Ministros decolaram mais de quarenta vezes em três meses, quase uma viagem a cada dois dias

Praticamente dia sim, dia não eles estão voando. Os ministros Pepe Vargas (Desenvolvimento Agrário), José Eduardo Cardozo (Justiça), Ideli Salvatti (Relações Institucionais) e Marco Antonio Raupp (Ciência e Tecnologia) foram os campões de viagens em jatinhos da Força Aérea Brasileira (FAB) nos últimos três meses – de 12 de julho a 12 de outubro. Em […]

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Praticamente dia sim, dia não eles estão voando. Os ministros Pepe Vargas (Desenvolvimento Agrário), José Eduardo Cardozo (Justiça), Ideli Salvatti (Relações Institucionais) e Marco Antonio Raupp (Ciência e Tecnologia) foram os campões de viagens em jatinhos da Força Aérea Brasileira (FAB) nos últimos três meses – de 12 de julho a 12 de outubro.

Em 93 dias, Vargas usou as aeronaves 43 vezes – quase um voo a cada dois dias. Cardozo, por sua vez, viajou 42 vezes. Ideli e Raupp decolaram 41 vezes cada. O quarteto destaca-se entre o primeiro escalão presidencial pela frequência com que requisitam aviões da FAB para se deslocar, seja por causa das agendas de trabalho ou para voltar de Brasília para suas casas nos respectivos estados. Nesses dois casos o uso das aeronaves é legal.

No ranking, logo abaixo deles, aparece a ministra Marta Suplicy (Cultura), com 33 requisições à Aeronáutica. Missões em geral, a serviço dos Poderes Executivo e Legislativo, somam 35 voos.

O site de VEJA analisou os dados de registro de voos de autoridades disponíveis no site da FAB. A Aeronáutica passou a divulgar parte das informações sobre os voos pela primeira vez em meados de julho, após a descoberta da chamada farra dos jatinhos. A Controladoria-Geral da União recomendou ao Ministério da Defesa a publicação dos dados.

À época, o ministro Garibaldi Alves (Previdência Social) e os presidentes da Câmara dos Deputados, Henrique Eduardo Alves (PMDB-RN), e do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL), foram flagrados usando jatinhos para fins particulares – o que é considerado irregular. Garibaldi requisitou aeronave para assistir à final da Copa das Confederações, entre Brasil e Espanha, no Rio de Janeiro. Henrique Alves deu carona a familiares que também foram ver a partida no Rio. Renan foi a um casamento na Bahia.

Mesmo após o episódio, a FAB ainda mantém sigilo sobre a identidade dos passageiros transportados e não revela o custo da hora de voo das autoridades. “Como os modelos utilizados para apoiar as autoridades são os mesmos utilizados em outros esquadrões da Força Aérea, de emprego eminentemente militar, o custo de operação é considerado um dado estratégico para a segurança nacional”, diz a FAB. Questionados pela reportagem, nenhum dos ministérios soube dizer quanto desembolsou com os deslocamentos de seus ministros.

Legislação – O voo de autoridades dos Poderes Executivo, Legislativo e Judiciário, é legal. Um decreto do ex-presidente Fernando Henrique Cardoso (PSDB), no entanto, prevê que a viagem deve ser justificada. Ministros de estado e chefes do Legislativo federal são autorizados a usar as aeronaves “por motivo de segurança, emergência médica, em viagens a serviço e para o local de residência permanente”.

Em geral, os ministros dizem que as viagens são parte da rotina normal das pastas e que respeitam as regras do decreto presidencial 4.244, de 2002, quando decidem usar jatinhos da FAB. O argumento foi usado, por exemplo, pelo Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação e pela Secretaria de Relações Institucionais.

“O ministro Marco Antonio Raupp utiliza as aeronaves da FAB em estrita conformidade com a legislação. A utilização ocorre preponderantemente para encontros de trabalho, em instituições sediadas em diferentes estados e com as quais o ministério executa seus programas, como universidades, institutos de pesquisa, agências de fomento à ciência e à tecnologia, entidades empresariais voltadas para a inovação tecnológica e órgãos públicos da área”, disse a assessoria do ministro.

A assessoria de imprensa da Secretaria de Relações Institucionais disse que “todos os voos da ministra Ideli Salvatti estão de acordo com o decreto”. Ideli tem percorrido estados brasileiros para encontros com gestores federais e prefeitos. No dia 4, por exemplo, esteve em Boa Vista (RR) pela manhã e em Macapá (AP), à tarde, segundo consta em sua agenda pública.

As cerimônias de entregas de benesses a prefeitos, como repasses de recursos federais, assinaturas de convênios e encontros para firmar programas ministeriais e participação em eventos estão por trás de boa parte dos voos em jatinhos da FAB.

Primeiro colocado no ranking de voos, Pepe Vargas afirmou que viaja muito porque é responsável por entregar máquinas do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) e pelo lançamento dos planos safra da Agricultura Familiar e do Semiárido.

“Para realizar essas entregas e lançar os planos, o ministro viaja semanalmente por todo o país. As entregas foram intensificadas, principalmente para a região do Semiárido, como uma forma de amenizar os problemas provocados pela seca. Sendo assim, o ministro Pepe Vargas precisa, em muitos casos, viajar de dois a três estados em uma semana – há casos em que ele entrega máquinas em dois estados num único dia”, disse a assessoria do Ministério do Desenvolvimento Agrário.

Voo do eu sozinho – Na maioria das vezes, Vargas costuma levar diretores e assessores do ministério e do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra). Mas ele também é o campeão, ao lado do ministro Gilberto Carvalho (Secretaria-Geral da Presidência), de voos privê. Entre julho e outubro, Vargas e Carvalho voaram sozinhos em aviões da FAB seis vezes cada – três vezes mais que os ministros Eleonora Menicucci (Políticas para as Mulheres) e Luiz Alberto Figueiredo (Relações Exteriores), que aparecem com duas viagens cada.

Carvalho sempre requisitou os jatos por causa de compromissos da Secretaria-Geral. Três deles ocorreram em sequência no dia 12 de setembro. Carvalho viajou a Cusco, no Peru, para uma palestra da Organização Ibero-americana da Juventude (OIJ), ao lado da secretária nacional da Juventude, a petista Severine Macedo – então presidente da OIJ. Mas voltou sozinho. Em avião da FAB, o ministro fez os trajetos Cusco-Manaus (AM) e Manaus-Fortaleza (CE) pela manhã. Na capital cearense, participou do encontro religioso promovido pela Rede Evangélica Nacional de Ação Social (Renas) – cujo tema era “Caminhos do reino de Deus para crianças e adolescentes”. E voltou à noite, também sozinho, de Fortaleza para Brasília.

Vargas, porém, sempre esteve a caminho de Caxias do Sul (RS), onde mora com a esposa e filhas, em três de suas viagens solo. O titular do Desenvolvimento Agrário diz cumprir “rigorosamente” as normas em vigor. Ele afirma voltar para casa sozinho, em jatos da FAB, quando “não tem agenda oficial” e “o ritmo de trabalho ou o horário do deslocamento fogem dos horários de voos comerciais”. Vargas também diz que opta por voos convencionais “quando os compromissos do ministério permitem que ele se ausente durante o período de deslocamento”.

A Secretaria de Políticas para Mulheres afirmou que Eleonora participa de cerimônias de assinaturas de termos de adesão a programas federais nos estados e municípios e que a “complexidade da agenda exige deslocamentos nem sempre possíveis com o uso de voos comerciais”.

Os aviões que transportam ministros, secretários e chefes do Legislativo e do Judiciário fazem parte do Grupo de Transporte Especial da FAB – diretamente vinculado ao gabinete do comandante da Aeronáutica. A assessoria de imprensa da FAB disse ao site de VEJA que os esquadrões possuem dezessete aeronaves para esta função, todas com capacidade entre cinco e cinquenta passageiros. Quando não estão em operação, os aviões são usados para treinos de formação de pilotos e transporte de órgãos, a pedido do Ministério da Saúde, conforme a Aeronáutica.

A FAB coloca à disposição dos ministros dois Embraer E-145 (um de cinquenta e outro de 36 lugares), dois E-135 (ambos de catorze assentos), seis E-135 BJ (doze lugares cada), três E-120 (dois com doze assentos e um com 27), além de três Learjet L-35 e um L-55 (todos com cinco lugares).

Tivesse a FAB uma frota comercial, os jatinhos que decolam somente com um passageiro dariam prejuízo à companhia. Caso fretasse um jatinho Learjet 35 (de oito pessoas) na Líder Aviação, uma das empresas mais antigas do ramo no país, o ministro Pepe Vargas gastaria 70 000 reais no percurso de Brasília a Caxias do Sul (RS) e 88 000 reais, para ida e volta.

Lar – O presidente da Câmara (catorze voos), o ministro da Justiça (dez voos) e o presidente do Congresso Nacional (nove) foram os que mais usaram os aviões para retornarem aos seus estados.

A pasta da Justiça disse que “os assessores que acompanham o ministro Cardozo em viagens são os que têm responsabilidade direta sobre os assuntos mais importantes e urgentes da semana”. Cardozo também se desloca com seguranças. Procuradas, as presidências do Senado e da Câmara não responderam aos questionamentos do site de VEJA. Assessores de Henrique Alves dizem que ele tem sido rigoroso ao requisitar jatinhos à FAB e que também cumpre agendas políticas nos finais de semana em Natal (RN). Renan costuma levar mais três pessoas toda semana quando faz a rota Brasília – Maceió (AL) – os nomes, no entanto, não são divulgados.

José Eduardo Cardozo foi o ministro que mais compartilhou aeronaves com outras autoridades públicas – dez vezes no total, sendo cinco delas enquanto regressava para casa, em São Paulo.

Partilhar voos é uma das recomendações para economia de recursos previstos no decreto presidencial que regulamentou o uso dos jatinhos. Abaixo de Cardozo, estão os ministros Guilherme Afif Domingos (Secretaria da Micro e Pequena Empresa), com oito voos, Eleonora Menicucci, com sete – ambos residentes em São Paulo; e o ministro Marco Antonio Raupp, seis vezes, que mora em São José dos Campos, no interior paulista.

Ao todo, autoridades do Executivo e do Legislativo brasileiro requisitaram aviões da FAB 817 vezes em 93 dias, de 12 de julho a 12 de outubro deste ano – média de pelo menos oito voos diários ao redor do país.

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