O serviço do Disque 100 do Ministério dos Direitos Humanos e da Cidadania registrou 261 violações contra indígenas em Mato Grosso do Sul no período de janeiro a abril deste ano. O número representa 2,17 casos por dia, uma média de uma violação a cada 11 horas. Um dos últimos casos envolvendo ação da Sejusp-MS (Secretaria de Estado de Justiça e Segurança Pública), no mês passado, terminou com a prisão de nove indígenas. Um deles, o ex-candidato ao Governo de Mato Grosso do Sul, Magno Souza (PCO), continua detido mesmo com ordem do TRF3 (Tribunal Regional Federal da 3ª Região) determinando soltura.

Conforme o balanço do Ministério, a maioria das violações denunciadas (117) é referente a crimes contra a integridade física dos indígenas. Dessas, 35 foram por falta de atendimento médico e outras 27 por maus-tratos.

Na sequência dos abusos envolvendo indígenas aparecem violações à integridade psíquica, com 93 violações registradas. Do total, 23 são de tortura psíquica e 21 de constrangimento.

Há ainda 29 violações por negligência e 12 de liberdade, sendo 7 relacionadas a direitos individuais e outras 5 violações pela liberdade sexual de indígenas.

Outro dado preocupante é referente à frequência das violações. Conforme os denunciantes, 173 dessas violações são praticadas diariamente.

Por ter a maior população indígena do Estado, Dourados também é o local onde mais ocorrem as violações. Das 261 violações registradas, 91 foram naquele município. Outras 56 foram em Campo Grande e 48 em Ribas do Rio Pardo.

Por fim, os dados mostram que janeiro teve 47 violações denunciadas em Mato Grosso do Sul. O número subiu para 69 em fevereiro e saltou para 92 em março, até então o mês com maior número de denúncias. Até então, no mês de abril já havia 53 violações registradas.

Indígenas permanecem em área de retomada ao lado de obra de construtora de luxo, em Dourados (Foto: Marcos Morandi, Jornal Midiamax)

Comissão vem a MS após desocupação que terminou com prisão de indígenas

Após desocupação que terminou com 9 indígenas presos em área reivindicada como terra indígena, onde construtora iniciou obras de condomínio de luxo, em Dourados, uma comissão interministerial irá ao local em maio para mediar o conflito.

Em parceria com a Procuradoria Geral da República em Mato Grosso do Sul, Defensoria Pública da União e do Ministério Público Federal, o grupo vem com objetivo de ‘traçar diagnóstico’ da situação e instalar uma câmara permanente de mediação de conflitos. Também estão envolvidos o Ministério da Saúde, da Justiça e dos Povos Indígenas.

À Agência Brasil, o ouvidor Bruno Teixeira afirmou que a escuta visa identificar quais as políticas públicas que precisam ser implementadas na região e propor a instalação de uma câmara permanente de mediação de conflitos.

“É preciso um ambiente com mais tranquilidade para implementação das políticas públicas necessárias. Quanto mais célere for o processo de demarcação das áreas, mais rápida será a pacificação”, opinou.

Área reivindicada como indígena e obra de construtora de luxo (Foto: Marcos Morandi, Jornal Midiamax)

Despejos violentos

Entidades indigenistas buscam no STF (Supremo Tribunal Federal) tentar barrar ‘desmandos’ da Sejusp-MS (Secretária de Estado de Justiça e Segurança Pública de Mato Grosso do Sul). A petição será ajuizada pela Apib (Articulação dos Povos Indígenas do Brasil).

Em entrevista ao Jornal Midiamax, o coordenador jurídico da Apib, Maurício Terena, disse que a ação foi formulada para “dar um basta na Secretaria de Justiça e Secretaria de Justiça e Segurança em ações que, se não forem coibidas, podem produzir um novo massacre, como aconteceu na retomada Guapoy, em Amambai, no ano passado”.

Segundo o advogado indigenista, os casos de violência por parte do Governo de Mato Grosso do Sul contra os povos originários estão ganhando maiores proporções. “Estamos diante de uma política de segurança pública que não respeita direitos fundamentais dos povos”, dispara Maurício Terena.

Conforme o coordenador jurídico da Apib, os despejos sem ordem judicial contra os indígenas estão se tornando corriqueiros em MS. “A política de segurança pública em operações e retirada de indígenas de terras que não são demarcadas, acontecem de uma maneira extremamente violenta”, explica.

De acordo com definições jurídicas, a ADPF (Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental) é uma ação proposta junto ao STF em caso de extrema urgência ou perigo de lesão grave, ou ainda, em período de recesso, a ser posteriormente referendada pelo Tribunal Pleno.

Segundo Maurício Terena, a ADPF é inspirada no modelo impetrado contra a Secretaria de Segurança Pública do Rio de Janeiro, que restringiu ações nas favelas cariocas durante o período de pandemia.

Justiça Federal determina liberdade, mas indígena segue preso

Jornal Midiamax apurou que apesar da decisão expedida pela Justiça Federal, na sexta-feira (28), determinar que Magno cumpra a medida cautelar para uso tornozeleira eletrônica, a Sejusp (Secretaria de Estado de Justiça e Segurança Pública), por meio da Agepen (Agência Estadual de Administração do Sistema Penitenciário), não instalou o equipamento de monitoramento no indígena.

A justificativa dada por servidores da PED (Penitenciária Estadual de Dourados) a lideranças indígenas é de que o item ainda não foi instalado porque há falta de tornozeleiras eletrônicas no Estado. O Jornal Midiamax noticiou, no início de abril, que a demanda pelo monitoramento eletrônico aumentou em Mato Grosso do Sul. A reportagem questionou a Sejusp a respeito do prazo para instalação do aparelho, e aguarda retorno.

Outro aspecto que pode dificultar a liberdade do ex-candidato ao Governo de Mato Grosso do Sul em 2022 é o fato da retomada onde Magno de Souza vive não ter abastecimento de energia elétrica. Em razão disso, o indígena não conseguiria recarregar o aparelho, obrigação de toda pessoa que usa o item.

A Defensoria Pública da União, que representa os indígenas, trabalha para que a medida cautelar imposta pela Justiça seja derrubada e já apresentou este argumento à Justiça Federal. Magno de Souza está preso há 24 dias.

Lideranças também confirmaram à reportagem que além de Magno de Souza, outro indígena que fazia parte do grupo de nove presos no dia 8 de abril continua detido. Conforme as lideranças, o indígena teria outro mandado de prisão em aberto, o que impediu a soltura.

Sejusp diz que cumpriu ‘dever legal’

Jornal Midiamax questionou o Governo do Estado e a Sejusp (Secretaria de Estado de Justiça e Segurança Pública), por meio da assessoria de imprensa, a respeito da ação na área de Dourados.

Em resposta, a Sejusp informou que agiu no “estrito cumprimento do dever legal, para a preservação da ordem pública e da vida, uma vez que no local uma vítima, indígena, foi agredida com golpes de facão e ameaçada de morte com arma de fogo pelos acusados, que além da Lesão Corporal Dolosa e Ameaça a esta pessoa, cometeram ainda os crimes de Dano, Associação Criminosa, Esbulho Possessório – se o Agente Usa de Violência e, Posse ou Porte Ilegal de Arma de Fogo de Uso Restrito, uma vez que foi apreendida no local uma pistola adaptada para calibre 22 por eles utilizada”.

A secretaria também informou que “todos os acusados reconhecidos pela vítima foram presos e autuados em flagrante delito pelos crimes acima mencionados, sendo a prisão convertida em preventiva pela Justiça Federal, o que comprova a legalidade e necessidade da ação policial”.

A reportagem também tentou contato telefônico com Carlos Videira, mas as ligações não foram atendidas. As tentativas de contato foram devidamente registradas e o espaço segue aberto para manifestação. O Jornal Midiamax entrou em contato com o Ministério dos Povos Indígenas, para detalhes sobre acompanhamento federal das ações em Mato Grosso do Sul, e aguarda retorno.