Pegar o carro para fazer corridas por aplicativo é a saída encontrada por quem fica sem emprego ou quem busca uma renda extra no fim do mês. Famosa, a empresa de aplicativo mais benéfica entre motoristas e clientes, no entanto, há tempos a Uber, empresa consolidada neste setor, é alvo de críticas por suas políticas de encerramento de contrato. Não é à toa que a prestadora de serviço é alvo de ao menos seis novos processos que correm nas Varas de Justiça de Campo Grande neste ano e resultam em cobrança de danos que somam mais de R$ 160 mil.

O que leva os motoristas à Justiça é sempre a mesma situação: o encerramento unilateral das atividades por parte da , o banimento dos motoristas.

A situação mais recente que chegou até a Justiça de foi a de um motorista que, após cinco anos de trabalho e mais de 10 mil viagens na plataforma, alega ter sido bloqueado do aplicativo para fazer novas corridas por motivos que não foram bem explicados pela Uber no dia 20 de junho de 2023. A defesa afirmou que a renda mensal do motorista era de R$ 2.500, valor significativo para sua subsistência.

Nos autos, o homem conta que tentou contestar a decisão da empresa e entender direito o motivo da sua suspensão, mas a Uber não apresentou provas. Além disso, contesta que comprou um carro financiado em 48 parcelas de mais de mil reais apenas para trabalhar, por isso não possui condições financeiras para arcar com as dívidas.

Dentre as suas solicitações, o motorista pediu a condenação da Uber para desbloquear o seu perfil e ser reativo no aplicativo, além do pagamento de R$ 30 mil pelas perdas, R$ 1.950 de danos materiais e danos morais de no mínimo R$ 20 mil. Até o momento, a empresa não se manifestou nos autos e não houve nenhuma condenação.

Desespero para quem está desempregado

Situação parecida aconteceu com outro motorista de aplicativo de que foi banido da plataforma em abril deste ano por uma “denúncia de suposta discriminação e racismo”. Ele alega ser desempregado e sua única fonte de renda era o aplicativo. Além disso, contesta a falta de provas e disponibilidade da empresa em tentar conciliação de forma extrajudicial, não oferecendo informações concretas das denúncias que justificariam a suspensão.

“O requerente em nenhum momento teve a oportunidade de se defender, sendo acusado de forma genérica de um grave crime, a requerida não forneceu nenhuma informação (data e hora, local de partida e desembarque, se houve cancelamento ou não da corrida se houve troca de mensagens no app ou quem foi o solicitante da corrida) ou prova do ocorrido, como poderia o requerente se defender de algo (que não ocorreu) sem nenhuma informação ou prova? Mesmo assim o requerente buscou a requerida por diversas vezes tentando solucionar o problema, e o mais importante provar sua inocência, visto que está sendo acusado de algo grave, no entanto sem sucesso”, diz a defesa.

Dessa forma, o advogado do motorista pediu a concessão de tutela provisória de urgência para que a Uber reativasse o perfil do homem sob pena de diária, além de danos morais de R$ 7 mil, mais R$ 2.466,85 de lucros cessantes a partir da data de suspensão da plataforma.

O mesmo foi apontado por outro motorista, que também estava desempregado e recorreu à Uber para tirar o seu sustento até que, em novembro de 2020, foi desligado.

“O autor recebeu uma notificação de suspensão do aplicativo, sem justificava do motivo do desligamento. No mesmo instante, tratou de diligenciar para averiguação, junto à requerida, que não deu maiores explicações”.

Na época, o homem ganhava uma média de R$ 4.200 com a plataforma, o que impactou no seu orçamento o desligamento repentino. Por isso, pediu R$ 10 mil de danos morais e R$ 8.400 de lucros cessantes.

Sem retorno ou resposta da Uber

Além do desligamento repentino, a Uber também é criticada por não oferecer um suporte adequado nessas situações, denunciada também por não dar explicações mais detalhadas sobre os bloqueios e de não responder às solicitações. Tais situações também levaram a empresa a ser processada na Justiça de Mato Grosso do Sul por um dos motoristas pioneiros da Capital, que se cadastrou na plataforma em 2017, mesma época em que a Uber chegou à região.

“O mesmo tinha perdido o trabalho ao qual possuía e vendo a necessidade de subsistência como a oportunidade de ser motorista de aplicativo, realizou o cadastro junto a plataforma e começou a trabalhar”.

Assim, o problema começou em 2019, quando a Uber suspendeu o cadastro do motorista “sem nenhum aviso ou oportunidade de se manifestar ou se defender foi excluído da plataforma. Diante a situação ficou desesperado, e como não sabia do seu direito, tentou diversas vezes retornar, ao qual foi negado, pediu informações a empresa requerida e também não foi atendido”.

Depois de um tempo, o homem tentou novamente retornar à plataforma e não conseguiu, por isso decidiu entrar na Justiça pedindo a reativação do seu perfil e R$ 30 mil de danos morais.

(Arquivo, Jornal Midiamax)

Bloqueio por conta digital que “deu errado”

Outro caso que também corre na Justiça Estadual é de um motorista que alega ter sido suspenso do aplicativo depois que se cadastrou na conta digital oferecida pela Uber e procedimento não deu certo. Dessa vez, no entanto, a empresa contestou as alegações e afirmou que o bloqueio foi apenas temporário.

Segundo o autor da ação, ele era motorista da plataforma por mais de 4 anos e realizou 11 mil viagens, por isso era bem avaliado no aplicativo com uma nota de 4,97 estrelas. Ele usava a conta bancária da esposa até que, em 2021, a empresa disponibilizou uma conta digital para fazer os pagamentos das corridas. Em fevereiro de 2022, ele sofreu um bloqueio na sua conta digital e, em seguida, foi suspenso do aplicativo também. 

“Ao procurar o suporte da Uber do Brasil, no mês de janeiro de 2023, foi informado pelos funcionários da agência da Uber que não sabiam o motivo, mas que sua conta estava bloqueada por um suposto comportamento fraudulento ou ilegítimo. A empresa não especificou qual eram essas atividades irregulares e o comportamento fraudulento e tão pouco deu direito de defesa ao requerente”.

Diante disso, o homem pediu indenização por danos morais de R$ 10 mil e que a Uber também fosse condenada a pagar R$ 39.682,77 por danos materiais.

Uber defendeu que bloqueio foi temporário

Por outro lado, a Uber chegou a se manifestar nessa ação e contestou toda a petição do motorista. Além disso, contou que o perfil dele já tinha sido reativado depois que ele conversou com a equipe de suporte “estando ativa e apta para uso, o que configura inequívoca ausência de interesse processual, merecendo ser extinta a ação sem resolução do mérito”.

A empresa ainda defendeu que o bloqueio dos motoristas não é uma ação ilícita e que teve motivos para suspender o homem por questões de segurança.

“Houve justo motivo para a Uber bloquear temporariamente o autor na plataforma, e após o término dos procedimentos de segurança, o seu acesso foi liberado, não restando evidenciado nenhum tipo de prejuízo pela impossibilidade de utilização da plataforma temporariamente”.

Porém, a defesa do motorista contestou as informações da empresa e disse que o desbloqueio da conta ocorreu somente na tarde de um único dia, horas antes da Uber protocolar sua manifestação no dia 2 de maio de 2023. Caso ainda segue sem a sentença da vara responsável.

Surpresa e decepção

Não muito diferente dos outros casos citados acima, outro motorista também recorreu à justiça para tentar voltar a trabalhar com a Uber depois que a empresa suspendeu o seu perfil no dia 16 de junho de 2023. Nos autos do processo, a defesa alega que o homem sempre prestou um bom serviço, porém, que tinha sido bloqueado “sob alegação de que a empresa identificou apontamentos criminais”.

O autor da ação tentou buscar a Uber para resolver o bloqueio, mas pedido foi negado. Diante disso, o advogado pediu a concessão antecipada de tutela para a empresa liberar o acesso para que o homem voltasse a trabalhar. Também pediu o pagamento de R$ 10 mil por danos morais.

Situações como essas envolvendo reclamações contra a Uber não são distintas somente aos casos que entraram na Justiça em 2023. Basta pesquisar a razão social da empresa para ver que ela é alvo de inúmeros processos pelo mesmo motivo desde que aplicativo chegou a Campo Grande. Diante disso, o Jornal Midiamax também conversou com a empresa.

O que diz a Uber?

Por meio de nota, a Uber informou que todas as desativações de contas estão fundamentadas nas políticas e diretrizes da plataforma, como o Código da Comunidade Uber, que foi criado para que a experiência com o aplicativo “seja sempre positiva, segura e respeitosa tanto para motoristas parceiros quanto para usuários”.

Além disso, reforça que tem processos rigorosos no suporte, feito por humanos, que analisam o teor dos reportes enviados pelo aplicativo antes de tomar medidas nas contas envolvidas. “A menos que haja uma emergência, ameaça à segurança ou outra situação de risco, enviamos diversos comunicados ao motorista parceiro antes de desativar sua conta permanentemente”.

A Uber também informa que as “desativações ocorrem na minoria das situações envolvendo motoristas parceiros, e existem procedimentos específicos para solicitar uma revisão da desativação caso o parceiro entenda que houve alguma decisão equivocada”. Mais detalhes sobre os procedimentos estão disponíveis no site da Uber.

Uber não é obrigada a manter contrato com motorista

Essa é a decisão do TJDFT (Tribunal de Justiça do Distrito Federal e dos Territórios). No mês anterior, a 3ª Turma Cível do TJDFT, por unanimidade, manteve decisão que julgou improcedentes os pedidos de um motorista do aplicativo Uber, excluído da plataforma em razão de descumprimento das regras do Código de Conduta da empresa.

De acordo com os autos, em agosto de 2016, o autor se cadastrou no aplicativo de transporte. Após quase cinco anos de parceria, o motorista foi bloqueado do aplicativo, sob a justificativa de não ser tolerado o uso de linguagem e gestos inapropriados e de imagens de natureza sexual.

O motorista argumentou que a empresa não oportunizou a possibilidade de demonstrar que não praticou o assédio sexual relatado por usuária do serviço. Sustentou também que sua exclusão foi desproporcional, especialmente, por causa do seu histórico durante os cinco anos em que usou o aplicativo.

Na decisão, os Desembargadores explicaram que os documentos apresentados foram suficientes para formar a convicção do Juiz e que a produção de provas solicitada pelo autor não seria apta a mudar o entendimento do magistrado. Mencionaram que o motorista, ao se cadastrar na plataforma, aderiu aos Termos e Condições Gerais dos Serviços, que preveem que a empresa pode desativar a conta do motorista em caso de descumprimento da política da empresa.

Diante disso, o colegiado explicou que, com base na autonomia da vontade e da liberdade contratual, a empresa tem direito de não manter relações contratuais com pessoas que descumprem as regras previamente estabelecidas. Além disso, ressaltou que ficou evidente que o comportamento do motorista vai de encontro à política da empresa, considerando as avaliações negativas da conduta do autor na prestação de serviços.