Usuários de drogas montaram um acampamento em frente à rodoviária de Campo Grande. A cena chama a atenção de quem passa pelo local nessa segunda-feira (18) e escancara um problema que só cresce na região: o aumento do número de usuários de drogas em situação de rua e a consequente alta na criminalidade na região.

Quem passa pela avenida Gury Marques pode ver um tipo de acampamento improvisado, com cama, cadeiras e roupas no canteiro central, em frente à rodoviária de Campo Grande. No entorno também é possível ver bastante lixo pelas ruas, como sacos plásticos e embalagens de marmitex.

Em poucos minutos da equipe do Jornal Midiamax no local, é possível identificar a situação com as quais moradores e trabalhadores convivem diariamente. Há um grupo de pessoas dormindo na cabana improvisada, outras em uma roda e usuários visivelmente alterados, sujos e entrando e saindo da rodoviária.

(Foto: Nathália Alcântara, Jornal Midiamax)

Para quem trabalha na região, a presença dos usuários é constante, bem como o medo de assaltos. Motorista de 45 anos disse ao Jornal Midiamax que recentemente presenciou uma briga entre duas mulheres e que acha que falta policiamento na região.

“A gente sempre fica sabendo de assaltos, crimes na região. A rodoviária está jogada, cheia de usuários”, afirma ele, ao destacar que a presença de pessoas dormindo na região é constante, bem como os furtos.

Taxista de 60 anos afirma que já teve celular e cartão de crédito furtados às 8h enquanto trabalhava na rodoviária. Outros colegas também já foram assaltados da mesma maneira na região. “Eles estão migrando para cá e sempre tem gente que é vítima, às vezes, turista que chega e se assusta com a situação”.

Outro trabalhador da região há 16 anos afirma que a circulação de usuários de drogas aumentou consideravelmente após a pandemia na região. Ele conta que há pessoas mais agressivas, outras que furtam e roubam e também quem só dorme na região.

Na rodoviária de Campo Grande, funciona uma base da Guarda Municipal de Campo Grande. “Em relação aos cidadãos em situação de rua, a GCM faz o acompanhamento junto da SAS, que orienta as pessoas a procurarem abrigo do município”, esclarece a GCM.

Roubos e furtos constantes na região

Quem mora na região já se habituou aos furtos quase que diários, principalmente de fios. São diversos os relatos de moradores que tiveram itens furtados por usuários de drogas na região do bairro universitário, em Campo Grande.

Em janeiro, o Batalhão de Choque prendeu um homem, de 43 anos, que estava evadido do sistema prisional, com mais de R$ 50 mil em produtos furtados, em Campo Grande.  Ele foi preso na região do bairro Universitário.

O comerciante Leandro Exteca dos Santos, de 30 anos, tem há 10 anos uma bicicletaria. Hoje com alarme, câmeras. Apesar de felizmente nunca ter sido alvo de bandidos, ele tenta se proteger como pode. “Pode não inibir, mas ajuda. O alarme, por exemplo, é ligado a um aplicativo no meu celular, então qualquer coisa toca no celular”, explicou.

(Foto: Nathália Alcântara, Jornal Midiamax)

Ao lado dele, o bar da idosa Aparecida Maria Eduarda Dias, de 70 anos, não teve a mesma sorte. Segundo ela, em dois anos, o bar foi alvo três vezes de bandidos. “Eles pegam tudo e qualquer coisa para trocar por droga. Na última vez, eu estava em uma chácara, eles entraram, levaram dinheiro, televisão, sorvete e bebidas”, detalhou.

A idosa, que mora em outro bairro, tem o bar ali há 17 anos. Para não ser mais vítima, ela precisou reforçar a segurança na fachada e telhado, que foi por onde os criminosos entraram pela última vez. Em todos os casos, Aparecida diz não ter registrado ocorrência. “Eles passam aqui na frente, mas não adianta. Eu ligo, eles não vêm. Então, não procurei mais a polícia”, reclamou.

Cuidando sozinha do bar, onde 90% dos frequentadores são homens, ela diz que até se sente segura. “Se alguém quiser brigar eu já ‘toco’ daqui, não deixo não. Tento conversar e se brigar, não atendo mais”, contou, afirmando ainda que tem dado certo.

(Foto: Nathália Alcântara, Jornal Midiamax)

Avanço das ‘minicracolândias’

Desde a mudança da lei 6.368 de 2006, os crimes de posse ou porte de drogas para uso pessoal não são mais passíveis de prisão. Conforme explicado pelo advogado criminalista Gustavo Scuarcialuppi, o entendimento da legislação é de que não existe bem jurídico atingido com o uso de droga.

“No tráfico, por exemplo, nós temos o bem jurídico atingido que é a saúde pública. No caso da pessoa usar sozinha, não tinha um bem jurídico além do próprio corpo dela. Então, o direito penal não pode entrar em algo que não afete outras pessoas”, explica.

Dessa forma, Gustavo explica que o porte ou a posse de droga para uso pessoal continua sendo uma infração penal, mas não passível de prisão. As penas previstas são medidas socioeducativas ou prestação de serviço público. “Por isso, se o indivíduo ao final do processo nunca vai poder ser preso, fica vedada a prisão em flagrante. O que é feito na prática é o encaminhamento dele para a delegacia, para ele assumir um TCO (Termo Circunstanciado de Ocorrência), para comparecimento em juízo”, detalha.

Segundo o delegado titular da Denar (Delegacia Especializada de Repressão ao Narcotráfico), Hoffman D’Ávila, há cerca de um ano a delegacia começou a dividir o combate ao narcotráfico doméstico por região urbana. Em 2023, já foram duas operações policiais realizadas na Região Anhanduizinho, além da Operação Smoke House, deflagrada em toda Capital.

Acolhimento

Confira na íntegra nota da prefeitura de Campo Grande sobre a situação:

“A SAS informa que vem intensificando as abordagens, os pontos são mapeados pelas equipes do Serviço Especializado em Abordagem Social (SEAS) que realizam ações diárias, conforme as demandas fazendo a oferta dos serviços às pessoas em situação de rua, que tem por opção aceitar ou não o acolhimento. 

Caso a pessoa aceite os serviços ofertados, ela é encaminhada para uma das 4 unidades de acolhimento do município ou para alguma entidade cofinanciada para tratamento da dependência química. No total a SAS conta com 300 vagas em comunidades terapêuticas por meio da SDHU.

A SAS ressalta que as recusas de atendimento por parte da população em situação de rua são um direito garantido pela Constituição Federal de 1988, em seu Art. 5º, Inciso XV. Ocorre que, quando a pessoa está sob efeito de substância psicoativa, dificilmente aceita o acolhimento. No entanto, é importante salientar, que as equipes do SEAS retornam por diversas vezes durante a semana, aos locais onde houve recusa de acolhimento, sempre na tentativa de convencer a pessoa sobre a importância de ser acolhido em uma de nossas unidades ou em alguma comunidade terapêutica.

A Secretaria destaca ainda que de janeiro a dezembro de 2023, 1.230 pessoas passaram pelo centro POP para atendimento e mais de 2,2 mil pessoas foram abordadas pelas equipes do SEAS. A política de Assistência Social é levar a oferta de serviços da Rede de Assistência Social às pessoas em vulnerabilidade ou em situação de rua”.