Esta resposta peculiar vem do livro “O Guia do Mochileiro das Galáxias”, de Douglas Adams, publicado em 1979, onde ele desenvolve o enredo de uma história divertida de ficção científica. Com seu típico , Adams nos oferece uma aventura cósmica e, nesta jornada, nos apresenta uma superinteligência extraterrestre chamada “Pensador Profundo” que, após sete milhões e meio de anos de reflexão, revela a resposta ao sentido da vida: 42.

O livro nos pega de surpresa, porque, na história, quando finalmente a resposta é descoberta, os criadores da superinteligência se reúnem e perguntam: qual é, exatamente, a pergunta?

Neste ponto da narrativa, somos conduzidos a uma reflexão interessante: sem a pergunta certa, mesmo a resposta mais exata perde seu valor.

Quando nos prometem soluções, precisamos nos tornar peritos em problemas

Tal reflexão serve como prefácio perfeito para uma discussão contemporânea acerca da nossa interação com os avanços tecnológicos. Você provavelmente já ouviu ou leu variantes como “a tecnologia irá roubar seu emprego”. Bom, isso será verdade apenas para quem não souber esquadrinhar e entender problemas.

Explico.

Já se tornou quase senso comum que as tecnologias, principalmente as inteligências artificiais (IA), se tornam, cada vez mais, aliadas poderosas na resolução de uma ampla gama de problemas da humanidade.

É bem verdade que as tecnologias nos trarão um portfólio praticamente infinito de soluções, mas pergunto: o que de fato queremos solucionar? O que precisamente devemos resolver? Quais são os reais problemas? Se às IAs pertencem às soluções, a nós, nos cabe definir os problemas certos a serem resolvidos.

É justamente neste cenário que a piada de Douglas Adams se faz tão relevante. Muitas vezes, estamos tão focados em encontrar a “solução perfeita” que esquecemos de questionar se estamos abordando problemas corretos e de forma adequada.

É como escreveu Rubem Alves, em seu belo livro “Filosofia da Ciência”:

“Quem não é capaz de perceber e formular problemas com clareza não pode fazer ciência. Não é curioso que os nossos processos de ensino de ciência se concentrem mais na capacidade do aluno para responder? Você já viu alguma prova ou exame em que o professor pedisse que o aluno formulasse o problema? O que se testa nos vestibulares, e o que os cursinhos ensinam, não é simplesmente a capacidade para dar respostas? Frequentemente, fracassamos no ensino da ciência porque apresentamos soluções perfeitas para problemas que nunca chegaram a ser formulados e compreendidos pelo aluno. “

A habilidade de questionar com precisão, de permanecer curioso e aberto torna-se uma competência inestimável. É o “stay foolish” que Steve Jobs defendia.

Para termos mais uma analogia, pense na narrativa clássica de Aladim, que encontra uma lâmpada de onde sai um gênio que realizará todos os seus desejos. Dentro deste contexto mágico, o problema de Aladim deixou de ser a busca por solução e passou a ser “qual pedido eu devo formular?”.

O que você deseja resolver? Como você deseja resolver?

Em um mundo repleto de “42s”, a arte de perguntar será um dos diferenciais que nos orientará em nossa busca por significado e progresso.

Desenvolver e cultivar o hábito de levantar bons questionamentos, saber desenvolver perguntas perspicazes para entender o problema é uma das habilidades do futuro. E ainda mais: até chegar nas definições exatas dos problemas a serem solucionados, mas nos depararemos com a inúmeras formas de solucioná-los. E a forma como se constrói soluções importa tanto quanto a solução em si.

Por exemplo, ao convertermos parte de uma grande floresta para áreas agrícolas, resolveremos o problema de áreas cultiváveis, mas criaremos um dilema ecológico e ambiental.

O mundo não é mais sobre soluções, e sim sobre entendimento de problemas e na sinergia e integração de como solucioná-los. Temos todos os recursos necessários a nosso alcance, como em nenhuma outra era da humanidade. Nossos avós diriam que “estamos com a e o queijo na mão”, só temos que tomar o cuidado para não cortar nossa mão em vez do queijo.