117 mil alunos saem prejudicados em meio ao escândalo das terceirizadas
São crianças e adolescentes de escolas e Ceinfs
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São crianças e adolescentes de escolas e Ceinfs
Um dos maiores impasses da administração municipal de Campo Grande em 2016 apareceu no final do ano e no final do mandato de Alcides Bernal (PP): o escândalo das terceirizadas que fornecem trabalhadores para a Prefeitura – em especial aos Ceinfs (Centros de educação infantil) – Seleta Sociedade Criativa e Humanitária e Omep (Organização Mundial pela Educação Pré-Escolar). Alvos de investigação do Gaeco (Grupo de Atuação Especial de Combate ao Crime Organizado), as organizações passam por raio-x que pode desvendar uma espécie de máfia nos contratos, envolvendo crimes de improbidade administrativa,falsidade ideológica, peculato, lavagem de capitais e associação criminosa. Os crimes podem respingar em diversos nomes da classe política sul-mato-grossense (acusados de ‘apontar’ funcionários para trabalharem nas organizações, inclusive fantasmas) já que as entidades remontam a quase 20 anos de contrato junto à administração da Capital.
Em meio ao escândalo, no entanto, estão crianças, adolescentes e trabalhadores em situação de vulnerabilidade. São cerca de 117 mil alunos da Reme (Rede municipal de educação) – quase 100 mil das escolas e cerca de 17 mil dos Ceinfs – que dependem dos estabelecimentos de ensino. Os trabalhadores? 4,3 mil no olho da rua, após decisão judicial. Os funcionários não tiveram um ano fácil: 2016 foi marcado pelas paralisações dos funcionários que não recebiam os salários e cerca de duas semanas antes de perderem os empregos estavam com o 13º salário atrasado.
Os alunos? 2016 também revelou a fragilidade da fiscalização da Prefeitura, já que apareceram diversos casos de abusos contra as crianças nos Ceinfs, além de denúncias sobre a situação das unidades, muitas vezes sem fornecer alimentação adequada. A Capital, em meio a tudo isso, ainda tem ‘elefantes brancos’ de Ceinfs que aguardam para serem finalizados, muitos deles integram obras do PAC (Programa de Aceleração do Crescimento), do governo federal.
Agora, as crianças ganharam “férias antecipadas”. A Prefeitura divulgou no fim da tarde desta sexta-feira (16) que vai antecipar as férias escolares dos alunos, além de encerrar o atendimento em outros cinco centros municipais. O motivo, de acordo com nota divulgada pelo Município, é a decisão da Justiça que extinguiu os convênios com as terceirizadas.
Os trabalhadores foram à Praça Ary Coelho no sábado (17) para protestar. Levaram cartazes com palavras de ordem e gritavam que “não são fantasmas”. O que contaram é a sensação incerteza profissional: entidades e Prefeitura não se pronunciaram oficialmente. Alegam que o que sabem da própria situação vem apenas da imprensa e sabem apenas que, até agora, não terão emprego e não poderão entrar nos locais de trabalho nem mesmo para pegar seus pertences. A rescisão? também não sabem como vai ser. Não há explicação de como será o pagamento do 13º salário e a remuneração referente ao mês de dezembro.
Novelo de irregularidades
O novelo de irregularidades desfiado pelo Gaeco deu indícios já no começo do ano, com a queda de braço entre a Prefeitura e o MPE-MS (Ministério Público Estadual). Em abril o MP pediu multa de R$ 102 milhões por dia ao município “enquanto não demitir imediatamente os mais de 4,3 mil servidores terceirizados contratados via Seleta e OMEP”. Isso porque o MPE já havia apontado uma série de irregularidades nas contratações, e desde 2011, ainda na gestão de Nelsinho Trad (PTB), vinha propondo mudanças nas contratações por meio da celebração de TAC´s (Termos de Ajustamento de Conduta).
O MP propôs um aditivo ao TAC em março de 2014, dando 20 meses para que a prefeitura rescindisse todos os convênios e contratos firmados para contratação de pessoal terceirizado para desenvolverem atividades destinadas à servidores efetivos. Novas contratações, segundo o MP, só por concurso público. O promotor responsável pelo caso, Fernando Zaupa, alegou, à época, que Alcides Bernal demonstrava ‘não está a realmente querer alterar uma situação indevida, irregular e ilegal’.
Operação Urutau – A operação foi deflagrada na manhã de terça-feira (13), com objetivo de cumprir 14 mandados de busca e apreensão de documentos, três prisões temporárias e sete conduções coercitivas com os dirigentes, prestadores de serviços e funcionários da entidade. Até a Câmara Municipal foi alvo de buscas e apreensões. Na mira principal do Gaeco estão os funcionários fantasmas – já confirmados na investigação -, que batizaram o nome: Urutau é uma ave, conhecida como “ave fantasma”. Na manhã de quarta-feira (14), Bernal entregou pessoalmente ao Grupo uma série de documentos com a relação de funcionários das Seleta e Omep.
A Justiça determinou na quinta-feira (15) a extinção dos convênios. Maria Aparecida Salmaze, diretora da Omep, teve seu mandado de prisão expedido na terça-feira. A responsável pela creche Nossa Senhora do Perpétuo do Socorro, Kelly Ribeiro, e a contadora da Seleta, Ana Cláudia Pereira da Silva também foram presas, e levadas ao Estabelecimento Penal Feminino Irmã Zorzi, na Capital – as prisões são temporárias -. Na sexta, no entanto, Maria Aparecida Salmaze e Kelly foram soltas.
Em um vídeo publicado no seu perfil no Facebook, o prefeito afirmou que na segunda-feira (19), a Procuradoria Geral do Município vai entrar com recurso da sentença que rompeu o contrato. Quatro dias antes de estourar a Operação Urutau em Campo Grande, a defesa da Omep (Organização Mundial Para Educação Pré-Escolar) pediu bloqueio de R$ 3,8 milhões por parte da Prefeitura. De acordo com ação ajuizada pela entidade em maio deste ano, o Executivo vem desde então retendo cota patronal que, acumulada, está neste total.
O futuro presidente da Seleta, Romário Garcia Pereira, disse em depoimento do Gaeco “que tinha conhecimento sobre irregularidades na instituição”. Já no pedido de liberdade de Kelly Ribeiro, o desembargador Amaury da Silva Kuklinski aponta que a prisão foi decretada com base em apuração sobre esquema para desviar dinheiro público. Ele cita áudio usado na investigação, no qual a pedagoga narra que “está cansada de ser ‘laranja’ para enriquecer outras pessoas. Além de constar que é contactada para remeter papéis timbrados da instituição creche N. Sra. Perpétuo Socorro, a fim de justificar despesas da Seleta, confirmando os indícios de que a creche, de que a paciente é diretora, serviria para ‘esquentar’ o desvio de valores”, diz a decisão.
Câmara Municipal – Após haver busca e apreensão de documentos em seu gabinete na terça, a vereadora Magali Picarelli (PSDB) disse “apoiar as investigações”. A tucana declarou que “teve duas servidoras cedidas pela Seleta”, mas negou as funcionárias eram ‘fantasmas’, como investiga a Operação Urutau. “Acho muito importante essas investigações que o Gaeco vêm realizando, por isso me coloco à disposição da justiça para responder a todos os questionamentos”, disse, ressaltando em seguida que as funcionárias efetivamente prestaram serviços para ela.
Tribunal de Contas – O servidor comissionado do TCE-MS (Tribunal de Contas do Estado, Élcio Paes da Silva, também é investigado e foi conduzido coercitivamente para o Gaeco. De acordo com processo que consta a apuração, além de ser nomeado na Corte desde 2013, também tinha vinculo empregatício com a Itel Informática. Élcio também teve ligação telefônica interceptada na qual questiona notas fiscais elaboradas para comprar suposto serviço. “Também chega a assumir que não cumpria jornada de trabalho na Seleta e que não aceitaria cumprir”, afirmam os autos.
O investigado cita, durante ligação, que a diretoria da Seleta tem intenção de comprar um novo sistema de informática para gerenciar as rotinas administrativas e contábeis da referida entidade e, diante desse fato, recorre a uma ex-funcionária da Omep (Organização Mundial Para Educação Pré-Escolar) que tem experiência com este tipo de sistema.
O que diz o novo prefeito
Marquinhos Trad (PSD) recém eleito para administrar Campo Grande entre 2017 e 2020, afirmou, em sua diplomação que “aguarda os desfechos da operação urutau”. Marquinhos explicou que sua ideia é “buscar orientações no MPE e na Justiça para, depois pegar um caminho legítimo”. Ele disse não saber detalhes sobre os contratos com as Ongs.
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