Polícia Militar do Ceará é reestruturada e adota linha dura

Soldados da Polícia Militar do Ceará usam viatura como “motel” e são expulsos. Vídeo flagra policiais espancando e depois liberando suspeitos . Adolescente é morto com tiro na nuca por PM novato. Para o comando militar, as condutas inadequadas e abordagens desastrosas são casos isolados. Para especialistas, reflexo de uma política de segurança pública equivocada. […]

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Soldados da Polícia Militar do Ceará usam viatura como “motel” e são expulsos. Vídeo flagra policiais espancando e depois liberando suspeitos . Adolescente é morto com tiro na nuca por PM novato. Para o comando militar, as condutas inadequadas e abordagens desastrosas são casos isolados. Para especialistas, reflexo de uma política de segurança pública equivocada. A despeito do debate, essas falhas, somadas ao crescimento da violência e a defasagem de homens no Estado, levaram o governo Cid Gomes (PSB) a iniciar uma reestruturação da corporação e a endurecer ao longo dos últimos anos uma polícia que se propõe comunitária.

A primeira grande mudança empreendida por Cid Gomes na Polícia Militar do Ceará aconteceu no início de 2011, na passagem do primeiro para o segundo governo. Na época, um civil deu lugar a um militar de linha dura no comando da Secretaria de Segurança Pública e Defesa Social do Ceará (SSPDS).

Entrou o coronel da PM Francisco Bezerra que, nas palavras do próprio governador, faz o tipo “pé-de-boi”. Na linguagem popular, um tipo de trabalhador que topa qualquer serviço e não economiza esforço para cumprir a tarefa. Em recente entrevista ao Jornal “O Povo”, o coronel Bezerra, como é conhecido, afirmou que sob sua tutela “os policiais estão mais atuantes” e “se sentem prestigiados e desempenham melhor a função”.

Saiu Roberto Monteiro, delegado federal por 26 anos, com passagens pela Interpol e Embaixada Brasileira na Argentina. Monteiro foi responsável pela concretização de uma das principais plataformas da primeira campanha de Cid, o chamado Ronda do Quarteirão. Implantado em 2007, a estratégia de policiamento de proximidade consiste em ter uma viatura para atender áreas de até três quilômetros quadrados.

Com equipes fixas, a ideia era que os policiais interagissem mais com a comunidade. Para facilitar esse contato, o governo resolveu criar uma identidade visual ao programa e deu fardamento especial, treinamento específico e aparelhamento diferenciado aos soldados do Ronda. Essa “nova polícia” passou então a dirigir luxuosas caminhonetes de cabine dupla modelo Hilux SW4 com ar-condicionado e câmbio automático, no valor estimado de R$ 150 mil cada.

Com a expansão dessa estratégia de policialmente para o interior do Estado, em abril de 2010 foi criado o Batalhão de Policiamento Comunitário (BPCom) – hoje formado por aproximadamente 3,9 mil policiais. Com comando próprio e regalias como gratificações extras, gerou-se a impressão de haver uma polícia dentro da polícia.

O ex-secretário Nacional de Segurança Pública, coronel da reserva da PM, José Vicente da Silva Filho, tido como um dos maiores especialistas da área no País, chegou a ser convidado por Cid Gomes para auxiliar na organização do Ronda do Quarteirão. Os dois se encontraram, mas o coronel recusou a proposta.

“Fui conversar com ele e falei que o projeto estava equivocado e não iria dar certo. Ele resolveu fazer uma polícia à moda a dele. Com uma Hilux, poderia comprar três boas viaturas. É um aparato marqueteiro”, contou ao iG . “O problema do Ronda é o tratamento diferenciado dado a um grupo que faz trabalho na polícia. O restante fica ressentido e olhando mal esse grupo de estranhos.”

Cid Gomes ignorou os conselhos do especialista e bancou o projeto, que mais tarde veio a servir de referência para outros Estados brasileiros. No início, a presença massiva das viaturas nas ruas levou à população cearense uma sensação de segurança. Com o passar do tempo, constatou-se que não houve diminuição da violência. A taxa de homicídios a cada 100.000 habitantes subiu 80% em dez anos. Em 2000, o índice no Ceará era de 16,5 mortes. Em 2010, chegou a 29,7. Os dados constam do Mapa da Violência 2012, do Instituto Sangari.

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