Justiça nega tentativa de Marquinhos para censurar Midiamax sobre inquérito de assédio sexual
Ex-assessor da prefeitura foi flagrado quando acompanhou vítima para ‘desmentir’ denúncia em cartório
Aliny Mary Dias, Adriel Mattos –
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O TRE-MS (Tribunal Regional Eleitoral de Mato Grosso do Sul) rejeitou a tentativa de censura do candidato do PSD ao Governo do Estado, Marquinhos Trad, contra o Jornal Midiamax. A defesa de Marquinhos foi à Justiça para remover a reportagem “VÍDEO flagrou ex-servidor preso por coação com suposta vítima de Marquinhos em cartório”, publicada na última quarta-feira (14). A Justiça eleitoral, no entanto, negou todos os pedidos do candidato e confirmou que a apuração do Midiamax foi correta e não representa “inverdade”.
A decisão foi publicada no Mural Eletrônico, da Justiça Eleitoral, neste sábado (17). Na petição, os advogados do ex-prefeito de Campo Grande acusam o jornal de publicar “matéria sensacionalista e sabidamente inverídica”. Vale ressaltar que o Jornal Midiamax sempre se limita a noticiar reportagens devidamente apuradas, elaboradas por jornalistas profissionais.
Neste caso, a reportagem foi construída com base em laudo policial oficial a que o Midiamax teve acesso. Além do documento, a reportagem também teve acesso a vídeos de câmera de segurança, na íntegra, sem edições ou cortes, que revelaram a movimentação no cartório no mesmo dia em que o ex-servidor investigado por coação levou a testemunha para assinar desistência de seu depoimento dado à Polícia Civil.
Naquele mesmo dia, em julho, a testemunha registrou documento que oficializava a decisão dela de “voltar atrás” e mudar a versão do depoimento dado à Polícia Civil. No depoimento inicial, a mulher relatou ter sido vítima de assédio supostamente cometido por Marquinhos.
Defesa de Marquinhos acusou Midiamax de divulgar suposta fake news
A defesa do candidato alega que “o vídeo é todo borrado e sem áudio, e a única coisa que se percebe é se tratar de um local com imagens de pessoas circulando, em pé e/ou sentadas”. O Midiamax esclarece que possui o material bruto, de uma câmera de segurança. O vídeo publicado na reportagem foi editado para proteger a identidade das eventuais vítima e pessoas que aparecem nas imagens e que não têm relação com o caso.
“Toda a narrativa construída na matéria é engendrada para dar credibilidade ao vídeo, porém, é impossível identificar um ponto sequer dos fatos narrados. Portanto, o vídeo claramente foi criado para dar sustentação à matéria criada para atacar e ofender a honra do candidato Marcos Trad, uma verdadeira fake news”, sustenta a defesa do candidato ao Governo, que não conseguiu convencer a Justiça.
Por fim, os advogados pediram a remoção da reportagem e da publicação na página do Facebook do jornal, além de proibir o Midiamax de relatar qualquer desdobramento do vídeo, inclusive no WhatsApp.
Juiz do TRE decide que reportagem do Midiamax está correta e rejeita censura de Marquinhos
Em sua decisão, o juiz substituto do TRE, José Eduardo Chemin Cury, observa que a Constituição Federal garante a liberdade de expressão e a Resolução TSE 23.610/2019 visa apenas tirar de circulação notícias comprovadamente falsas.
“Ressalte-se que os cidadãos têm o direito de obterem informações acerca dos candidatos, sejam positivas ou negativas, sendo este um dos pilares do regime democrático e da sadia disputa política”, escreveu.
Cury prossegue destacando que a Constituição ainda prevê o direito da liberdade de imprensa e que nenhum direito constitucional é absoluto. Apesar disso, o magistrado não viu qualquer transgressão por parte do Midiamax.
“O exame da matéria impugnada indica que, embora desfavorável à imagem do candidato, seu conteúdo não traz elementos suficientes à configuração de qualquer transgressão comunicativa, uma vez que não se depara com inverdade inconteste e patente, mas mera interpretação e narração de fatos, amparadas por vídeo, ao qual os jornalistas, eventualmente, tiveram acesso”, pontuou.
O juiz do TRE frisa ainda “que as lacunas e contradições que, nos termos da inicial, existiriam na reportagem tem amparo na interpretação da própria representante, vindo desacompanhada de elementos adicionais que corroborem sua tese”, ou seja, a defesa de Trad não comprovou danos à sua imagem ou qualquer violação da legislação brasileira pelo jornal.
“Ante o exposto, ausentes os requisitos necessários, indefiro o pedido de tutela de urgência e determino o regular processamento do feito”, concluiu Cury, que deu prazo para que o advogado do Midiamax e a Procuradoria Regional Eleitoral do MPF (Ministério Público Eleitoral) se manifestem.
Ex-servidor foi flagrado com suposta vítima de Marquinhos em cartório
Pelas imagens gravadas no dia 25 de julho deste ano é possível ver quando o ex-servidor chega ao cartório em um veículo HB20. No banco do passageiro estava uma mulher – a vítima que foi levada ao cartório. Eles descem do carro e se juntam a mais duas pessoas, um homem e uma mulher, que não foram identificados.
Os quatro entram no cartório e a vítima aparece apreensiva, sempre levando as mãos na boca. Na sequência, os quatro sentam em um dos sofás da espera do local e algum tempo depois chega uma outra mulher, que é advogada, para auxiliar os trâmites da declaração que será registrada no cartório.
Em outro momento, todos se reúnem em uma sala que não é monitorada por câmeras. O horário, segundo as imagens, é por volta das 16h52 do dia 25 de julho. Todos sentam no sofá e a vítima aparenta apreensão com a situação. O ex-servidor, que está em outro canto do cartório, passa pela jovem e a encara, a vítima leva as mãos ao rosto e aparenta chorar.
A mulher, que não foi identificada e estava junto com o grupo, senta ao lado da vítima tentando acalmá-la. A vítima enxuga as lágrimas e demonstra mais uma vez apreensão, já que o ex-servidor passa novamente por ela a encarando. Já por volta das 17h55, todos deixam o cartório e a advogada sai com uma pasta contendo a documentação.
Na garagem, a vítima é ‘escoltada’ pelo ex-servidor até o carro dele. Ela vai embora junto com ele, no banco traseiro do HB20.
Coação de vítimas
Duas vítimas relataram que no dia 18 de julho de 2022 foram procuradas pelo ex-servidor. Ele disse que tinha um ‘negócio’ bom para elas e que envolvia dinheiro, mas precisava falar pessoalmente em seu lava-jato. No dia 22, eles se encontraram e ele mandou que as mulheres desligassem os celulares e deixassem as bolsas para fora do escritório.
Durante a conversa, o ex-servidor falou para as vítimas “deixarem para lá” a denúncia, já que tinham família, amigos e filhos e que a investigação demoraria dois anos no mínimo, não daria em nada e ainda exporia a imagem delas. Ainda segundo as mulheres, a conversa do ex-servidor era intimidadora.
O Jornal Midiamax tenta, desde sábado (10), contato por telefone, devidamente registrado, com a defesa de Marquinhos Trad e diretamente com o ex-prefeito a respeito das novas denúncias envolvendo coação de testemunha, no entanto, as ligações não foram atendidas até a publicação deste texto. O espaço segue aberto para manifestação.
Assista ao vídeo que flagra a movimentação do ex-servidor junto da testemunha:
Esquema de prostituição dentro da prefeitura
Uma testemunha que trabalhou entre os anos de 2016 a 2018, na prefeitura, revelou em depoimento que notou que havia um esquema de prostituição dentro do Paço Municipal e que era comandado pelo ex-servidor. Segundo a testemunha, o ex-servidor quase não aparecia na prefeitura e quando aparecia apresentava comportamento de aliciamento e gerenciamento de meninas para a prostituição.
Ainda segundo o depoimento, foi percebido o aliciamento de mulheres jovens, com o mesmo perfil: magras, morenas, maquiadas, esteticamente produzidas e, principalmente, de hipossuficiência financeira. Elas eram inseridas no Proinc (Programa de Inclusão Profissional), porém só trabalhavam uma semana e depois desapareciam e logo surgiam outras meninas.
Casa de prostituição
O ex-servidor ainda mantinha uma casa de prostituição, onde as meninas ‘alugavam’ quartos e repassavam ao ex-servidor o valor de R$ 150 a diária mesmo não tendo programas marcados. No local, eram vendidas bebidas alcoólicas, mas as garotas não recebiam participação nas vendas – as bebidas chegavam a ser comercializadas por R$ 15 uma cerveja, por exemplo.
No local, ele ainda mantinha um quarto onde, segundo informações, dormia parte da semana. O ex-servidor fazia anúncios das garotas em um site de acompanhantes. As meninas eram responsáveis pela organização da casa que tinha uma faxineira uma vez por semana.
Prisão e indiciamento
O ex-funcionário do município foi preso no dia 31 de agosto, após o cumprimento de mandados expedidos pela Deam (Delegacia Especializada de Atendimento à Mulher). Ele foi indiciado no mesmo dia de sua prisão pelos crime de favorecimento à prostituição, coação no curso do processo mediante ameaça e corrupção ativa de testemunhas.
No dia de sua prisão, foram cumpridos mandados de busca e apreensão. Foram apreendidos material de campanha de Marquinhos Trad. Outros objetos como celulares foram apreendidos pela polícia.
Em julho de 2021, ele foi exonerado. O ex-servidor foi nomeado em fevereiro de 2017, como gestor de projeto na Subsecretaria de Defesa dos Direitos Humanos e depois atuou como gestor de projeto no gabinete do ex-prefeito até julho de 2021, quando foi exonerado.
MPMS recomendou arquivar 8 denúncias
Um parecer do MPMS (Ministério Público de Mato Grosso do Sul) foi favorável ao trancamento parcial do inquérito policial que apura denúncias de crimes sexuais contra o ex-prefeito de Campo Grande, Marquinhos Trad. São casos em que não foram identificados crimes ou nos quais os ilícitos já prescreveram, segundo documento ao qual o Jornal Midiamax teve acesso. O parecer foi assinado em 24 de agosto pelo promotor de Justiça Alexandre Capiberibe Saldanha.
Saldanha pontuou caso a caso, sendo que em 6 depoimentos ele identificou situações em que achou que cabe atender ao pedido da defesa de Marquinhos, para trancar o inquérito policial. Como os relatos, que surgiram todos desde o mês de julho, se referem a fatos que teriam ocorrido há vários anos, como em 2005 e 2013, os supostos crimes denunciados já teriam prescrito.
Já no dia 5 de setembro, a 3ª Vara Criminal de Campo Grande arquivou seis denúncias contra Marquinhos Trad, por assédio sexual e tentativa de estupro. A Justiça concluiu que houve prescrição dos crimes, ou seja, que o tempo entre a prática dos supostos delitos e o julgamento dos casos excedeu o que é previsto no Código de Processo Penal.
A decisão de arquivamento foi publicada no Diário Oficial do dia 5, onde foi reconhecida a ocorrência da prescrição da pretensão punitiva por parte do Estado contra Marquinhos Trad. Foi determinado o arquivamento parcial do inquérito. Ainda segundo a decisão, o arquivamento não implicará em retirar o depoimento das vítimas, que poderão servir de testemunhas de outros delitos também objetos da investigação.
Marquinhos alegou ‘armação política’
Marquinhos Trad alegou, na época das denúncias, que tudo seria parte de uma ‘armação política’ para prejudicar a candidatura dele a governador de Mato Grosso do Sul após uma discussão por WhatsApp com o secretário de Estado de Justiça e Segurança Pública, Antonio Carlos Videira.
Marquinhos admitiu que cometeu adultério com ao menos duas das denunciantes enquanto era prefeito de Campo Grande, mas negou os crimes sexuais. Já em 2018, uma denúncia envolvendo suposto assédio contra uma menor aprendiz da Prefeitura chegou ao conhecimento da Polícia Civil.
Na época, o caso acabou arquivado e a jovem, conforme apurou o Jornal Midiamax, ganhou um cargo sem concurso público no gabinete da Prefeitura de Campo Grande.
Denúncias de assédio sexual
Após o primeiro registro feito por uma das vítimas, na Corregedoria da Polícia Civil, outras mulheres procuraram a Deam para fazer denúncias de assédio. Em coletiva no dia 26 de julho, a delegada do caso, Maíra Pacheco, afirmou que a informação de suposto pagamento feito às mulheres para registrarem denúncias não consta no inquérito.
No entanto, conforme a delegada, tudo seria investigado e caso seja provado que as mulheres tenham recebido dinheiro, elas podem responder por falso testemunho. O crime tem pena de 2 a 4 anos, além de multa.
“Mas, não diminui outras denúncias das outras vítimas que procuraram a delegacia”, disse Maíra Pacheco. Ainda segundo a delegada, sobre as denúncias de assédio sexual, em “crimes como esse, a única materialidade são os relatos das vítimas. Temos de ter respeito em um país patriarcal”.
Na época, a delegada ainda explicou que outras pessoas estavam sendo investigadas, mas não revelou por quais crimes e nem a quantidade de suspeitos. Não existe ainda previsão de quando Marquinhos Trad deve ser ouvido pela polícia.
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