Litopedia. Este é o nome científico do caso raro ocorrido em Aral Moreira que surpreendeu o país, quando foi constatada em uma idosa de 81 anos a existência de um feto calcificado com mais de 50 anos em seu útero.

Ela e a família só descobriram a situação na semana passada, quando a idosa apresentou problemas de saúde e precisou ser hospitalizada com diagnóstico preliminar de AVC (Acidente Vascular Cerebral), que acabou levando-a a óbito.

Um feto mumificado no corpo de uma mulher não é comum e pode ser ocasionado por uma gravidez ectópica, ou seja, quando o óvulo fertilizado é implantado fora do útero, que evolui para morte fetal e calcificação.

Em entrevista ao Jornal Midiamax, o ginecologista-obstetra Manoel Cordeiro explica que a litopedia é extremamente rara, com poucos relatos científicos no mundo inteiro, pouco mais de 300.

“A litopedia é um tipo raro de gravidez ectópica, e ocorre quando o feto de uma gravidez abdominal não reconhecida morre e se calcifica. O ‘bebê de pedra’ resultante pode não ser detectado por décadas, e pode causar complicações futuras”, explica.

Segundo ele, o sistema imunológico da mãe reconhece eventualmente o feto como um objeto estranho e, para protegê-la de uma possível infecção, reage revestindo o feto com uma substância rica em cálcio enquanto ocorre a desidratação dos tecidos. Uma parede é formada pela deposição de cálcio, o feto torna-se um litopédio mumificado.

“Para efeito histórico, a primeira menção a um litopédio foi dada por Albucasis (936-1013 d.C.), e a primeira descrição detalhada deve-se a Spach, em 1557. Atualmente, mais de 300 casos já foram descritos na literatura mundial”, explicou.

Um artigo publicado na Revista Brasileira de Ginecologia e Obstetrícia explica que a litopedia é um evento que ocorre em 0,0054% de todas as gestações, existindo apenas cerca de 330 casos conhecidos em todo o mundo.

Geralmente, a litopedia pode ser identificada com um simples raio-x abdominal. No caso relatado em MS, a dificuldade de acesso da idosa a cuidados médicos fez com que ela não tomasse ciência da condição por cinco décadas.

“Como ela não se queixou de sintomas como obstrução intestinal e outros, não buscou o atendimento”, explicou o médico.

Ao Jornal Midiamax, a filha de coração de Daniela, Roseli Ávalo, 21, contou que a mãe evitava sempre ir ao médico e dizia ter medo de hospital.

Idosa morreu após cirurgia para retirada do feto

Daniela procurou atendimento médico em Aral Moreira na semana passada, com quadro de AVC. Devido à gravidade, foi transferida para o Hospital Regional de Ponta Porã, onde deu entrada na quinta-feira (14), foi operada na sexta-feira (15) para retirada do feto do útero e morreu no sábado (16).

A partir da infecção constatada, equipe médica da UTI (Unidade de Terapia Intensiva) decidiu pela realização cirúrgica de emergência, para remover o feto e controlar o processo infeccioso. A cirurgia foi adotada como medida para tentar impedir o óbito da paciente, que não resistiu devido à situação em que se encontrava.

Daniela foi enterrada no cemitério de Aral Moreira e agora a família pede ajuda para construir um túmulo para a mãe. “Nós queremos também ajuda para construir a casinha do cemitério, se tiver voluntários para ajudar nós ficaremos muito grato. Nós não temos condições, por isso estamos pedindo ajuda se puder”, disse a filha.

Caso raríssimo será estudado

A família da idosa não sabe afirmar quanto tempo o feto ficou no útero da indígena, mas estima-se em torno de cinco décadas devido à idade dela. Em Ponta Porã, a idosa ficou internada na UTI do Hospital Regional, onde exames de imagens identificaram o quadro grave.

O caso raríssimo foi identificado pela equipe médica do Hospital Regional de Ponta Porã e deve ser tema de um artigo científico. De acordo com o hospital, a equipe médica se interessou em estudar o caso.