Sindicalista critica Governo do Estado pelo descaso com a Segurança Pública

O investigador da Polícia Civil, Roberto Simião de Souza, 42 anos, é vice-presidente do Sinpol-MS (Sindicato da Polícia Civil de Mato Grosso do Sul) na gestão 2010-2012. Há 10 anos na polícia, Roberto está no comando do sindicato desde 2007. Ele reclama da falta de condições de trabalho, da pouca valorização da categoria, e faz duras […]

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O investigador da Polícia Civil, Roberto Simião de Souza, 42 anos, é vice-presidente do Sinpol-MS (Sindicato da Polícia Civil de Mato Grosso do Sul) na gestão 2010-2012. Há 10 anos na polícia, Roberto está no comando do sindicato desde 2007. Ele reclama da falta de condições de trabalho, da pouca valorização da categoria, e faz duras críticas ao Governo de Estado pelo descaso com a segurança pública.

Casado, pai de dois filhos, com residência na cidade de Dourados, desde que passou a ser sindicalista, Roberto, fica mais tempo em Campo Grande, ou rodando o Estado, onde pode constatar a situação precária das Delegacias de Polícia. O policial sindicalista formou-se este ano em Direito.

Na quinta-feira (29), após uma tentativa de fuga da carceragem da delegacia de Polícia Civil de Caarapó, a reportagem do Midiamax em Dourados acompanhou o sindicalista à delegacia do interior, constsatando a situação precária da carceragem, onde mulheres, homens e jovens, contrariando a legislação, estão presos no mesmo estabelecimento.

Midiamax: As irregularidades encontradas na Delegacia de Caarapó são comuns em outras delegacias do Estado?

Roberto Souza: Aquela situação é comum e só vem se agravando dia a dia, haja vista que o Governo do Estado não tem nenhuma política de retirada dos presos das delegacias de polícia e ampliação de unidades prisionais no Estado, o que contraria toda a legislação vigente do País, inclusive a Constituição Federal e a Lei de Execuções Penais, a lei 7210/84. A Constituição diz que os presos do sexo masculino e as presas do sexo feminino têm que ficar em estabelecimentos prisionais distintos. O que ocorre hoje nas delegacias de polícia é a junção, como a reportagem pode constatar em Caarapó, de mulheres e homens que ficam aprisionados no mesmo espaço físico, inclusive menores, o que viola o Estatuto da Criança e do Adolescente, que diz que o menor só pode ficar no interior de uma delegacia pelo período de cinco dias e ser encaminhado posteriormente a uma unidade de internação de menores, ou, se não houver vaga, ele deve ser posto em liberdade. Mas os juízes e promotores tem descumprido esse artigo do Estatuto da Criança e do Adolescente, e há casos de menores que estão há mais de 45 dias cumprindo medidas sócio educativas no interior de uma delegacia.

Midiamax: Segundo o ECA, qual o destino correto dos jovens infratores?

Roberto: Esses jovens deveriam estar nas UNEIs. Lá sim, se oferece condições melhores de ressocialização para esses menores. Lá tem condições de estudar, ter atendimento psicológico. Em uma sala de delegacia não tem aeração, ensolação, não tem assistência material ou religiosa. O ser humano é jogado em uma cela em condições totalmente insalubres e indignas. Isso é terrível para um adulto que cometeu um crime, imagina para um menor. A gente considera isso uma grave violação dos direitos humanos, mas o nosso Governo do Estado e nosso Secretário de Segurança não estão nem aí para essa situação.

Midiamax: O Governo do Estado não sinaliza nenhuma mudança para o sistema carcerário de MS?

Roberto: Desde 2007 quando assumimos o sindicato, no início da gestão do atual governo, que ele apresentou um projeto que ele apresentou um projeto de construção de 10 cadeias públicas no Estado, com capacidade cada uma para 240 detentos, o que resolveria totalmente o problema de presos no interior das delegacias. Só que nenhuma foi construída. Foram feitas algumas reformas em algumas delegacias, reformas essas que não trouxeram melhorias para as condições dos presos, pelo contrário, por que com a reforma mais tempo eles permanecem ali.

Midiamax: Mas se a situação está irregular não deveria ser acionado o judiciário?

Roberto: O sindicato entrou com várias ações pedindo que o judiciário reconhecesse a ilegalidade do desvio de função do investigador de polícia e do escrivão de polícia na custodia de presos e que determinasse ao Estado de MS que repassasse essa custódia para a instituição constitucional e legalmente criada para isso que é a Agência Penitenciária do Estado, a AGEPEN, mas o judiciário sempre define essas questões em prol do Governo do Estado. A justiça perde a oportunidade de condenar o Estado, o que tem agravado a situação e demonstrado o desinteresse do judiciário em resolver esse problema. O governo diz que consegui para ano que vem uma verba para construir três estabelecimentos do tipo ‘semi-aberto’ e só isso não resolve.

Midiamax: Por que não?

Roberto: Nossos índices de violência são graves. Hoje nos temos no Estado cerca de 11.500 presos, tanto nas delegacias de polícia quanto nas penitenciárias e nós temos 12 mil mandados de prisão em aberto, ou seja, nós precisaríamos ter o triplo de vagas nas penitenciárias para retirar todos aqueles que estão em dívida com a justiça do seio da sociedade. No entanto metade deles está nas ruas e deveriam estar presos.

Midiamax: Com a mudança da Lei da Prisão Preventiva não haverá um ‘desafogamento’ das carceragens?

Roberto: Essa mudança vai aumentar e muito os índices de violência. Porque alguns crimes, o delegado tem agora a obrigação tem a obrigação de ofertar a fiança, só podendo ficar preso por aquele crime se ele for reincidente, ou seja, se já tiver sido transitado em julgado o processo dele em última instância. Se no ínterim de 30 dias ele cometer 10 furtos e for preso em flagrante pelos 10, ele vai sair em liberdade afiançada dos 10. Isso está gerando um sentimento de impunidade muito maior. O pessoal que trabalha na atividade fim da polícia acha que essa lei é um retrocesso, por que é uma forma que a Câmara Federal achou de tampar o sol com a peneira. Ao invés de construir e melhorar o sistema prisional eles acharam uma brecha para não ter que abarrotar os presídios. A situação no país inteiro está chegando no limite máximo. Pela negligência do Estado de não ter feito um planejamento ao longo do tempo, cria-se uma lei que prejudica a sociedade e favorece a bandidagem.

Midiamax: Como estão as condições de trabalho da Polícia Civil no Estado de MS hoje?

Roberto: A Polícia Civil desempenha um serviço essencial para a sociedade. Se você sofre um crime de furto, se você foi lesionado, se ouve um crime contra o seu patrimônio, contra a sua integridade física, quem vai resolver isso é a Polícia Civil. Hoje a polícia desenvolve um trabalho com, mas em condições precárias. Nós temos um quadro legal de 2400 policiais e nós estamos aqui hoje com 1500 na ativa, então a gente tem uma defasagem enorme de 900 policiais, entre investigadores e escrivães, então está muito aquém do ideal. O nosso efetivo vem diminuindo, temos uma previsão de 50 aposentadorias esse ano e esse desvio de função, deixando que o policial civil fique cuidando de preso dentro de delegacia, acaba com a atividade fim dele que é de investigar e de tirar as pessoas da rua que tem dívidas com a justiça. Então essa falta de efetivo se agrava ainda mais com esse desvio de finalidade.

Midiamax: Há previsão para reposição desse efetivo? Há alguma alternativa?

Roberto: O Sindicato tem cobrado, o diretor-geral da Polícia tem cobrado a realização de novos concursos ou até mesmo a contratação de cargos administrativos, que poderiam estar realizando serviços como o atendimento ao público, sendo uma pessoa até mais qualificada. Seria uma questão até de gestão. Esse pessoal do cargo administrativo não precisa de arma, não precisa de colete, não precisa de munição, mão precisa de algema, não precisa freqüentar a academia de polícia, que é um investimento caro. Então como um suporte, como acontece hoje na Polícia Federal que tem cargos administrativos. Lógico, o ideal é também, a contratação de novos investigadores, escrivães e delegados.

Midiamax: Qual seria o efetivo ideal hoje para Mato Grosso do Sul?

Roberto: Esse efetivo de 2400 é o ideal para Mato Grosso do Sul, desde que ele esteja completo. Se você puder contar com 900 policiais para dividir em 150 delegacias seria muito bom. A defasagem é praticamente no interior, nos locais de mais difícil acesso como Paranhos, Sapucaia, Tacurú. É difícil a lotação de policiais nessas cidades. Além disso as delegacias estão operando com uma quantidade mínima de policiais. No caso de Dourados, de abril de 2006 até a atual data, entre pessoas que morreram, que se aposentaram, transferências que nós tivemos, 28 pessoas saíram e poucos vieram, no último concurso vieram três escrivães, então nós temos um déficit de 25 policiais só na cidade de Dourados.

Midiamax: As condições de trabalho são precárias, mas e os salários? Estão defasados?

Roberto: Nós fizemos um comparativo, inclusive in loco, com o Estado do Mato Grosso, cuja população é equivalente a nossa, cuja a área territorial é bem maior e o número de cidade é praticamente o dobro. Lá nas delegacias de polícia não há presos, quem cuida é a Agencia Penitenciária de lá, ou seja, o Estado do Mato Grosso atende a legislação federal e a constituição federal. Lá as promoções dos policiais seguem o critério de serem automáticas, por critério de antiguidade. Com ‘x’ tempo na classe ele é promovido, dependendo de alguns critérios como fazer um curso de especialização.

Midiamax: E quais os critérios de progressão profissional em MS?

Roberto: As nossas promoções aqui no Estado depois da primeira promoção que é automática, mas depois dela o policial não tem garantia de que será promovido, somente com a abertura de vagas que é um percentual em cima do número do quadro, o que causa um afunilamento. Nós temos policial que não conseguiram atingir a classe especial e já conta aí com 32 anos de serviço, sendo que a nossa aposentadoria é com 30 anos de serviço, ou seja, ele já passou dois anos de se aposentar e não consegue por não atingir a classe especial. É um sistema injusto que o Governo do Estado usa como instrumento de barganha política. É um método tão injusto que enquanto você tem pessoas com 32 anos e ainda não conseguiram chegar a classe especial, você tem outros casos, na outra ponta, que pessoas com 10 anos de serviço e já são da classe especial. Então é um critério político e não de prestação de serviço para a população.

Midiamax: Mas existe uma postura dos policiais que justifique um novo critério de promoção e uma nova política salarial?

Roberto: Hoje nós temos mais de 100 policiais em Campo Grande que estão cursando Direito. Nós temos um quadro com mais de 70% dos investigadores e escrivães com nível superior. Porém essa exigência do nível superior não foi adaptada ao salário, nós continuamos com um salário de nível médio. Fazendo um comparativo novamente com o Estado de Mato Grosso, que também exige nível superior, eles acabaram de conseguir que a classe inicial deles, a partir de um escalonamento salarial, para que no final de 2014 a classe inicial deles esteja recebendo por volta de quatro mil reais e a carreira final deles por volta de 11 mil. Isso trás um incentivo para o policial e na própria abertura do concurso vai trazer pessoas mais qualificadas para o concurso, melhorando o nível da polícia, o que é uma exigência da própria sociedade. Nós temos excelentes policiais, mas o próprio Estado não tem formado, forma muito mal e depois as reciclagens não são feitas constantemente.

Midiamax: Com o salário e a progressão profissional desagradando os policiais, não há um aumento da corrupção?

Roberto: Hoje a nossa instituição no Mato Grosso do Sul tem o menor índice de corrupção das Policias Civis no Brasil e é um índice muito pequeno. Esses dados são da própria corregedoria e do Conselho Nacional dos Secretários de Segurança Pública do país. A maioria dos processos administrativos, e o Sinpol acompanha isso de perto, são de faltas disciplinares e não de faltas penais, criminais. Na cidade de Dourados não se vê falar em ninguém que tenha um desvio de conduta. Alguns casos no Estado a gente sabe que tem, mas a maioria desses casos foi apurados pela Corregedoria da Polícia e foram devidamente punidos.

Midiamax: Qual o objetivo do Sinpol na luta salarial?

R.S.: Pra você ter uma idéia a policia civil já chegou a ter um salário inicial aqui no Mato Grosso do Sul equivalente a 10 salários mínimos. O que perfaria hoje mais de R$ 5.500. A intenção do sindicato é fazer uma projeção salarial para que no fim da carreira, quando o policial estiver se aposentando ele venha a receber o equivalente ao salário inicial de um delegado, que seria em torno de R$8.500 após 30 anos de serviço, achamos que é uma recompensa mais que justa. O Governo do Estado sempre diz que está sem caixa para o aumento de salário, mas estudos demonstraram a evolução da arrecadação no Estado e uma diminuição no custo administrativo. O governo anterior aplicava 56% da receita corrente líquida na folha de pagamento. O atual governo aumentou a arrecadação e aplica hoje 42% da receita corrente líquida. Então o Estado está enxuto e tem condições de pagar bem sim.

Midiamax: Esta omissão do Governo do Estado se reflete diretamente na segurança pública?

Roberto: Esse governo sempre fala que investe em segurança pública, diz que é prioridade. Isso não é verdade. Nós do Sindicato sabemos que não é verdade. Ele mostra na televisão que comprou 1000 viaturas, comprou tantas armas, que contratou X policiais. Porém ele não mostra o número de policiais que se aposentaram, quantas viaturas deram ‘baixa’, sofreram acidente, quantas viaturas estão em péssimas condições, ele tem que trocar. Então o Governo do Estado fez, ao modo de ver do sindicato, apenas a manutenção. Não houve nenhuma mudança estrutural significativa no forma de conduzir as polícias, tanto é que a política de achatamento salarial é contraria a política de investimento. Não se tem cursos de aperfeiçoamento, computadores, investimento em perícia, por que a nossa tem muitas deficiências.

Midiamax: Hoje qual delegacia é retrato do abandono do Governo do Estado?

Roberto: Uma questão que tem preocupado o sindicato é o prédio do Cepol, que fica na rua Ceará em Campo Grande. O prédio tem diversos problemas de ordem estrutural, sanitários e de parte elétrica. Não tem nenhum sistema de aeração. Foi feita uma avaliação pela vigilância sanitária, condenando o prédio. O laudo diz que todas as pessoas que ali trabalham, ou freqüentam diariamente estão expondo sua saúde. O Governo do Estado se comprometeu a resolver esse problema até fevereiro deste ano, mas não resolveu.

Midiamax: Tem alguma alternativa viável para as delegacias do Cepol?

Roberto: Nós do sindicato já apresentamos uma solução para o governo, que é levar as delegacias que funcionam lá para o antigo prédio do Fórum, onde hoje funciona a Casa da Cultura. É um prédio preparado, tem celas, elevadores, estacionamento e está sendo subutilizado. Se o Governo do Estado transferisse para lá o Cepol daria para transferir a delegacia da mulher, o Garras, que está muito longe, na saída para Três Lagoas, além de outras unidades como o posto de identificação. Isso acarretaria em uma economia muito grande, além de atender o público com mais dignidade. Só pelo prédio do Cepol são pagos R$ 10 mil em IPTU. O ganho do governo em matéria financeira e em matéria política seria grande. A sociedade sairia ganhando e o governo sairia ganhando. O que tem emperrado essa transferência é que o presidente da Casa da Cultura não quer essa mudança e não aceita dividir o prédio. Onde está a prioridade na segurança pública. Vai haver uma reunião do sindicato com o pessoal do Cepol e a nossa intenção é parar todas as atividades do Cepol até que o Governo do Estado resolva essa situação.

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