imprensa e aos carros de polícia que eventualmente circulam por ali, mas também de competição entre eles. Quando uma caminhonete chega da “beira”, com um grupo de garimpeiros, os motoristas disputam a corrida.

Alguns esperam horas pela oportunidade de conseguir a “corrida”. Vários deles haviam pernoitado em Reislândia e, ao meio-dia deste sábado (11), ainda esperavam os primeiros clientes garimpeiros chegarem da “beira”.

De repente, uma caminhonete surge na estrada, vindo do rio, e entra em velocidade pela rua principal de Reislândia, mas não para no posto de gasolina onde os motoristas de aplicativo estão concentrados. Um deles, possivelmente de forma já previamente acertada, segue a caminhonete até uma casa de madeira.

Três garimpeiros

Ali, três garimpeiros descem da caminhonete com seus poucos pertences e acertam a corrida até Boa Vista. O paraense Marco Rogério Brandão, de 51 anos, é um deles.

Há dez anos trabalhando como garimpeiro, sendo os últimos sete meses nas terras yanomami, ele deixou o garimpo na última quinta-feira (9), mas, devido a problemas no barco, que quebrou o motor duas vezes, só conseguiu chegar dois dias depois na Vila Reislândia, pagando 3 gramas de ouro para o barqueiro (aproximadamente R$ 900 na cotação de hoje).

Brandão planeja se estabelecer agora em Itaituba, no Pará, outra cidade garimpeira, onde sua família tem uma propriedade rural. Mas ele diz que não quer mais saber de garimpo. Seu plano agora é ajudar o pai já idoso a cuidar da roça.

“Eu queria uma vida melhor pra família. Tenho uma filha aqui [no Brasil] e outra na Venezuela. Antes do garimpo, eu trabalhava com roça. Naquele negócio da pessoa querer ter uma vida melhor, entrei no garimpo. Eu sei que tem muitos que querem tirar proveito em cima da gente, que estão lá pra roubar, essas coisas. Eu, graças a Deus, não”.

O garimpeiro conta que os últimos dias foram tensos. Tinha medo de ser preso ou maltratado pelas forças policiais. “Decidi sair há mais ou menos uns cinco dias. A gente tinha televisão no barraco e via as notícias. E eu disse: “rapaz, vamos simbora”. Tem muita gente [lá dentro] que diz: “eu não vou [embora]”. Mas pra eles nós somos criminosos. E criminoso sabe como é tratado, né?”.

Uma de suas principais angústias foi não ter conseguido ganhar o que pretendia. “Tá certo que eu entrei sem nada, mas vou sair sem nada… Eu até queria ter o bastante pra eu trazer, porque eu saía de lá carregando nem que fosse a pé. Eu queria ter um quilo de ouro comigo. O pouquinho que eu ganhei, [vendi no próprio garimpo e] fizeram transferência por pix”.

Outro que está no grupo é um venezuelano que, por sua condição de imigrante, não quis se identificar. No Brasil há seis anos, ele diz trabalhar nas terras yanomami há mais de dois. “Vou voltar pra Venezuela. Porque pagar aluguel aqui, não dá”.

Ele conta que chegou a tentar se inserir no mercado de trabalho formal brasileiro, mas não conseguiu. A opção foi tentar a vida no garimpo. Mas, depois de ter que fugir das terras yanomami, assim como Brandão, não quer mais saber desse tipo de trabalho.

Já o maranhense Aldecir Ferreira da Silva, de 60 anos, que trabalha com garimpo há mais de 40 anos, demonstra insatisfação com as ações policiais para expulsar garimpeiros das terras indígenas. “O cara vem ganhar um dinheiro pra pagar o estudo do filho, pra comprar o que comer, e o que tá acontecendo aí? Nós ‘tava’ ali trabalhando e agora ‘tem que vim’ embora todo mundo… Isso é errado. Eu tava há sete meses aí. A ordem [dos policiais] é pra [gente] ser preso. Quem não fica preocupado em ser preso? Por isso eu vim embora. Todo mundo tá preocupado com a prisão”.

Os três aceitam conversar, mas não querem ser fotografados pela reportagem. Estão cansados e só pensam em sair dali. Fazem um almoço rápido numa pequena pensão e depois caem na estrada, inicialmente, rumo a Boa Vista, e depois para algum lugar, longe das terras yanomami.

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