Dourados celebra 81 anos com história contestada por polêmico relatório
Pioneiros criticam conclusões de historiador
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Pioneiros criticam conclusões de historiador
Dourados celebra nesta terça-feira (20) seus 81 anos de emancipação político-administrativa. Mas esse aniversário é comemorado em meio a divulgação de um polêmico relatório que contesta a história do município distante 228 quilômetros de Campo Grande. Fruto de pesquisas iniciadas em 2013, o documento recentemente entregue na prefeitura e na Câmara indica que essa terra já é centenária e renega o famoso “pioneiro” Antonio João, tenente do Exército Brasileiro que lutou na Guerra do Paraguai.
Essas conclusões, noticiadas pelo Jornal Midiamax no dia 29 de outubro, indignaram descendentes de pioneiros, que recorreram ao prefeito Murilo Zauith (PSB) e ao chefe do Legislativo, vereador Idenor Machado (PSDB), com protestos pelo completo descrédito ao estudo da Comissão de Revisão Histórica de Dourados. Queixam-se, por exemplo, de não terem sido consultados para a elaboração do relatório conclusivo dos três anos de estudos.
CONTESTAÇÕES HISTÓRICAS
Mas o líder dessas pesquisas, historiador Carlos Magno Mieres Amarilha, mantém suas conclusões ao propor o reconhecimento de 15 de junho como “o dia de todos os povos de Dourados”, em alusão à fundação do Distrito de Paz de Dourados, com sede no Patrimônio de Dourados (atual Dourados), nessa data, no ano de 1914, há 102 anos.
Professor da UEMS (Universidade Estadual de Mato Grosso do Sul), mestre em História pela UFGD (Universidade Federal da Grande Dourados) e doutorando em Educação na UCDB (Universidade Católica Dom Bosco), Amarilha defende ainda que seja retirada do dístico do brasão do município a frase “Terra de Antônio João”, pois garante que suas pesquisas não encontraram provas da passagem desse herói da Guerra do Paraguai por essa região.
ANIVERSÁRIO OFUSCADO
Na íntegra dos relatórios aos quais o Jornal Midiamax teve acesso com exclusividade, o historiador afirma que a data de hoje para celebração do aniversário nem sempre foi respeitada e até hoje é ofuscada pelas festividades de fim de ano. “A partir dos anos de 2006, o aniversário da cidade de Dourados comemorado todos os anos no dia 20 de dezembro deixou de ser uma data pomposa e representativa, digna de sua memória, pois perde a importância para o comércio aberto e para as festas de fim de ano realizadas na Praça Antônio João promovido pela Prefeitura Municipal de Dourados”, avalia. De fato, hoje as lojas da cidade abrem das 10h às 19h e o shopping funciona normalmente das 10h às 22h.
“Conforme os estudos aqui analisados, a data de comemoração do aniversário de Dourados, o dia vinte de dezembro, começa a ser efetivado no ano de 1953, aprovado na Câmara Municipal de Dourados como projeto de lei apresentado pelo vereador Aguiar Ferreira de Sousa e sancionada pelo prefeito Nélson de Araújo. Lei n.º 60, de 25 de novembro de 1953”, explica.
MUNICÍPIO CENTENÁRIO
“Observa-se que a data em comemoração ao aniversário da cidade de Dourados, deu-se tardiamente; apenas no ano de 1953 é que se constituiu um feriado municipal e somente a partir de 1954 que a Prefeitura Municipal de Dourados dá início à organização de festejos para a comemoração do aniversário de Dourados. Ou seja, após 40 anos da elevação do Patrimônio de Dourados como sede do Distrito de Paz de Dourados, assinada pelo governador em 15 de junho de 1914 e dezoito anos depois de sua emancipação política, sendo a data escolhida, o dia em que o governador assinou o Decreto n.º 30, que foi o dia 20 de dezembro de 1935”. Por isso, o relatório da Comissão de Revisão Histórica indica que Dourados já tem 102 anos.
ANTÔNIO JOÃO
Nome da principal praça da cidade, onde há uma estátua em sua homenagem, o tenente Antônio João, herói da Guerra do Paraguai celebrado pela história brasileira, jamais pisou pelas terras douradenses. Esse é um dos equívocos históricos apontados pelo relatório da Comissão coordenada por Amarilha. Mais uma vez, houve polêmica com descendentes de pioneiros.
O historiador culpa essa confusão por “empréstimos de histórias”. Segundo ele, a Enciclopédia dos Municípios Brasileiros (IBGE, 1958), fonte de muitos pesquisadores da formação de Dourados, informa equivocadamente “que o local escolhido por Marcelino Pires para a formação de um Patrimônio foi o lugar onde o tenente Antônio João Ribeiro foi morto durante a Guerra do Paraguai”.
MORREU LONGE
“[…] o tenente Antônio João Ribeiro foi morto em outro lugar, na Colônia Militar dos Dourados, em 29 de dezembro de 1864, nas proximidades do atual município de Antonio João (que não tinha nem esse nome, pois o mesmo chamava-se de Eugênio Penzo19 e por lei estadual, n.º 2198 de 08/09/1964, passou a denominar-se de Antônio João). De forma alguma, Antônio João foi combatido na atual cidade de Dourados”, revela.
Amarilha ressalta que essa informação é inaceitável, pois Dourados nem existia na época em que o herói da Guerra do Paraguai morreu. “Trocam-se fatos, transferem-se os eventos, como verdades absolutas e absurdas, com ‘empréstimos de histórias’ de outros lugares, trocando acontecimentos ‘famosos’ (como o caso de Antônio João na Guerra do Paraguai). Essas informações alteram os fatos, como que se fosse de pertencimento da cidade de Dourados. Lembramos que muitos episódios da Guerra do Paraguai em terras mato-grossenses são publicados em inúmeras fontes e todos apontam a Colônia Militar dos Dourados como o local em que o tenente Antônio João foi morto pelas tropas inimigas, e de forma alguma apontam a cidade de Dourados para tal episódio”.
DOAÇÃO SEM PROVAS
Ainda no relatório que aponta deslizes históricos apurados pela Comissão coordenada por Amarilha, é contestada a informação – também citada por meio da Enciclopédia dos Municípios Brasileiros (1958) – “de que o fazendeiro Marcelino Pires reservou dentro de suas terras uma área, ‘doando-a ao então povoado, para fim dela ser fundado um patrimônio’”, pois “não há provas documentais que comprovem tal fato, até o tempo presente”, segundo a pesquisa.
“Importante ressaltar que o Decreto n.º 402 de 03 de setembro de 1915, do governo do Estado de Mato Grosso, assegura uma reserva de terras por meio de lei para a criação do Patrimônio de Dourados e não por meio de doações, já que o Decreto n.º 402 em seu artigo primeiro é categórico em garantir 3.600 hectares de terras para patrimônio da povoação de ‘Dourados’ e também no mesmo Decreto deixa bem explícito a localização e os limites reservados para formação do Patrimônio de Dourados, assim constituído, ‘confinando pelo Nascente com terras occupadas por Laranjeira, Mendes & Companhia: ao Sul, com terras requeridas por Joaquim Teixeira Alves: ao Poente, com terras de Marcelino Pires Martins e o Norte, com o córrego Saltinho’ (DECRETO n.º 402, 03/09/1915)”.
“Conforme determina o Decreto n.º 402, as terras reservadas para a formação do Patrimônio de Dourados para povoação (não índia) foram delimitadas com as terras do fazendeiro Joaquim Teixeira Alves, da Companhia Mate Laranjeira (Laranjeira, Mendes & Companhia), da Colônia de Índios de Dourados e do fazendeiro Marcelino Pires. Ou seja, no Decreto n.º 402 é citado o nome de Marcelino Pires, não como doador das terras para a formação do povoado, mas que a sua fazenda, ou melhor, as suas terras, faziam divisas (limites) com as terras do recente criado Patrimônio de Dourados”, enumera o relatório.
FALTA ATA
Embora reconheça que “várias fontes (principalmente matérias de jornais, livros, memórias) apresentam o fazendeiro Marcelino Pires como o doador das terras para a efetivação do Patrimônio de Dourados”, o levantamento da Comissão de Revisão Histórica questiona a ausência de alguma ata para comprovar tal fato.
“Em alguns lugares no sul de Mato Grosso, quando os fazendeiros doam terras para a formação de um povoado normalmente lavram Ata e realizam uma cerimônia oficial. Exemplos da parte sul de Mato Grosso nesta época, os municípios de Aquidauana e Maracaju. Muito provavelmente os moradores daquela época não teriam problemas em fazer uma ata de cerimônia para fundar um povoado. Há indicações que no povoado do Patrimônio de Dourados já havia escola desde 1907, conduzida pelo professor Manoel Santiago Oliveira, por isso, não haveria problemas em constituir uma ata para tal evento”, aponta.
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