Sobre ação da DPU (Defensoria Pública da União) que acusa a Sejusp (Secretaria de Estado de Justiça e Segurança Pública) de agir à revelia de ordem judicial, o deputado Pedro Kemp (PT) destaca que “é preciso reestabelecer a ordem”. O parlamentar relembra que a questão indígena constitui competência federal, especialmente em casos onde há conflito.

“Parece ser uma decisão política de coibir a atuação do movimento indígena, que tem pressionado à sua maneira o Governo Federal para concluir o processo de demarcação dos territórios indígenas no Estado, que estão todos parados e alguns judicializados”, pontua.

A DPU e outros três órgãos, incluindo a Funai (Fundação Nacional do Índio), recorreram ao TRF-3 (Tribunal Regional Federal da 3ª Região), nesta sexta-feira (14), solicitando habeas corpus para nove indígenas presos em Dourados, a 198 quilômetros de Campo Grande.

Um dos argumentos da ação explica que a desocupação de terreno da Corpal Incorporações e Construções, reivindicada como terra indígena, evidencia que ações de reintegração ocorrem no Estado sem ordem judicial “revelando um padrão de comportamento estatal que não pode ser interpretado como uma atuação isolada e eventual”.

Nesse sentido, Kemp destaca que a situação precisa ser tratada em caráter de mediação em torno da demarcação das terras e da indenização de seus proprietários. “Esses conflitos só vão parar quando a questão da terra for resolvida. Não adianta ficar reprimindo, mas intermediar junto ao governo federal o processo de demarcação”.

Sejusp diz que cumpriu ‘dever legal'

Jornal Midiamax questionou o Governo do Estado e a (Secretaria de Estado de Segurança de Justiça e de Segurança Pública), por meio da assessoria de imprensa, a respeito das acusações dos cinco órgãos.

Em resposta, a Sejusp informou que agiu no “estrito cumprimento do dever legal, para a preservação da ordem pública e da vida, uma vez que no local uma vítima, indígena, foi agredida com golpes de facão e ameaçada de morte com arma de fogo pelos acusados, que além da Lesão Corporal Dolosa e Ameaça a esta pessoa, cometeram ainda os crimes de Dano, Associação Criminosa, Esbulho Possessório – se o Agente Usa de Violência e, Posse ou Porte Ilegal de Arma de Fogo de Uso Restrito, uma vez que foi apreendida no local uma pistola adaptada para calibre 22 por eles utilizada”.

A secretaria também informou que “todos os acusados reconhecidos pela vítima foram presos e autuados em delito pelos crimes acima mencionados, sendo a prisão convertida em preventiva pela Justiça Federal, o que comprova a legalidade e necessidade da ação policial”.

A respeito da perseguição denunciada pelos órgãos de proteção aos indígenas e ordem direta dada pelo secretário à tropa de elite da PM, a Sejusp não se manifestou.

A reportagem também tentou contato telefônico com Carlos Videira, mas as ligações não foram atendidas. As tentativas de contato foram devidamente registradas e o espaço segue aberto para manifestação.

Jornal Midiamax também entrou em contato com o Ministério dos Povos Indígenas, para detalhes sobre acompanhamento federal das ações em Mato Grosso do Sul, e aguarda retorno.

Acionado pela reportagem, o governo de Mato Grosso do Sul enviou nota da Sejusp, reiterando que agiu “no estrito cumprimento do dever legal”.

Equívocos jurídicos

No pedido de liberdade, os órgãos também detalham que o caso foi encaminhado à Justiça Federal em razão da federalização gerada pela área estar sob processo de demarcação como território indígena. No entanto, a DPU afirma que a liberdade dos indígenas poderia ter sido inicialmente analisada, em caráter liminar, pela Justiça Estadual.

“Nesse cenário, caberia ao Juízo Federal o imediato relaxamento do flagrante, até porque os indígenas estavam detidos desde o dia 8 de abril de 2023, sem que tenha lhes tivesse sido oportunizada a análise da (i)legalidade de suas prisões. Não obstante as razões suficientes para o relaxamento da prisão, a autoridade nominada coatora decretou a prisão preventiva”.

Além da DPU e da Funai, o pedido de libertação dos indígenas é assinado pela APIB (Articulação dos Povos Indígenas do Brasil), Observatório de Justiça Criminal e Povos Indígenas e também pela de Mato Grosso do Sul.

Despejos forçados

Em nota divulgada nesta quinta-feira (13), as entidades sustentam que “não há motivos concretos para a manutenção dos indígenas na prisão, uma vez que a prática dos delitos atribuídos a eles pela Polícia Militar ainda será objeto de questionamentos da DPU durante o inquérito policial, sendo frágeis os elementos colhidos até o presente momento sobre a participação deles em atos criminosos”.

A entidades também argumentam que o Poder Judiciário deve levar em consideração a gravidade das “ações violentas endereçadas à população indígena em Mato Grosso do Sul e os despejos forçados realizados pela Polícia Militar, condutas que já foram denunciadas ao Conselho Nacional e às Cortes Internacionais de Direitos Humanos”.

“[…] os indígenas reivindicam o território de Yvu Vera, há anos, sendo grave a tentativa de criminalização da comunidade que apenas protestava por seus direitos”, conclui a nota das cinco entidades que entraram com representação no Tribunal Regional Federal.

As acusações feitas no pedido de defesa dos indígenas reverberam na própria comunidade. Lideranças indígenas disseram ao Jornal Midiamax, nesta semana, que atuação da Sejusp teria sido feita em ordem direta à PM para intervir no caso.

O direcionamento da secretaria para tropa de elite da PM, o Batalhão de Choque, atuar na retirada dos indígenas, suspeitam lideranças, seria reflexo de pedido direto feito por interessados na construção.