A decisão do TRF3 (Tribunal Regional Federal da 3ª Região) para soltar os nove indígenas presos no início de abril durante protestos em ocupação de área em processo de demarcação em , distante 225 quilômetros de Campo Grande, não foi integralmente cumprida. Isso porque o ex-candidato ao Governo de Mato Grosso do Sul, Magno de Souza (PCO), continua preso, segundo lideranças indígenas da região.

O Jornal Midiamax apurou que apesar da decisão expedida pela Justiça Federal, na sexta-feira (28), determinar que Magno cumpra a medida cautelar para uso tornozeleira eletrônica, a Sejusp (Secretaria de Estado de Justiça e Segurança Pública), por meio da Agepen (Agência Estadual de Administração do Sistema Penitenciário), não instalou o equipamento de monitoramento no indígena.

A justificativa dada por servidores da PED (Penitenciária Estadual de Dourados) a lideranças indígenas é de que o item ainda não foi instalado porque há falta de tornozeleiras eletrônicas no Estado. O Jornal Midiamax noticiou, no início de abril, que a demanda pelo monitoramento eletrônico aumentou em Mato Grosso do Sul. A reportagem questionou a Sejusp a respeito do prazo para instalação do aparelho, e aguarda retorno.

Outro aspecto que pode dificultar a liberdade do ex-candidato ao Governo de Mato Grosso do Sul em 2022 é o fato da retomada onde Magno de Souza vive não ter abastecimento de elétrica. Em razão disso, o indígena não conseguiria recarregar o aparelho, obrigação de toda pessoa que usa o item.

Indígenas se alimentam com doações (Foto: Marcos Morandi, Jornal Midiamax)

A Defensoria Pública da União, que representa os indígenas, trabalha para que a medida cautelar imposta pela Justiça seja derrubada e já apresentou este argumento à Justiça Federal. Magno de Souza está preso há 24 dias.

Lideranças também confirmaram à reportagem que além de Magno de Souza, outro indígena que fazia parte do grupo de nove presos no dia 8 de abril continua detido. Conforme as lideranças, o indígena teria outro mandado de em aberto, o que impediu a soltura.

Polícia Militar voltou para área de retomada

A decisão para soltar os indígenas presos durante ação policial que contou com o Batalhão de Choque, a elite da Polícia Militar, saiu na sexta-feira, mas só foi cumprida no fim da tarde do sábado (29). Antes mesmo da soltura, lideranças relataram ameaças.

Viaturas da Polícia Militar voltaram para a área na manhã deste domingo, um dia após a saída dos 7 indígenas da prisão. Segundo os indígenas que vivem na área que está em processo de reconhecimento como terra tradicional, os policiais deixaram o local sem fazer qualquer tipo de intervenção.

Atualmente, a ocupação, que margeia terreno da construtora de imóveis de luxo, Corpal Incorporadora e Construtora, que teria acionado a PM para retirar os indígenas da área, é composta por 30 barracos e 40 famílias.

Sem energia elétrica ou fornecimento de água, o grupo furou um poço artesiano e vive das doações de indígenas das aldeias Bororó e Jaguapiru. Eles também recebem cestas básicas de indígenas que vivem em outras retomadas da área Yvu Vera, reivindicada por eles como tradicional e que está sob processo de demarcação.

“A gente tem se organizado aqui dentro da retomada para garantir a alimentação das famílias. Temos recebido a ajuda de algumas pessoas que moram do outro lado da rodovia e também dos nossos parentes da Jaguapiru e da Bororó, que fazem doações de cestas básicas. Mas também precisamos de remédios e agasalhos”, relata uma das indígenas que ajuda no preparo das refeições.

A reportagem do Jornal Midiamax foi até a retomada e apurou que até a manhã desta segunda-feira (1º), não havia qualquer movimentação no terreno onde a construtora ergueu um muro, mesmo com alerta do MPF (Ministério Público Federal) de que a construção estava no limite da área reivindicada.

Construtora ergueu muro em área (Foto: Marcos Morandi, Jornal Midiamax)

MPF alertou construtora sobre obra nos limites de área reivindicada

O documento enviado à construtora é assinado pelo procurador da República Marco Antonio Delfino de Almeida, em que dá prazo de dez dias, a partir do recebimento do documento por parte da empresa, para a construtora responder sobre a construção na área. Caso não apresente justificativa ou provoque o retardamento indevido das requisições, a incorporadora poderá ser implicada.

Lideranças já haviam alertado que a construtora havia sido avisada para não levantar o muro até que a Justiça resolvesse a situação, porém, a incorporadora que detém condomínios de luxo em Dourados ignorou e levantou o muro, apesar dos alertas.

Consta no documento do MPF, que a comunidade indígena estaria preocupada com a existência da obra do condomínio de luxo. Segundo consta, as obras teriam começado ainda em fevereiro, porém, em ritmo mais lento por conta das chuvas. Mas, em março, a construção teria ganhado celeridade. Então, no dia 6 de abril, iniciaram a ocupação da área.

Ainda, um indígena teria relatado às equipes do MPF que um funcionário da obra teria confirmado a construção de um muro em torno do perímetro do terreno e que seria contratado pela L R Serviços de Fundações, que estaria a serviço da Corpal.

Ocupação tem cerca de 30 barracos (Foto: Marcos Morandi, Jornal Midiamax)

Sejusp diz que cumpriu ‘dever legal'

Jornal Midiamax questionou o Governo do Estado e a Sejusp (Secretaria de Estado de Justiça e Segurança Pública), por meio da assessoria de imprensa, a respeito da ação na área de Dourados.

Em resposta, a Sejusp informou que agiu no “estrito cumprimento do dever legal, para a preservação da ordem pública e da vida, uma vez que no local uma vítima, indígena, foi agredida com golpes de facão e ameaçada de morte com arma de fogo pelos acusados, que além da Lesão Corporal Dolosa e Ameaça a esta pessoa, cometeram ainda os crimes de Dano, Associação Criminosa, Esbulho Possessório – se o Agente Usa de Violência e, Posse ou de Fogo de Uso Restrito, uma vez que foi apreendida no local uma pistola adaptada para calibre 22 por eles utilizada”.

A secretaria também informou que “todos os acusados reconhecidos pela vítima foram presos e autuados em flagrante delito pelos crimes acima mencionados, sendo a prisão convertida em preventiva pela Justiça Federal, o que comprova a legalidade e necessidade da ação policial”.

A reportagem também tentou contato telefônico com Carlos Videira, mas as ligações não foram atendidas. As tentativas de contato foram devidamente registradas e o espaço segue aberto para manifestação. O Jornal Midiamax entrou em contato com o Ministério dos Povos Indígenas, para detalhes sobre acompanhamento federal das ações em Mato Grosso do Sul, e aguarda retorno.