Justiça quebra sigilo de celular e Instagram de Marquinhos Trad em ação por assédio sexual

Determinação atende a pedido da Deam para que conversas no WhatsApp e Instagram do ex-prefeito sejam extraídas

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Marquinhos Trad após depoimento na Deam sobre casos de assédio – Foto: Nathalia Alcântara/Midiamax

Ex-prefeito de Campo Grande Marquinhos Trad (PSD), denunciado por crimes de importunação sexual, assédio e favorecimento à prostituição, terá que entregar o celular à polícia, após decisão judicial. Ele tem prazo de 5 dias para a entrega assim que for citado judicialmente, o que só deve ocorrer na volta do recesso do Judiciário, a partir de 9 de janeiro.

Conforme apurado pelo Jornal Midiamax, a juíza Eucélia Moreira Cassal, da 3ª Vara do Crime de Campo Grande, determinou no dia 16 de dezembro a entrega dos aparelhos celulares de Marquinhos Trad. O processo tramita em sigilo. Se a entrega não for feita após citação, o ex-prefeito pode ser alvo de mandado de busca e apreensão.

Assim, conforme a peça, a decisão judicial atende pedido da Deam (Delegacia Especializada de Atendimento à Mulher), que solicitou busca e apreensão de eletrônicos na residência de Trad, tais como celulares e notebooks.

Ainda foi feito pedido da quebra do sigilo de dados telefônicos e telemáticos da linha utilizada pelo ex-prefeito, assim como da conta oficial de Trad na rede social Instagram. A partir do aparelho, é possível identificar, além das conversas, as localizações do ex-prefeito.

Além disso, no pedido são solicitadas informações sobre a linha telefônica e o compartilhamento de provas entre três inquéritos policiais que investigam Marquinhos Trad.

O Jornal Midiamax tentou contato com o ex-prefeito por telefone, nesta segunda-feira (26), mas as ligações sequer completaram. As tentativas de contato foram devidamente registradas e o espaço segue aberto para manifestação do ex-prefeito.

Conversas em WhatsApp podem revelar ‘modus operandi’

Também conforme o pedido, uma das investigações – que têm como alvo Marquinhos Trad e o empreiteiro André Luiz dos Santos, mais conhecido como André Patrola – reuniu provas de que o investigado agiria, na maioria das vezes, mediante conversas com as vítimas via WhatsApp, bem como de sua rede social. O compartilhamento, portanto, poderia elucidar o caso.

A justificativa apontada no pedido também relata que Marquinhos Trad teria “estrita relação” com Victor Hugo Ribeiro Nogueira da Silva, investigado em um dos inquéritos que envolvem o ex-prefeito. Victor está preso preventivamente por coação e corrupção ativa de testemunha.

Ainda para a delegada, os atos de Victor Hugo poderiam guardar relação com o ex-prefeito, visto, ainda, que Victor Hugo chegou a exercer cargo em comissão na Prefeitura de Campo Grande, na época em que Marquinhos comandava o Executivo Municipal.

Prazo de 30 dias

A decisão judicial também defere o compartilhamento de provas dos inquéritos, conforme pedido da Deam. Conforme a peça, a magistrada também determina que, após vencidos o prazo para entrega dos dispositivos, seja efetuado cumprimento de mandado de busca e apreensão na residência de Trad.

Após obterem os dispositivos eletrônicos, as autoridades policiais terão prazo de 30 dias para extrair dados, tanto na rede WhatsApp como no Instagram do ex-prefeito.

Queixa-crime rejeitada

Em outra peça judicial que também corre na 3ª Vara Criminal de Campo Grande, a juíza Eucélia Moreira Cassal rejeitou queixa-crime proposta por Marquinhos Trad contra uma das vítimas ouvidas em investigação de assédio e abuso sexual, a quem o ex-prefeito acusa de ter cometido o crime de calúnia.

No pedido apresentado por Marquinhos, é afirmado que a mulher teria cometido denunciação caluniosa em seu depoimento, motivado após o Jornal Midiamax publicar trechos de investigação que implicavam o ex-candidato ao Governo de MS em supostos crimes sexuais.

Isso porque, para a defesa de Marquinhos, por mais que a denúncia tenha resultado em investigação, esta foi arquivada, o que caracterizaria a denunciação caluniosa. Apesar disso, outras 7 vítimas constam na denúncia contra o ex-prefeito.

No caso em questão, a vítima denunciou assédio sofrido em 2005. Por isso, o promotor do caso entendeu que houve prescrição do crime e arquivou, não sendo relatada comunicação falsa de crime na decisão.

Assim, a magistrada argumenta que denúncias desse tipo só podem ser ajuizadas pelo Ministério Público, conforme determina o artigo 24 do Código de Processo Penal, o que não teria sido feito.

“Por sua vez, não se pode cogitar do manejo da ação penal privada subsidiária da pública, posto que se admite apenas quando houver inércia do titular da ação penal pública, nos termos contidos no
artigo 29 do Código de Processo Penal e nada foi produzido pelo querelante a demonstrar a inércia do órgão acusador. Portanto, diante da ilegitimidade da parte ativa para propor a presente demanda, rejeito a queixa-crime, com fundamento nos artigos 24 e 395, inciso II, do Código de Processo Penal”, conclui a juíza, em documento também datado de 16 de dezembro de 2022.

Relatos de sete vítimas embasam denúncia contra ex-prefeito e empreiteiro

A denúncia foi feita pelo MPMS (Ministério Público de Mato Grosso do Sul) em 8 de novembro deste ano. Na peça, assinada pelo promotor Alexandre Pinto Capiberibe Saldanha da 15ª Promotoria de Justiça de Campo Grande, constam relatos de 7 mulheres que teriam sofrido algum tipo de abuso por parte de Marquinhos Trad.

A primeira vítima relatada na peça tinha cargo comissionado na Prefeitura. Em dezembro de 2018, teria sido assediada ao tentar pedir uma transferência ao então prefeito de Campo Grande.

Segundo a vítima, quando foi sair da sala Marquinhos tentou dar um beijo e ela se esquivou. Ela acabou exonerada da Prefeitura após sofrer assédio moral também por parte da chefe. Conversa de WhatsApp aponta que Marquinhos a chamava de “princesa” e assediava a servidora.

Já a segunda vítima, conforme o MPMS, fazia parte de uma associação de bairro e participou de reunião no gabinete de Marquinhos naquela época. Ele pediu que ela enviasse um ofício com as solicitações feitas pelo WhatsApp.

Após a reunião, eles tiraram uma foto e Marquinhos teria passado a mão no cabelo da vítima, pedindo que ela enviasse a foto para ele depois. A vítima não encaminhou a foto e, após repassar o documento solicitado pelo então prefeito, recebeu dele a mensagem “Quero te ter, quero você”.

A mensagem foi apagada em seguida. Tempos depois, em 23 de novembro de 2019, na inauguração do posto de saúde, Marquinhos disse para a vítima que ela não respondeu à mensagem, depois de a cumprimentar com um beijo na bochecha, “de forma melada, pegajosa e libidinosa”, aponta o MPMS.

A vítima acabou deixando a associação do bairro, desmotivada após perceber o interesse sexual do ex-prefeito enquanto tentava resolver as necessidades do bairro.

Terceira vítima que consta na denúncia

Em 2020, em 5 ocasiões na Prefeitura de Campo Grande, Marquinhos teria atraído a terceira vítima à prostituição ou outra forma de exploração sexual. Esta mulher teria recebido uma proposta de trabalho de uma amiga, que seria um cargo comissionado.

Ela teria que conversar pessoalmente com Marquinhos e foi marcado encontro no gabinete da Prefeitura. No dia, Marquinhos teria tentado beijar a vítima, que se recusou. Depois, ele teria passado a enviar mensagens dizendo que amava a vítima e que queria vê-la novamente.

A mulher passou a frequentar o gabinete, esperando que fosse contratada. Apesar disso, em todas as vezes, Marquinhos Trad teria investido, abordando assuntos de cunho sexual. A vítima acabou mantendo relações com o ex-prefeito no banheiro do gabinete, sendo nomeada para um cargo na Prefeitura em 2020.

A vítima teria ouvido de Marquinhos que só precisaria assinar a folha de ponto, sem precisar trabalhar presencialmente. Em agosto, ela foi apresentada a André Patrola, ocasião em que teria se sentido “vendida” ao empreiteiro. “Dá uma viradinha porque eu gosto de bunda”, disse o empresário para a vítima naquele dia, frase essa que consta no depoimento da vítima à Polícia Civil.

Em junho deste ano, a vítima voltou a procurar Marquinhos no comitê, enquanto candidato ao Governo de Mato Grosso do Sul. Nesta ocasião, ele novamente teria tentado beijar a vítima, que se recusou. O MPMS entende que, neste caso, o ex-prefeito se aproveitou da situação financeira da vítima, que precisava de um emprego para exploração sexual.

Quarta vítima de assédio

Conforme o MPMS, em 2020, esta quarta vítima, passando por problemas financeiros, foi apresentada ao ex-prefeito por uma amiga, alegando que ele poderia ajudá-la. No gabinete da Prefeitura, Marquinhos passou a dar investidas, chamando a vítima para ir até o banheiro.

A vítima relatou que foi agarrada pelo ex-prefeito, mas se negou a manter relação sexual e percebeu que o convite até o gabinete era apenas de cunho sexual.

Quinta vítima relatada na denúncia

A quinta mulher apontada como vítima de Marquinhos é amiga de uma outra vítima. Ela foi informada que o ex-prefeito queria conhecê-la porque tinha visto fotos no Instagram e pediu o contato do WhatsApp. Como ela estava desempregada e soube que podia ter ajuda para conseguir um emprego, acabou passando o número.

Marquinhos logo passou a trocar mensagens com a vítima e em setembro de 2020 ela foi até a Prefeitura. No gabinete, o então prefeito chegou a dizer que ajudaria financeiramente a vítima enquanto não surgisse uma vaga de emprego. Depois, ela foi levada ao banheiro, onde houve relação sexual.

Após o sexo, Marquinhos entregou R$ 700 para a vítima. Os encontros sexuais aconteceram quatro vezes, sendo que em todas a vítima recebia valores entre R$ 500 e R$ 1 mil. O MPMS também entende que a vítima, precisando de dinheiro, foi explorada sexualmente pelo então prefeito de Campo Grande.

Sexta vítima também teve encontros na Prefeitura

A sexta mulher citada pelo MPMS também se encontrou com Marquinhos na Prefeitura, em dezembro de 2021. Assim como as outras vítimas, ela foi em busca de uma vaga de emprego, mas acabou assediada pelo então prefeito.

Os dois mantiveram relação sexual no banheiro do gabinete e a vítima chegou a pedir que Marquinhos usasse preservativo, o que foi negado, quando ele pediu que ela “confiasse nele”. Foram quatro encontros sexuais entre a vítima e o prefeito, que sempre prometia conseguir um emprego para ela, o que nunca aconteceu.

Nos encontros, Marquinhos deu dinheiro em espécie para a vítima.

Assediou funcionária de hospital

Conforme o MPMS, em maio de 2022, servidora de um hospital em Campo Grande estava trabalhando, quando houve convocação para que os coordenadores fossem assistir à fala do então candidato ao Governo, Marquinhos Trad. A vítima foi até a sala, onde estavam outros funcionários.

Marquinhos chegou ao local com a equipe e foi falar diretamente com a vítima, dando um beijo no rosto e um abraço. A vítima aponta que ele manteve “olhar fixo e malicioso” para ela. Incomodada, ela saiu da sala, quando Marquinhos disse: “Não. Você não vai… Volta aqui! Nós vamos tirar uma foto juntos”.

Durante a foto, Marquinhos teria apertado as costas da vítima, passando as mãos até mesmo nas nádegas da mulher, que se esquivou. Depois, tentou ainda pegar o telefone da vítima, para que ela enviasse a foto e disse para ela o chamar, “pois tinha uma coisa boa para ela”.

Empreiteiro denunciado por favorecimento da prostituição

André Patrola aparece na denúncia do MPMS por ter aliciado três mulheres à prostituição ou outra forma de exploração sexual. O trecho da denúncia trata de ‘festinha’ já relatada pelo Jornal Midiamax, em que estavam ainda outras figuras públicas.

Na ocasião, Patrola chamou as vítimas para irem ao Aeroporto Santa Maria, de onde saíram para a festa em uma fazenda de Coxim, de avião. Com as vítimas estava um delegado da Polícia Civil, que também foi para a ‘festinha’.

Uma das mulheres relatou que foi coagida por Patrola, já que qualquer negativa a ele poderia resultar no desligamento das atividades junto à Prefeitura de Campo Grande, em cargo que conseguiu após manter relações com Marquinhos.

Na volta para Campo Grande, cada uma das mulheres recebeu R$ 1 mil, como uma forma de pagamento pelas relações sexuais que mantiveram na festa. O fato configura o crime de exploração sexual, pelo qual Patrola foi denunciado.

Sendo assim, Marquinhos responde por crimes de assédio sexual, importunação sexual e favorecimento da prostituição ou outra forma de exploração sexual. Patrola responde, por três vezes, por este último crime.

Foram apresentadas 16 testemunhas, que devem ser ouvidas no decorrer do processo.

Defesa de Marquinhos alegou armação política

Marquinhos Trad alegou, na época das denúncias, que tudo seria parte de uma ‘armação política’ para prejudicar a candidatura dele a governador de Mato Grosso do Sul após uma discussão por WhatsApp com o secretário de estado de Segurança, Carlos Videira.

Marquinhos Trad (PSD) admitiu que cometeu adultério com ao menos duas das denunciantes enquanto era prefeito de Campo Grande, mas nega os crimes sexuais. Já em 2018, uma denúncia envolvendo suposto assédio contra uma menor aprendiz da Prefeitura chegou ao conhecimento da polícia civil.

Na época, o caso acabou arquivado e a jovem, conforme apurou o Jornal Midiamax, ganhou um cargo sem concurso público no gabinete da Prefeitura de Campo Grande.

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