Nas dependências do Detran-MS (Departamento Estadual de Trânsito), uma fila com centenas de veículos e cerca de três horas de espera gera insatisfação, na manhã desta quinta-feira (27), em quem depende do órgão para realizar o serviço de . Basicamente, o procedimento é necessário para qualquer outro serviço envolvendo documentação de veículos, como transferências, registros, lacres e emplacamentos.

Muito embora o órgão tenha designado mais servidores para efetuar o serviço (o número aumentou de 12 para 18) e tenha estendido o horário de atendimento para das 7h30 às 16h30, o congestionamento no pátio do órgão gera reclamações e indignação, sobretudo de quem fatura com o serviço.

Como da despachante Nilda Lima, de 40 anos, que chegou às 9h para ser atendida e às 11h ainda estava na fila. “Perco a manhã toda aqui. Peguei o carro desse cliente cedinho e infelizmente não vou poder entregar no mesmo horário que a gente costumava entregar. Semana passada eu conseguia fazer de 3 a 4 vistorias numa manhã. Praticamente já perdi o dia aqui”, protesta.

Segundo ela, despachantes já se ajudam como podem. Enquanto um move os carros na fila, outros resolvem atividades burocráticas em outros blocos. “Aqui não é informatizado como nas credenciadas, então, saindo da vistoria a gente que que registrar em outro bloco. Nas credenciadas era mais automático. O tempo rendia mais”, aponta.

Também no ramo de despachante, Valdecir Garcia, de 56 anos, acredita que o problema na lentidão mora no despreparo do Detran-MS. “Não veria problema em ser tudo aqui se tivesse estrutura. Se fosse informatizado, se tivesse mais servidores e se atendesse o dia todo. Muita gente já fazis vistoria aqui, o problema maior é esse congestionamento por conta da suspensão das credenciadas”, explica.

O gerente comercial Julio Cesar Caetano Juniro, de 28 anos, foi um dos primeiros a chegar. Ele precisa da vistoria para poder fazer a transferência do veículo. Mas, às 7h30, já havia ao menos 30 carros à sua frente. O atendimento foi ocorrer por volta das 10h15 desta manhã.

VÍDEO: Espera de 3 horas e fila quilométrica marca mais um dia de vistorias no Detran-MS
Valdecir Garcia defende que Detran-MS invista no serviço (Foto: Guilherme Cavalcante | Midiamax)

“Fui pego de surpresa, não sabia que teria essa fila. Na terça fui numa credenciada na Rua Rui Barbosa, dai que fiquei sabendo que tinha essa liminar. Perdi toda a manhã, já, parado aqui na fila”, comenta.

O motorista Itacir Cavagnolli, de 70 anos, também reclamou da demora da vistoria, necessária para o emplacamento do veículo recém-adquirido. “Muito tempo de espera, coisa de duas horas. Vim sem despachante para baratear, não sabia que ia ser tão sofrido assim”, brinca.

Confira a fila do Detran-MS nesta quinta-feira (27):

Providências

O Detran-MS recorreu da liminar na tarde da quarta-feira (26), alegando que a suspensão pode gerar grave lesão à ordem pública, já que o próprio órgão não tem condições, atualmente, de absorver toda a demanda de vistorias na Capital.

A peça alega, ainda, que, que a decisão seria equivocada, já que o juiz David de Oliveira Gomes Filho, da 2ª Vara dos Direitos Difusos, Coletivos e Individuais Homogêneos não teria ouvido nem as empresas nem o próprio Detran-MS, para conceder o pedido do promotor Marcos Alex Vera de Oliveira.

Todavia, enquanto aguarda a análise, o órgão ampliou horário de atendimento e destinou mais servidores para dar mais agilidade ao serviço. O diretor-presidente do órgão declarou, ainda, que o processo de modernização das vistorias, atualmente já exigido das credenciadas, também deverá ser adotado no pátio do Detran-MS, tão logo o processo licitatório seja concluído. Um prazo não foi precisado pelo gestor.

O presidente do Sindetran-MS (Sindicato dos Servidores do Departamento Estadual de Trânsito), Octacílio Takai, defende que, por ser um serviço essencial, a vistoria deveria ser executada por um agente público, principalmente pelas possibilidades de fraudes já flagradas em vistorias. A Ação Civil Pública movida pelo MP-MS (Ministério Público Estadual de MS) teria sido motivado por escândalo de fraude em uma vistoriadora, descrito pelo Jornal Midiamax.

“Não existe serviço gratuito no Detran, tudo é pago. Então, os cidadãos que dependem do órgão podem e devem cobrar um serviço de excelência. Até hoje não entendemos, por exemplo, porque não fizeram concurso para vistoriadores quando foi anunciado, em 2013, que poderia haver credenciadas. É preciso haver investimento em pessoal e na tecnologia. O Governo do Estado precisa convocar mais servidores”, destaca Takai.

VÍDEO: Espera de 3 horas e fila quilométrica marca mais um dia de vistorias no Detran-MS
Primeiro dia de superlotação no pátio do Detran-MS, na quarta-feira (Foto: Marcos Ermínio | Midiamax)

Credibilidade “em xeque”

Envolto em escândalos desde as fraudes envolvendo credenciadas, o Detran-MS também precisa gerir crise acerca da própria credibilidade – sobretudo após o corregedor de Trânsito do Detran-MS, Fernando Villa de Paula, que também é delegado da Polícia Civil, ter sido flagrado em vídeo classificando flagrantes de fraudes como ‘montagens para foder as empresas'.

O corregedor teria, legalmente, obrigação de garantir a fiscalização no trabalho de vistoria e inspeção veicular. A atuação correicional no Detran-MS foi colocada sob suspeição depois do flagrante do delegado.

Além disso, na quarta-feira (26), após todo o escândalo, o órgão publicou, com erro, portaria com punição para a Focar, uma das empresas flagradas pela reportagem do Jornal Midiamax fraudando a vistoria. Anteriormente, o Corregedor de Trânsito tinha informado que a punição estava barrada porque a empresa teria ‘recorrido à Sejusp (Secretaria de Estado de Justiça e Segurança Pública)'. A portaria foi corregida posteriormente.

Entenda o caso

O Detran-MS foi proibido pela Justiça desde sexta-feira (21) de entregar para empresas credenciadas a execução de serviços como vistoria veicular, registro, emplacamento, lacre e licenciamento de veículos. Com isso, o Detran-MS tornou-se o único local para realizar o serviço.

A decisão atende pedido do MP-MS (Ministério Público de Mato Grosso do Sul) após novos flagrantes levados ao público pelo Jornal Midiamax colocarem sob suspeita a eficiência das credenciadas e o trabalho de fiscalização da Corregedoria de Trânsito no órgão.

De acordo o promotor Marcos Alex Vera de Oliveira, autor da ação, o órgão estadual fere competência federal ao credenciar empresas para o serviço. No Estado, cerca de 40 empresas realizam vistorias. As empresas vistoriadoras, no entanto, destacam que o credenciamento é amparado na Resolução 466, publicada pelo Contran (Conselho Nacional de Trânsito) em dezembro de 2013.

A Ação Civil Pública citou reportagem veiculada pelo Midiamax como prova do ‘perigo de dano' que manter a atuação das vistoriadoras credenciadas, mesmo após inúmeras denúncias, representa para a população. A reportagem flagrou, em vídeo, um veículo com motor fundido e sem bateria sendo aprovado pela empresa Focar, mesmo tendo chegado à vistoriadora na carroceria de um guincho

Na terça-feira (25) os pátios das credenciadas já estavam vazios e portões de algumas permaneceram fechados. Uma das vistoriadas estampou uma faixa informando os clientes de que o serviço está suspenso temporariamente.