As confissões finais de Charles Manson, o mais infame psicopata vivo
No San Joaquin Valley, na Califórnia, entre Bakersfield e Fresno, na periferia da cidade cheia de moscas, de vento, de fedor e de ar seco de Corcoran, fica a ampla Corcoran State Prison, onde Charles Manson cumpre o restante da sentença de prisão perpétua pela participação nos assassinatos do caso Tate-LaBianca, que encerraram a era […]
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No San Joaquin Valley, na Califórnia, entre Bakersfield e Fresno, na periferia da cidade cheia de moscas, de vento, de fedor e de ar seco de Corcoran, fica a ampla Corcoran State Prison, onde Charles Manson cumpre o restante da sentença de prisão perpétua pela participação nos assassinatos do caso Tate-LaBianca, que encerraram a era de paz e amor, em 1969.
Ele acaba de entrar na sala de visitas. Não tem a mesma aparência de antes, claro, quando aparecia todo resplandecente em roupas de pele de veado com franjas, às vezes usando gravata ou um colete de patchwork, ostentando um cavanhaque sedutor e olhos loucos de Rasputin.
Era o tempo em que saltava da cadeira para atacar o juiz que presidiu o julgamento, segurando um lápis, pronto para perfurar a garganta do velho, antes de ser contido, ajudando a concretizar o veredicto de “culpado”. Esses dias se foram. Ele tem 79 anos. É um velho grisalho, com audição e pulmões ruins e dentadura rachada. Anda com uma bengala e a levanta saudando os visitantes, um deles uma morena esguia que ele chama de Star. “Star!”, diz. “Não é uma mulher. É uma estrela na Via Láctea!” Ele abre os braços, sorrindo, e ela flutua na direção dele.
De uma plataforma elevada no centro da sala, dois guardas armados com spray de pimenta e cassetetes ficam de olho no casal. Star tem 25 anos, vem de uma cidade à beira do rio Mississippi, foi criada como batista, veste-se muito bem e tem senso de humor. Já Manson é o assassino mais infame de todos os tempos. Foi chamado de “diabo” pela maneira como influenciou os seguidores a matar em seu nome.
Passou os últimos 44 anos na prisão e quase 60 anos encarcerado, o que significa que foi um homem livre por menos de duas décadas de vida. Nunca sairá de lá. Star, que não divulga o nome verdadeiro, vive em Corcoran há sete anos. Não foi a reputação assassina de Manson que a atraiu até aqui, mas sim a postura ambiental dele, pró-Terra, em favor das árvores, água e animais.
Ela ficou para se tornar a defensora mais ardente do criminoso, para comandar diversos websites “Dê uma chance a Manson” e para visitá-lo todo sábado e domingo, por até cinco horas por dia, desde que ele não esteja na solitária. “As pessoas acham que sou louca”, ela diz. “Mas não sabem. Eu nasci para isso”.
As regras da sala permitem um beijo no começo e no final de cada visita. É o que eles fazem. Depois, sentam-se um de frente para o outro a uma mesa. A primeira coisa que se nota em Manson é o X (mais tarde alterado para uma suástica) que ele marcou na testa durante o julgamento, para protestar contra o tratamento pela lei, um ato logo copiado por seus defensores – e tantos anos depois, pela garota sentada diante de si, Star, que recentemente também cortou um X na testa.
A segunda coisa é que a aparência dele é ótima. Apesar da idade, não há nada de velho nojento nele, nenhum pelo saindo das orelhas nem do nariz, ou baba nos cantos da boca. A camisa azul aprovada pela penitenciária não tem um único amassado, nem manchas de comida. Ele fala suavemente, muito diferente das entrevistas na TV nos anos 80 e 90, quando, por exemplo, inclinou-se em direção à jornalista Diane Sawyer, urrando: “Sou um gângster, mulher, eu pego dinheiro!”.
Manson suspira e senta, parecendo confuso. No entanto, antes que eu note, ele se aproxima e dá um peteleco na ponta do meu nariz, rápido como a língua de um sapo. Ele se inclina para a frente. Posso sentir a respiração dele na minha orelha. “Já toquei todo mundo no nariz, cara”, diz baixinho. “Não há ninguém que não possa tocar no nariz.” Pende para um lado e fala: “Sei o que você está pensando. Relaxe”. Um tempo depois, afirma: “Se posso encostar em você, eu posso te matar”.
Ele coloca a mão no meu braço e começa a esfregá-lo. Uma hora depois, estamos conversando sobre sexo no rancho nos velhos tempos, como era, com todas aquelas garotas ali, rapazes também, a cena de sexo grupal. “Foi tudo isso”, ele diz, colocando a mão no meu braço novamente, deslizando-a na dobra do cotovelo. “Era daquele jeito. Todos fazíamos. Não existe dizer ‘não’. Se eu te puxo, você tem de remar com a maré.
Você estava com alguém que todos querem.” Concordo. Por um momento, com a mão dele na minha pele, vejo como era. A sensação de ir com a maré é boa, mesmo se é a maré de Charles Manson e mesmo se, já que ele pode encostar em mim, ele conseguiria me matar, como provavelmente era também naquela época.
Enquanto isso, Star está organizando uma pequena comilança: doces, torta de abóbora, batata frita, bolo de morango, copos de manteiga de amendoim. Manson pega um doce e toma um refrigerante. É assim que ele passa o tempo hoje. É assim que ele espera a vida acabar.
O que a maioria das pessoas sabe e acredita sobre Manson deriva quase totalmente do relato de 600 páginas feito pelo promotor público Vincent Bugliosi sobre os crimes, a investigação e o julgamento, Helter Skelter (no Brasil, lançado como Manson, Retrato de um Crime Repugnante), com mais de 7 milhões de cópias vendidas desde 1974, mais do que qualquer livro sobre um crime na história. Ainda hoje, é uma obra assustadora, de fritar o cérebro.
Bugliosi descreveu assim: em 21 de março de 1967, depois de cumprir uma pena de seis anos por violar a condicional de uma prisão por falsificar um cheque de US$ 37, o criminoso de carteirinha Charles Milles Manson, de 32 anos, saiu de trás das grades e foi para o mundo de psicodelia, paz e amor de São Francisco. Era o Verão do Amor. Ele nunca tinha visto algo parecido – amor livre, comida de graça, muitos abraços, maconha e ácido, garotas, tantas garotas, muitas delas perdidas, simplesmente procurando alguém que lhes dissesse que elas tinham sido encontradas.
Charles Manson era seu homem. Ele tocava violão, tinha a aura de ex-prisioneiro, um bom discurso metafísico de liberdade. As mulheres o adoravam, começando com a bibliotecária Mary Brunner, seguida pela bonitinha Lynette Fromme (chamada de Squeaky), pela ninfomaníaca Susan Atkins e pela ricaça Sandra Good. Esse foi o começo do que o advogado mais tarde chamaria de “Família” – e também o início do fim para Manson.
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