Desafio será aplicar o sínodo nas comunidades locais, apontam religiosos
Os participantes do sínodo pela Amazônia sabem que os desafios começam agora, com o fim do encontro e o retorno às suas comunidades. E esse é o tom presente entre os religiosos na manhã deste domingo, 27, no Vaticano. “A fase pós-Assembleia do Sínodo é a mais importante. Nela, como Igreja no território, como Repam, […]
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“A fase pós-Assembleia do Sínodo é a mais importante. Nela, como Igreja no território, como Repam, e com os povos e comunidades, somos os principais atores , e devemos retornar àqueles que vivem e esperam no território”, afirmou o cardeal dom Cláudio Hummes, arcebispo emérito de São Paulo e presidente da Rede Eclesial Pan-Amazônica, em comunicado divulgado pelo organismo. “Trazer de volta o que eles nos confiaram com suas vidas, esperanças, gritos e alegrias, para continuar tecendo juntos neste momento em que o mais importante começa.”
Nesta manhã, ele foi um dos cardeais que co-celebraram a missa oficial de encerramento do encontro dos bispos, na Basílica de São Pedro. Papa Francisco voltou a cobrar da Igreja uma postura ao encontro dos mais pobres. “Neste sínodo, tivemos a graça de escutar as vozes dos pobres e refletir sobre a precariedade das suas vidas, ameaçadas por modelos de progresso predatórios”, pontuou o papa.
“E, no entanto, precisamente nesta situação, muitos nos testemunharam que é possível olhar a realidade de modo diferente, acolhendo-a de mãos abertas como uma dádiva, habitando na criação, não como meio a ser explorado, mas como casa a ser guardada, confiando em Deus”, disse ainda o sumo pontífice.
“Quantas vezes, mesmo na Igreja, as vozes dos pobres não são escutadas, acabando talvez vilipendiadas ou silenciadas porque incômodas? Rezemos pedindo a graça de saber escutar o clamor dos pobres: é o clamor de esperança da Igreja. Assumindo nós o seu clamor, também a nossa oração atravessará as nuvens”, declarou.
A missa dominical contou com a participação dos padres sinodais, autores do documento divulgado na noite de sábado, e de representantes de povos indígenas da região amazônica.
Trabalho nas comunidades
“Reconhecendo esses novos compromissos, nos sentimos convocados a levá-los aos nossos territórios, convocados a participar e transformar nossas realidades eclesiais particulares, colocando a vidas e esperando que o papa possa discernir tudo o que ouviu de nós durante esses dois anos (e nessas três semanas de assembleia), para que nos devolva sua palavra e orientações na Exortação Apostólica, se possível, ou em algum outro tipo de documento, o que poderia ocorrer em março do próximo ano. Sejamos pacientes para esperar que nosso irmão Francisco nos brinde com seu ensinamentos depois de nos ouvir”, escreveu Hummes.
Esse retorno dos bispos às suas comunidades é aguardado pela Igreja, que espera visualizar em suas atuações as mudanças de postura cobradas pelo próprio encontro, seja na luta para conter a urgente crise climática, seja no acolhimento aos imigrantes, seja no respeito aos povos indígenas. “O documento foi fiel ao que foi dito na assembleia. Resta saber se a Igreja, seus bispos, padres, leigos e religiosas vão ser capazes de assumir a mudança”, comenta o teólogo e filósofo Fernando Altemeyer Júnior, professor do Departamento de Ciência da Religião da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP).
“Na minha opinião, o desafio dos desafios é a interculturalidade”, analisa. Ele destaca o item 51 do documento sinodal como o mais carregado de complexidade, justamente porque fala da “inculturação” como “encarnação do Evangelho nas culturas autóctones”. “Eis a questão shakespeariana: ser ou não ser cultura com autonomia e vigor sem colonialismo nem negação da identidade?”, provoca Altemeyer. “A Igreja com rosto amazônico está apenas nascendo.”
“Será possível pensar um Cristo com rosto amazônico? Uma missa com cantos amazônicos? Um padre e um bispo nascidos na Amazônia? Diaconisas amazônicas? Clero amazônico? Cantos amazônicos? Fé com identidade amazônica? Depois de quinhentos anos é algo que precisa ser gestado e cuidado com amor”, prossegue o professor. “A resposta é sim. A questão central é quem terá coragem de dar o salto qualitativo do mergulho cultural e aprender os idiomas e as traduções.”
Para o cardeal Hummes será preciso muito cuidado. “O documento final deste sínodo será um instrumento muito importante, mas não é o documento que determinará os novos caminhos. Precisamos ter cuidado com aqueles que não querem mudar nada, que querem que as coisas acabem aqui e também cuidado com os profetas de calamidades que expressam que nada disso faz sentido, porque olham à luz de suas próprias categorias autorreferenciais”, afirmou, no comunicado da Repam. “Em ambos os casos, eles se negam a ver e impedem que outros o façam, que esse é o momento preciso, um Kairós esperado que continua fluindo como um rio de água viva e que já não pode ser interrompido pelo que já foi e alcançou, o que já é e está determinado como novidade, o novo que inevitavelmente será para abrir novos horizontes do Reino.”
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