‘Boom’ de usuários de drogas gera medo e onda de furtos na região sudeste de Campo Grande
Entre crimes de estelionato e violência doméstica, os furtos feitos por usuários de drogas são principal reclamação de moradores
Mirian Machado –
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Quando falamos na região do Bandeira, que fica no sul e sudeste de Campo Grande, um dos maiores entre os 11 bairros que a compõem, o Moreninhas é também um dos mais antigos e mais populosos. Conforme o censo do IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística), só no bairro, há mais de 30 mil habitantes. E é nele que se concentram a delegacia de Polícia Civil (4º DP), que atende toda a região do Bandeira, Quartel do Corpo de Bombeiros, unidade da Guarda Civil Metropolitana e a 6ª Companhia Independente da Polícia Militar, além de escolas, unidades de saúde e uma vasta quantidade de comércios espalhados pelo bairro.
Entre os principais bairros da região do Bandeira estão Moreninha, Vilas Boas, Tiradentes, Maria Aparecida Pedrossian, Rita Vieira, TV Morena, Universitário, São Lourenço, Jardim Paulista, Dr. Albuquerque e Carlota.
O Jornal Midiamax publica nesta semana uma série de reportagens sobre a segurança pública nas 7 regiões urbanas de Campo Grande. Nesta quarta-feira (8), você confere os detalhes da região do Bandeira.
Quando o assunto é segurança pública, o crime mais registrado na região, segundo a PM, é aquele que a população “não mete a colher”, ou seja, violência doméstica, seja envolvendo agressão ou ameaça. Entre os relatos dos moradores, a principal queixa é de usuários de drogas e de furtos, que segue em segundo lugar na lista de ocorrências atendidas pela Polícia Militar.
Já na delegacia onde os casos são registrados, além do “boom” de furtos de fios de cobre, o caso de estelionato também chamou atenção, e tem feito todo tipo de vítima, de jovem a idosos, dos leigos aos mais instruídos.
O que mais incomoda a população
Porém, ouvindo diretamente a população, a maior reclamação são os pequenos furtos, a maioria realizada por usuários de drogas para manter o vício.
“Quando me mudei era mais perigoso. A bandidagem foi indo embora. Uns moleques casaram, outros mudaram. Mas eu fico aqui trancada também, o jeito é não mexer com eles. O que tem muito aqui é usuário de drogas. A gente fica triste porque são crianças, a gente viu crescer”, lamenta a idosa de 63 anos que mora em uma rua considerada bastante tranquila no Bairro Moreninha, distante do local onde “ferve” de comércio e fluxo de pessoas.
Mesmo assim, ela, que mora há 40 anos ali, acredita que os problemas do bairro acontecem mais nos bares, onde as pessoas bebem e iniciam brigas. “É só não arriscar. Deus me protege”, concluiu.
Que o bairro era mais perigoso antigamente, é também a opinião da idosa Mônica Fernandes, de 80 anos e do filho, Carlos Fernandes, de 52 anos. A idosa chegou a mostrar o que tem de lembrança dessa época: as marcas de tiros no muro e parede de casa. E ninguém da casa era alvo.
‘Boom’ de usuários de drogas
Buscando na memória, Mônica contou que estava dentro de casa e nem saiu para ver o que acontecia, mas lembra que uma vizinha na época, que estava na calçada, foi atingida. “Graças a Deus isso parou. O que tem muito agora são usuários de drogas, inclusive crianças”, reclama.
A reclamação se refere à praça localizada bem em frente a sua residência. O local que era para ser de lazer, para crianças, jovens e adultos, além de abandonado e depredado, serve como ponto para usuários de drogas.
Carlos, filho da Mônica, lembra que bem ali nos fundos da praça, onde há um imóvel, era a delegacia. “Era ótimo, não tinha nada disso [usuários de drogas] e a gente se sentia mais seguro. Na minha casa tem tudo, cerca elétrica e ainda levaram tudo as coisas. As pessoas não vêm na praça por medo”, relata, afirmando que uma solução seria colocar uma base da Guarda Civil ali.
“Lá para cima tem delegacia, bombeiro, guarda, fica tudo junto em um só lugar”, reclama.
Medo no Universitário
Em outro bairro da região, no Universitário, furto também protagoniza o medo de quem vive ali. O comerciante Leandro Exteca dos Santos, de 30 anos, tem há 10 uma bicicletaria. Hoje com alarme, câmeras. Apesar de felizmente nunca ter sido alvo de bandidos, ele tenta se proteger como pode. “Pode não inibir, mas ajuda. O alarme, por exemplo, é ligado a um aplicativo no meu celular, então qualquer coisa toca no celular”, explicou.
Ao lado dele, o bar da idosa Aparecida Maria Eduarda Dias, de 70 anos, não teve a mesma sorte. Segundo ela, em dois anos, o bar foi alvo três vezes de bandidos. “Eles pegam tudo e qualquer coisa para trocar por droga. Na última vez eu estava em uma chácara, eles entraram, levaram dinheiro, televisão, sorvete e bebidas”, detalhou.
A idosa, que mora em outro bairro, tem o bar ali há 17 anos. Para não ser mais vítima, ela precisou reforçar a segurança na fachada e telhado, que foi por onde os criminosos entraram pela última vez. Em todos os casos, Aparecida diz não ter registrado ocorrência. “Eles passam aqui na frente, mas não adianta. Eu ligo, eles não vêm. Então, não procurei mais a polícia”, reclamou.
Cuidando sozinha do bar, onde 90% dos frequentadores são homens, ela diz que até se sente segura. “Se alguém quiser brigar eu já ‘toco’ daqui, não deixo não. Tento conversar e se brigar, não atendo mais”, contou, afirmando ainda que tem dado certo.
Fama de perigoso
Já o relato de Allifer Souza Valdez, de 25 anos, que estava na bicicletaria, fez com que a reportagem também visitasse o bairro Jardim Itamaracá. Ele tem um depósito de materiais para construção que foi alvo de ladrões. “Pularam o muro, levaram alguns objetos como um compressor, por exemplo. Fiz b.o na polícia, mas não deu em nada. É tudo molecada”, contou.
Visitando os comércios, a preocupação se repete. Uma moça de 22 anos, que preferiu não se identificar, tem um pet shop na região há 3 anos. O lugar não chegou a ser alvo, mas na vizinha já houve tentativa.
Crianças usuárias de drogas tem bastante. “Eles pedem coisa para vó, mas a gente sabe que é para trocar por droga. Eu acho um bairro perigoso”, avaliou.
Ainda conforme relatado, a princípio o que tem de segurança é uma grade na fachada do comércio e procura fechar antes do escurecer da noite.
A vizinha, a qual foi vítima de tentativa, é Sirlei Espinoza, de 31 anos. Ela tem uma loja de roupas, que fica anexo à sua residência. O que a “prende” na região são as vendas. “O ponto é muito bom e aliado com a casa, para mim que ganhei bebê agora é mais fácil de administrar”, conta, mas lamenta que não possa exibir os produtos com segurança na vitrine, sem o uso de grades de ferro. “Eu queria muito tirar as grades, mas não dá. Colocamos câmeras de segurança, reforçamos a porta dos fundos”, explicou.
Mesmo com todo o investimento em segurança, a mulher ainda tem medo. “Tem cliente que traz a carteira em sacolinha de mercado para disfarçar, não dá para dar mole”, contou, explicando ainda que fecha o comércio de acordo com o horário do supermercado logo em frente.
Sobre a tentativa de furto, ela explicou que deixou a motocicleta nos fundos. Como o local é uma vila de casas, outro morador deve ter deixado aberto e o criminoso entrou. O ladrão cortou o fio da motocicleta, provavelmente para tentar fazer uma ligação direta, mas não conseguiu.
Sirlei só percebeu quando tentou usar o veículo e não dava partida. Ao visualizar as câmeras de monitoramento, percebeu o rapaz na lateral da loja. “A ocasião fez o ladrão”, lamentou.
Sobre o bairro ser perigoso, ela diz que a Avenida Guaicurus, que fica próximo dali, é uma grande via para criminosos. “É muito rápido, eles pegam a avenida e fogem”, conta. Mesmo diante de toda a situação, ela se sente “entre a cruz e a espada”. “Acho perigoso, mas o ponto é bom, por isso não sei se mudaria daqui”, comentou. “Não queria essa ‘fama’ para o bairro”, concluiu.
No mesmo bairro, encontramos a diarista Alexandra Lino, de 45 anos. Ela mora na região há 18 anos e também compartilha o medo e insegurança no bairro, que tem até furtos em pontos de ônibus. A concertina nova, de longe, mostra que a segurança teve de ser reforçada. Isso porque por duas vezes tentaram entrar na casa, onde mora com a filha, de 18 anos.
Da primeira vez, levaram uma motocicleta, televisão, mas a casa não tinha equipamentos de segurança. A última vez, há 4 meses, foi a mais assustadora, já que ocorreu na madrugada e as duas estavam dormindo. Elas acordaram com o barulho no telhado do quarto. “Eu liguei para um pastor que mora aqui perto e depois liguei para a polícia. Escutei quando o homem caiu no quintal, depois ele fugiu. Foi assustador, a gente ficou com muito medo”, contou, ao lado da filha.
Os policiais foram na casa, vasculharam a região, mas não encontraram. “Eu entendo, não dá conta. São muitos bairros”, afirmou. “O bairro cresceu bastante, ficou muito bom, mas falta infraestrutura e segurança, precisamos de um posto policial aqui”, explicou, lembrando ainda que conhece outros moradores também vítimas de bandidos, já que no grupo do WhatsApp do bairro frequentemente aparecem relatos.
PM diz que crimes reduziram
A 6ª CIPM (Companhia Independente da Polícia Militar), que atende toda a região do Bandeira, apresentou alguns dados que mostram redução de ocorrências no período de novembro de 2021 a janeiro de 2022 e novembro de 2022 a janeiro de 2023.
De novembro de 2021 a janeiro de 2022, por exemplo, foram registrados 67 casos de violência doméstica, 14 furtos, 3 roubos e 6 tentativas de roubos e furtos.
Já de novembro de 2022 a janeiro de 2023, foram 52 casos de violência doméstica, 19 furtos, 3 roubos e 2 tentativas de furto.
Os casos em geral resultaram em 1.280 ocorrências no período de 2021 a 2022, e 499 ocorrências de 2022 a 2023. Uma redução de 61,01%, conforme os dados apresentados à reportagem. Vale lembrar que os dados não abrangeram todos os bairros da região do Bandeira.
Já na parte da Polícia Civil, todo crime cometido dentro da região é registrado e investigado pela 4ª Delegacia de Polícia Civil, que fica localizada no Bairro Moreninha.
Poucos homicídios na região
A delegada titular, Sueili Araújo Rocha, explicou que a região é muito abrangente e que chega todo tipo de ocorrência, mas ressaltou que crimes de homicídios não são comuns na região. “Atendemos todo tipo de crime. Dos acidentes com vítimas em vias, até homicídios. Se comparar homicídios desta área com outras, podemos dizer que a região do Bandeira não tem sido palco desses crimes com frequência. Os que ocorrem estão ligados a outras mortes e normalmente vingança”, detalhou.
Agora, o que chama atenção e que não é exclusivo da região, já que vem ocorrendo por toda a cidade, são os estelionatos e furtos de fios de cobre.
“Um crime que saltou aos olhos em crescimento em 2022 foi o estelionato e todo tipo de fraude eletrônica, onde as vítimas são de pessoas idosas e menos instruídas a também pessoas bem instruídas, jovens e cidadãos em geral. Também em destaque foram os furtos de fios de cobre, tanto que em janeiro deste ano foi deflagrada uma operação que apreendeu uma tonelada de fios, com o envolvimento de todas as distritais e departamentos da PC”, explicou.
Conforme a delegada, houve uma certa diminuição, pelo menos nos registros feitos na delegacia. “O trabalho informativo feito pela Polícia Civil e imprensa em geral, percebe-se uma diminuição. Não tenho esses dados, mas falo com referência aos atendimentos e registros pelo nosso plantão”, informou. Ainda sobre os diversos crimes registrados no 4º DP, Sueili conta que apesar de poucos, os crimes de menor potencial ofensivo, como injúrias, ameaças e danos, registrados na distrital chamam atenção.
Para moradores, base da PM ajudaria
Moradores acreditam que uma base da Polícia Militar nos bairros seria a solução para reduzir a criminalidade.
A Polícia Militar informou que não existe previsão de instalação de novos postos físicos de policiamento nesse molde antigo de base da PM nos bairros.
“O molde antigo de base comunitária foi substituído pela implementação do OCOP, que é um modelo que visa o aumento das viaturas de radiopatrulhamento, que são monitoradas em tempo real e executam o policiamento de acordo com o registro das ocorrências, com base na mancha criminal de determinada localidade”, explicou a assessoria da PM.
Porém, o curso para 500 vagas de soldado está em andamento e, se tudo ocorrer como previsto, se formam ainda este ano.
Confira as reportagens da série sobre segurança pública
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