De fiado a doações, famílias carentes se ‘desdobram’ para suprir falta de merenda nas férias
Famílias carentes precisam “suprir” refeição que era fornecida pela escola durante o recesso; diariamente são servidas 192.826 refeições para 113,68 mil alunos da rede municipal
Thalya Godoy –
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“Você vai ao mercado com R$ 200 e não dá para comprar tudo, não dá para nada”. O relato da Lucilene Alves, de 33 anos, representa as dificuldades que uma família chefiada por uma mãe solo enfrenta para cuidar e alimentar os filhos de 10 e 6 anos e de dez meses de idade.
A situação aperta, especialmente, nesta época do ano, com a chegada das férias escolares na segunda quinzena de julho e as famílias deixam de contar com a merenda escolar na rotina das crianças.
Não é raro que em regiões periféricas algumas crianças tenham a merenda escolar como a única refeição do dia.
De acordo com a Semed (Secretaria Municipal de Educação), são servidas diariamente 192.826 refeições para 113.687 alunos matriculados em 243 unidades incluindo escolas, Emeis e entidades.
Mães e pais da Capital precisam se desdobrar com o orçamento apertado para “suprir” com a refeição que deixará de ser fornecida pela escola, o que pesa no bolso de quem já recebe pouco.
No caso de Lucilene, que vive na Comunidade Mandela, na região norte da Capital, ela não trabalha porque não consegue vaga para todos os filhos em uma unidade escolar perto de casa.
Somente a criança de dez anos estuda em uma escola da rede municipal e, no período de férias, a segurança alimentar fica mais difícil sem o apoio da merenda e com os poucos recursos da família.
Com o dinheiro somente do Bolsa Família, a mãe precisa comprar fiado para não faltar o mínimo no barraco, que ainda está em construção, e tem partes abertas que ficam expostas ao frio e à chuva.
“Faltar sempre falta, principalmente leite e fralda. Tá tudo muito caro. Ter carne é difícil, ninguém doa e eu não tenho como comprar”, ela conta.
O litro de leite próximo de casa custa R$ 8 e Lucilene explica que é difícil ir até um atacadista com as crianças. Assim, o jeito é recorrer a um mercado perto de casa.
Apesar do anúncio recente de deflação da economia, o que em tese representa alimentos mais baratos, a mãe afirma que no mercado tudo continua caro. Ter fruta em casa, por exemplo, é uma raridade.
“O óleo custa ouro. Fruta desde que o meu filho [de dez meses] começou a comer não sei o que é. Eu sou bem sincera, fruta os meus filhos só sabem o que é quando dá”, afirma.
A dificuldade de garantir refeições aos filhos durante as férias também é compartilhada pela Jéssica Tomiati, de 28 anos, mãe de três meninos de 11, 9, 6 anos e uma menina de dois anos.
Os garotos frequentam uma escola municipal e a situação da família vai ficar especialmente apertada com a chegada das férias a partir da próxima segunda-feira (17). De acordo com o calendário da Semed (Secretaria Municipal de Educação), as férias vão até 31 de julho.
“Fica mais complicado porque o marido da gente é pintor ou pedreiro e aí com esse tempinho de chuva não tem serviço. Eu tenho quatro crianças e três ficavam na escola e ficava só a neném em casa e só o marido trabalhando, eu tô meio precária agora, tá apertado”, ela conta. No dia da entrevista chovia em Campo Grande.
Jéssica ficou desempregada há dois meses e está em busca de emprego. A renda da família vem do benefício do Bolsa Família de R$ 950 e do trabalho do marido, como pintor.
Com o recesso escolar, a família terá que “custear” mais três refeições que antes eram fornecidas pela escola, o que vai impactar no orçamento já pequeno.
Já Ketlen Nogueira de Jesus, de 22 anos, conta que espera vaga na creche para três dos quatro filhos. Atualmente não consegue trabalhar com um emprego fixo porque precisa cuidar das crianças.
Na avaliação da mãe, o orçamento apertado poderia ter um certo alívio caso as crianças fossem matriculadas e recebessem a merenda. “Ia ajudar também, se pelo menos mais dois conseguissem vaga eu ia caçar emprego ou alguma coisa”, relata.
Os interessados em ajudar as famílias da Comunidade Mandela podem entrar em contato pelos telefones das lideranças, responsáveis pela distribuição do que é doado: (67) 9 9346-7696 (Greiciele) e (67) 9 9205-6047 (Márcia).
O que diz a prefeitura?
O Midiamax entrou em contato com a Prefeitura Municipal de Campo Grande para saber se as pastas da educação e assistência social prestam algum apoio para ajudar na segurança alimentar das crianças durante o período de férias.
A Semed (Secretaria Municipal de Educação) não elencou nenhum programa de apoio a essas famílias e respondeu que o recesso escolar faz parte do cronograma da Reme (Rede Municipal de Ensino), “sendo plenamente legal sua instituição e realização”.
“Este período não interfere nos 200 dias letivos previstos no calendário escolar, conforme legislação que prevê que os alunos devem ter 200 dias letivos de efetivo trabalho pedagógico em sala ou 800h”, diz a nota.
Já a SAS (Secretaria de Assistência Social) afirma que com a chegada das férias, as unidades de Cras (Centro de Referência de Assistência Social) organizam colônias de férias no Serviço de Convivência e Fortalecimento de Vínculos para as crianças e adolescentes.
Nesse espaço são servidas as refeições que fazem parte das atividades lúdicas e/ou recreativas para o público inscrito no SCFV da unidade.
“Neste caso, é feito um cronograma, sendo que todos os usuários, tanto da manhã quanto da tarde, continuam sendo atendidos, uma vez que este serviço não deve ser interrompido, diferentemente das aulas nas escolas. Sendo assim, as atividades são desenvolvidas nos horários mais convenientes aos usuários e estes são informados como se darão as atividades”, informou a pasta.
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