Juíza de Goiás inspira ao trocar ‘juridiquês’ por linguagem simples

“Doutora, eu gostaria de marcar um horário com a senhora porque não entendi se ganhei ou se perdi o processo”, escutou certa vez a juíza Aline Tomás Vieira, titular na 2.ª Vara de Família e Sucessões de Anápolis (GO). Para levar mais transparência e eficiência à comunicação processual e evitar dúvidas como essa, cinco órgãos […]

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Buhatem responde a uma sindicância perante o CNJ por causa de manifestações que violariam normas da magistratura (Agência Brasil)

“Doutora, eu gostaria de marcar um horário com a senhora porque não entendi se ganhei ou se perdi o processo”, escutou certa vez a juíza Aline Tomás Vieira, titular na 2.ª Vara de Família e Sucessões de Anápolis (GO). Para levar mais transparência e eficiência à comunicação processual e evitar dúvidas como essa, cinco órgãos do sistema de Justiça goiano assinaram um termo de implementação da linguagem jurídica simples em seus atos.

A cooperação, inédita no País segundo a juíza, que também coordena o programa, pretende que o cidadão compreenda do começo ao fim seu processo, hoje ainda contaminado pelo vocabulário antigo utilizado nos tribunais – ou pelo “vetusto vernáculo manejado no âmbito dos excelsos pretórios”.

A iniciativa teve origem em um projeto de Aline durante a pandemia. Os fóruns fechados e a distância dos advogados fez com que muitas pessoas solicitassem atendimento virtual para entender sentenças. Ela, então, passou a enviar um resumo ilustrado do ato por aplicativo de mensagem.

Em dez meses de envio da peça, com ícones, fluxogramas e frases curtas, a taxa de recursos recebidos pela vara caiu 26,8% comparada ao mesmo período do ano anterior. “Quanto menos as pessoas recorrem, mais satisfeitas elas ficam com o resultado”, explica.

Em setembro deste ano, o Tribunal de Justiça do Estado de Goiás (TJ-GO) levou a linguagem jurídica simples para além dos muros da vara de Anápolis em cooperação com a Ordem dos Advogados do Brasil, o Ministério Público, a Defensoria Pública e a Procuradoria-Geral do Estado. “Temos uma união de esforços em que todos nós falaremos a mesma língua com o usuário da Justiça”, afirma a juíza.

“Nenhum estudante chega à faculdade de Direito escrevendo de forma prolixa, nós aprendemos a escrever de forma prolixa. É preciso reformular”, diz o advogado e linguista Carlos André Nunes, professor de um instituto com seu nome que ensina linguagem jurídica simples em Goiânia.

De acordo com ele, a modalidade de escrita deve ter correção gramatical, sem coloquialidade; eliminação de termos técnicos desnecessários, como “ergástulo público” para cadeia ou “consorte supérstite” para viúvo; organização, com princípios de visual law; e peças curtas.

Segundo o professor, ao escrever de forma clara e coesa, a petição é lida de forma mais rápida, o que facilita a decisão do juiz. Outro ganho é a credibilidade. “Quando o cliente entende, passa a confiar mais no advogado.”

Esses benefícios foram notados no primeiro caso com linguagem jurídica simples do advogado Sidnei Pedro Dias, de Anápolis. Em menos de 24 horas o divórcio foi decretado de forma liminar, e o cliente, em seu primeiro processo judicial, conseguiu ler a petição de seis páginas durante o expediente. “Na mesma hora eu li e compreendi, não precisei tirar nenhuma dúvida. Acredito que facilitou para mim e para quem recebeu”, disse o contratante.

A linguagem jurídica simples ainda não faz parte da grade curricular das faculdades de Direito goianas, segundo o professor Carlos André. No entanto, para ele, a medida introduz no mercado o consultor em linguagem jurídica simples, um novo profissional que o curso de Letras se prepara para formar com a primeira especialização em Goiás. A habilidade também já é cobrada em concurso público para juízes do Estado. Segundo Aline, há representantes de três outros Estados em conversas sobre o modelo adotado em Goiás.

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