VÍDEO: Vizinhos de siderúrgica de MS convivem com pó poluente e pedem socorro

Moradora conta que idosos e crianças estão apresentando problemas respiratórios e na pele

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Moradores mostram pó acumulado nas casas (Foto: Fala povo).

A população de vários bairros da cidade de Aquidauana, a 140 km de Campo Grande, afirma que há 7 anos sofre com o descaso e com a poluição gerados por uma empresa local.

Apesar de considerada um ícone natural e o portal do Pantanal de Mato Grosso do Sul, a cidade tem convivido com uma fumaça densa emitida por indústria siderúrgica.

“Nos ajude! Estamos pedindo socorro, por Deus eu te peço, tem piedade”, suplica uma moradora da cidade.

Ela conta que idosos e crianças estão apresentando problemas respiratórios e na pele. Muitos também há tempos tentam vender a casa, mas não conseguem negociar, pois não há compradores interessados naquela região.

Segundo ela, em alguns períodos do ano a situação fica menos grave, o que geralmente ocorre quando trocam os filtros das chaminés da fábrica. 

No entanto, neste ano, a emissão tem sido constante e muito perceptível desde março, dia e noite.

Por causa disso, os moradores precisam conviver com limpezas diárias das casas para tentar minimizar a presença da fuligem, mas são constantemente vencidos pela situação, já que a emissão não para e as superfícies de móveis e itens domésticos estão constantemente cobertas pelo pó preto (veja vídeo abaixo).

“Os pais das crianças que moram na região relatam que elas estão todas com problemas respiratórios, vivem com bronquite, asma, vivem na bombinha, vivem com gripe, que não passa. E os bebês engatinham, e ficam todos sujos de fuligem. Eu vejo que eles estão envenenados”, conta a moradora.

O que dizem os moradores 

“Não queremos que a Simasul feche, queremos que eles possam se adequar, mas pelo visto essa empresa não tem misericórdia e muito menos compaixão”, garante a moradora.

Ela conta que já procurou órgãos competentes para falar sobre o caso, mas nunca obteve respostas concretas. “Eu já denunciei no Imasul (Instituto de Meio Ambiente de Mato Grosso do Sul), na PMA (Polícia Militar Ambiental), já conversei com a promotora, mas não vemos solução”, afirma.

Além disso, ela diz que as autoridades alegam que “existem relatórios que mostram que está tudo certo, mas a nossa realidade, a nossa casa, é um fato. A realidade que a gente vive é um fato que combate o que dizem esses relatórios”.

“Na semana passada era possível ver a fuligem pela lâmpada da casa, de tão forte. É um descaso que deixa a gente mal, parece que a vida não tem valor. Aquelas crianças, sabe Deus, como vão crescer”, completou.  

Riscos para a saúde

A médica pneumologista Andrea Cunha explica que as indústrias, no geral, podem eliminar alguns tipos de fumaça que, dependendo da exposição, são capazes de gerar problemas respiratórios. 

“A fumaça, no geral, mesmo as fumaças comuns, já geram irritação nas vias aéreas, podendo dar sintomas de tosse, desconforto torácico, lacrimejamento, rinite, alergias nas vias aéreas superiores e sintomas de bronquite”, detalha a médica.

No caso de indústrias siderúrgicas, também podem ser eliminados alguns metais junto com as partículas emitidas. 

De acordo com a médica, se a exposição a essas partículas é persistente e frequente, pode ser gerada uma insuficiência respiratória.

“Essa inalação por tempo de exposição prolongado pode levar a doenças pulmonares que cursam com insuficiência respiratória crônica e com fibroses pulmonares”, explica a médica.

Moradores protestando contra emissões de pó da empresa (Foto: Fala povo).

Se a exposição à fumaça for aguda, ou seja, breve e intensa, isso pode gerar sintomas irritativos nas vias aéreas com sintomas agudos como tosse, cansaço e falta de ar, que predispõe principalmente a doenças respiratórias crônicas em pessoas que têm uma sensibilidade aumentada. 

“Já as pessoas que já têm doenças respiratórias como asma, rinite, DPOC (doença pulmonar obstrutiva crônica) e enfisema, podem ter agudização dos seus problemas respiratórios, ter exacerbações, ter crises respiratórias desencadeadas por essas fumaças”, esclarece a especialista.

Vários moradores apresentam os sintomas relatados pela médica. “As pessoas vivem sufocadas, com falta de ar. Elas vão limpar o nariz ao acordar e só sai carvão. Os móveis de dentro da casa são todos pretos de carvão”, relata a mulher com quem o Midiamax conversou.

Falta de diálogo com a empresa 

“Teve uma época que os vereadores nos ajudaram a dialogar com a empresa. Só que depois eles foram perdendo força política e não conseguiram mais negociar com a indústria”, detalha a moradora.

A população quer dialogar com a empresa, no entanto, nunca conseguiu. Pelos canais de ouvidoria da empresa, nenhuma conseguiu resposta.

“Nas redes sociais, eles colocaram lá ‘sua opinião faz a diferença’. Nós colocamos um monte de comentários lá, mas eles não responderam nenhum. A ouvidoria deles é fake (falsa), é uma ouvidoria que não funciona”, desabafa a mulher.

Segundo ela, há cerca de 10 dias, no dia 24 de agosto, a empresa marcou uma reunião com moradores para a tarde do dia 27, mas logo depois mandaram um aviso desmarcando a reunião.

Diante disso, no dia 28 de agosto, moradores dos bairros afetados foram para a frente da empresa protestar e pedir para serem ouvidos. A ação não resultou em nenhuma ação por parte da siderúrgica.

O que diz o Imasul

O Imasul reconhece que a empresa apresenta irregularidades. Desde 2022, o instituto acompanha a situação, sendo que a primeira inspeção ambiental foi realizada em 2022, segundo o Imasul.

“A fiscalização envolveu a análise documental, a vistoria das instalações e a verificação do cumprimento das condicionantes estabelecidas na LO (Licença de Operação). Além disso, foram analisados relatórios semestrais apresentados pela empresa e verificado o cumprimento de uma notificação anterior que exigia medidas corretivas específicas”, disse o instituto ao Midiamax por meio de nota.

“Na data da fiscalização, a empresa Simasul Siderurgia Ltda. estava operando regularmente em relação às condicionantes estabelecidas na Licença de Operação n. 001697/2023, válida até 22/08/2027. No entanto, foi constatado o não cumprimento de notificação anterior, o que resultou na aplicação de multa e na imposição de novas exigências para regularização”, detalhou a nota.

O Imasul realizou essa fiscalização após o recebimento de denúncias. A fiscalização identificou irregularidades, que foram registradas e abordadas com a aplicação de multa e a emissão de nova notificação, exigindo o cumprimento integral das medidas corretivas. 

“Essas ações visam assegurar que as preocupações levantadas pela população sejam devidamente tratadas e corrigidas”, afirma outro trecho da nota. O órgão garante que a situação será novamente verificada.

“O Imasul reforça que já está analisando as documentações atuais do empreendimento e fará fiscalização in loco para averiguar a situação, garantindo que todas as medidas necessárias sejam tomadas para resolver eventuais irregularidades constatadas”, afirmou o órgão.

O que diz a prefeitura

O Midiamax entrou em contato com a prefeitura de Aquidauana na terça (3) e na quinta-feira (5). 

No entanto, em nenhuma das tentativas foi concedido posicionamento da administração municipal sobre a situação. O espaço continua aberto para que esclarecimentos sejam dados. 

Moradores protestando contra emissões de pó da empresa (Foto: Fala povo).

O que diz a empresa

“É mentira que não tem diálogo. Quem quiser conversar, é só ir nas reuniões com a  comunidade”, disse a Simasul Siderurgia Ltda ao Midiamax, por meio de sua assessoria de imprensa. 

Ainda de acordo com a empresa, atualmente a indústria gera 450 empregos diretos e mantém diálogo aberto com moradores. 

“Visitamos a casa dos moradores quando problemas são comunicados a nós e, quando não tem reclamação, visitamos também”, disse a siderúrgica. 

“Além disso, todos os meses fazemos uma reunião com a comunidade, que é aberta ao público. Nesta semana, inclusive, tivemos uma. Todas as pessoas que registram reclamações sobre o pó foram convidadas”, ampliou a assessoria. 

No entanto, segundo a empresa, muitos dos moradores que alegam ter problemas com poluentes emitidos pela siderúrgica não comparecem às reuniões. 

“Na última, só foram três desses moradores que sempre reclamam. Nós informamos tudo o que já foi investido em relação ao controle do pó. As pessoas que estavam na reunião tiveram essa devolutiva da empresa”, completou. 

“Sempre que tem alguma coisa que está fora da lei, a gente adequa. O Imasul encontrou inadequações, mas isso foi resolvido. Hoje estamos dentro da lei”, garantiu a empresa. 

Confira nota emitida pela empresa:

“A Simasul tem mais de 19 anos de atuação em Aquidauana/MS e desenvolve sua atividade de Indústria de Aço e de Produtos Siderúrgicos amparada pela Licença de Operação expedida órgão ambiental competente – Imasul. 

No decorrer das suas atividades, a Simasul reverencia toda e qualquer notificação emitida pelos órgãos oficiais, apresentando respostas tempestivas, que comprovam, através de elementos técnicos e jurídicos, a sua operação industrial satisfatória, dentro dos padrões de uma atividade de siderúrgica.

A Simasul desenvolveu robusto arcabouço de ações técnicas propostas para sanar pontuais não conformidades identificadas no processo industrial, sob o aspecto estrutural e ambiental, as quais resultaram na atual operação ambientalmente controlada, com observância às normas ambientais vigentes, de forma a mitigar eventuais incômodos e transtornos à comunidade local.

Neste cenário, a Simasul reforça em suas ações diárias o compromisso com o meio ambiente, com a saúde e bem estar da comunidade local e de seus trabalhadores.

Em relação ao diálogo com a comunidade, fazemos visitas periódicas no entorno e realizamos uma reunião mensal, inclusive no dia 04/09/2024 foi realizada a última reunião agendada com a comunidade onde estiveram presentes somente 3 representantes e os principais agentes de reclamação não compareceram, impossibilitando assim que esclareçamos de forma individual as principais ações de correção realizadas. 

Reiteramos nosso compromisso com a comunidade e nos dispomos sempre a debater de forma igualitária as questões que envolvem nossa atividade perante a comunidade.”

Vídeo mostrando o pó acumulado nas casas:

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