Denunciada em setembro de 2021 por desviar pagamento por uso de salas de cirurgia do Hospital do Câncer Alfredo Abrão, em Campo Grande, uma enfermeira assinou acordo de não persecução penal e vai pagar R$ 10 mil à unidade e um salário mínimo para entidades assistenciais.

O caso veio à tona após um médico desconfiar e denunciar a situação ao então conselheiro da unidade, o médico Carlos Alberto Coimbra. Uma sindicância foi aberta e o MPMS (Ministério Público do Estado de Mato Grosso do Sul) acompanhou a situação.

Os desvios teriam ocorrido entre dezembro de 2020 e março de 2021 e totalizaram R$ 46,6 mil. A enfermeira trabalhava no setor de Faturamento da unidade e tinha a atribuição de contatar médicos que realizam cirurgias particulares na unidade para cobrar pagamentos. 

Porém, ela pedia que o dinheiro fosse depositado em sua conta pessoal. A partir disso, ela emitia uma nota fiscal com valor mais baixo para encobrir o desvio.

Consta no relatório final da sindicância que um médico que prestava serviços à unidade desconfiou do pedido de pagamento para a conta pessoal, o que logo despertou a suspeita em funcionários e nos médicos que atuavam no hospital.

Paciente fez vaquinha, pagou Hospital do Câncer, mas “ficou devendo”

A investigação da comissão sindicante trouxe o caso que teria sido emblemático para o corpo de funcionários do hospital. De início, o grupo passou a analisar todos os procedimentos realizados entre novembro de 2020 e maio de 2021.

Foram encontradas diversas inconsistências em pagamentos nesse período, e os médicos envolvidos foram acionados para prestar esclarecimentos. Foi quando eles relataram que pagaram diretamente à colaboradora.

Ela foi ouvida e negou as acusações. Em documento de defesa, a mulher alegou que o médico que a denunciou deveria ter recusado o depósito na sua conta pessoal e procurado a direção do hospital no momento em que desconfiou do pedido de pagamento.

A funcionária negou que tivesse autorização para emitir notas fiscais. Além disso, sustentou que “o ocorrido com o Pix pode ter sido pela correria. Conforme está na conversa, ele solicita o Pix do hospital ao ver minha falha”.

Para corroborar a tese de que não desviou dinheiro, ela apresentou o extrato de uma das contas bancárias. Isso não convenceu a comissão sindicante, que recomendou sua demissão, que foi efetivada por justa causa em maio de 2021.

A diretoria encaminhou o resultado da sindicância para a Polícia Civil. Um inquérito foi instaurado na 1ª Delegacia de Polícia Civil, que ouviu diversas pessoas, incluindo a filha de um paciente que foi prejudicado pela conduta da servidora.

A gestora de recursos humanos do hospital foi ouvida pelo delegado Rodrigo Zanotta, e relatou que um dos casos que mais chamou a atenção foi dessa família, que chegou a fazer uma vaquinha para comprar medicamentos para o tratamento de câncer de um idoso.

A família pagou à enfermeira, mas o desvio gerou uma dívida de R$ 7 mil. A filha do paciente também foi ouvida e contou que o pai tratava um câncer na Santa Casa e ao reencontrar a funcionária, que já era conhecida, decidiu transferir o idoso para o Hospital de Câncer. 

Apesar do pai ser tratado pelo SUS (Sistema Único de Saúde), a medicação era custeada pela família, mas o valor era ressarcido posteriormente. Nisso, a família fez uma vaquinha e depositou para a funcionária R$ 41,3 mil.

Como parte do valor foi desviado, o idoso teve uma dívida com o hospital, que acionou a jovem, que relatou a história. Naquela ocasião, em junho de 2021, a enfermeira já havia sido demitida e denunciada à polícia. A filha ainda esclareceu em depoimento que, apesar do contratempo, o pai não teve o tratamento prejudicado.

Acordo de não persecução penal

O delegado entregou o inquérito à Justiça e recomendou a condenação por estelionato. Porém, o MPMS (Ministério Público do Estado de Mato Grosso do Sul) sugeriu um acordo de não persecução penal.

O hospital concordou e a enfermeira foi condenada a pagar uma reparação mínima pelo dano de R$ 10 mil, parcelada em 20 vezes de R$ 500, além de uma prestação pecuniária de um salário mínimo, ou seja, R$ 1.212, em cinco parcelas de R$ 242.

Essa prestação será repassada a entidades assistenciais indicadas pela Justiça. Com a homologação do acordo, o juiz Waldir Peixoto Barbosa, da 5ª Vara Criminal Residual, decidiu não aplicar pena de prisão, em abril deste ano.