Vídeos, fotos, áudios, textos… São diversas as possibilidades de conteúdo que podem transformar a vida de pessoas nas redes sociais. Isso porque quem “emplaca” ganha até título: digital influencer, ou seja, influenciador digital — pessoas com milhares (ou até milhões) de seguidores que se tornam referência na , capazes até de fazer dinheiro com publicidade para seu público.

Mas, alguns produtores de conteúdo na internet apostam em conteúdos que ultrapassam a legalidade e, apesar de expostos a quem quiser ver, seguem impunes — e conquistando milhares de visualizações com as postagens. Em , é o caso de alguns influenciadores ‘sobre rodas' que produzem, sem o menor pudor, vídeos durante infrações de trânsito.

Fora o grupo daqueles que buscam, acima de tudo, fama e visualizações, também estão os que postam irregularidades e infrações sendo cometidas sem preocupações. Condicionados por lei que, antiquadas, já não retratam a realidade de hoje, onde os crimes geram penas quando flagrados e ‘likes' quando postados.

Na última sexta-feira (13), o Jornal Midiamax noticiou o caso de pai que filmou e publicou seu filho, de 7 anos, conduzindo um veículo em rua de Campo Grande. Conforme a legislação, motorista que entrega carro para não habilitado pode ser multado e punido com falta gravíssima na carteira, mas se não flagrado, os órgãos de fiscalização ficam de mãos atadas.

Há pouco, outro caso publicado na internet. Um produtor de conteúdo automobilístico publicou um vídeo realizando manobras, ainda durante o dia, colocando a vida de passageiros em risco. O motivo? Impressionar outro motorista de um carro de alto padrão, além de conseguir engajamento nas redes.

E o público parece gostar. Na ocasião da postagem, o vídeo mencionado era o segundo mais visto entre os mais recentes nas redes do influencer. Um deles, a propósito, volta a explorar infrações de trânsito: agora, ele conduz um veículo em alta velocidade pela Avenida Eduardo Elias Zahran, em Campo Grande, em plena luz do dia.

Os casos demonstram uma verdadeira “anarquia” afixada no trânsito de Campo Grande, Mato Grosso do Sul e Brasil, explica o advogado especialista em Mobilidade Urbana, José Claudio Jr. Para o especialista, a atual lei que rege as normas de fiscalização no trânsito não considera as mídias sociais e deixa órgãos de fiscalização de mãos atadas.

“[Uma publicação] não é considerada [prova] porque a disposição legal disciplina que o próprio agente é quem precisa atuar ou algum equipamento. Não podemos pegar uma imagem que um terceiro fez e qualificá-lo como infrator”, explica o advogado. José Claudio ainda afirma que existe uma série de qualificações necessárias para que um agente possa autuar motoristas cometendo infrações. “Uma série de impedimentos para que as autuações ocorram”.

O advogado comenta que os vídeos, em grande maioria, possibilitam a identificação do autor e mudanças na lei deveriam ocorrer para que essa pessoa fosse notificada ou autuada pelos atos cometidos.

“Vemos esses influencers realizando manobras e sem receber qualquer tipo de punição. É incabível uma atitude dessas”. Entretanto, José Claudio ressalta sobre a importância da conscientização dos produtores desse tipo de conteúdo: “alguns grupos fazem esse tipo de manobras em locais fechados, propícios para essas atividades”.

Infrações que geram likes

Alguns influencers apostam em conteúdos que ultrapassam a legalidade e, apesar de expostos a quem quiser ver, seguem impunes — e conquistando milhares de visualizações com as postagens. Em Campo Grande, é o caso de alguns influenciadores ‘sobre rodas', que produzem, sem o menor pudor, vídeos durante infrações de trânsito.

Em suas redes, há diversas filmagens — muitas feitas em primeira pessoa, o que também configura infração de trânsito — de carros transitando acima dos limites de velocidade, realizando manobras perigosas ou até mesmo colocando a vida de terceiros em risco. Tudo é filmado e compartilhado sem medo de consequências ou da própria lei.

Nas imagens é possível ver o condutor ultrapassar a velocidade da via, além de realizar manobra perigosa e colocar a vida de terceiros em risco, ao avançar sobre uma faixa onde uma pessoa atravessava. Sem flagrante, o motorista não pode responder pelo excesso de velocidade.

No vídeo em questão, excesso de velocidade foi apenas uma das infrações cometidas. Segundo o especialista em trânsito Herivelto Moisés, o condutor utiliza do veículo para demonstrar ou exibir manobras perigosas mediante arrancada brusca ou derrapagem, infringindo o artigo 175 do CTB (Código de Trânsito Brasileiro).

Como punição, o motorista está sujeito a receber uma gravíssima, multa de quase R$ 2 mil, do direto de dirigir e apreensão do veículo. O especialista ainda salienta que a atitude do condutor pode colocar a vida de terreiros em risco.

“Tem uma pessoa atravessando a via na faixa de pedestres, ainda que o sinal esteja verde para o motorista. A pessoa está atravessando a faixa e ele dá uma acelerada, que assusta esse transiente”. Moisés explica que a situação pode ser considerada contraversão penal.

Vale lembrar que a Avenida Eduardo Elias Zahran recebeu câmeras nos semáforos, tecnologia implementada para melhorar o fluxo de veículos. Todavia, elas não podem auxiliar o trabalho de fiscalização.

Isso porque, de acordo com a Agetran (Agência Municipal de Transporte e Trânsito), as câmeras instaladas nos semáforos ao longo de toda a via não são de videomonitoramento, mas fazem parte do sistema semafórico em tempo real e têm como função realizar a análise de quantos veículos passam para fazer a programação do temporizador do semáforo.

Lei contra ‘anarquia no trânsito' é vetada

Em 2020, o Projeto de Lei 130/2020 foi apresentado à Câmara Federal. O texto alterava a Lei nº 9.503, de 23 de setembro de 1997, para dispor sobre as sanções por divulgação, por parte do infrator, de condutas infracionais de risco praticadas por ele, nas redes sociais e outros meios de divulgação digitais, eletrônicos ou impressos.

A nova emenda, apresentada pela deputada Christiane de Souza Yared (PL/PR), previa vedar a divulgação, a publicação ou a disseminação, em redes sociais ou em quaisquer outros meios de divulgação digitais, eletrônicos ou impressos, do registro visual da prática de infração que coloque em risco a segurança no trânsito; e altera a Lei nº 9.503, de 23 de setembro de 1997 (Código de Trânsito Brasileiro).

Após aprovado, a PL que buscava facilitar o trabalho de agentes e órgãos de trânsito, foi vetada pelo presidente Jair Bolsonaro. O veto foi apresentado à Câmara Federal em fevereiro deste ano.