Investigação aponta que Engenex venceu licitações como laranja de Patrola sem ter maquinários

Engenex não tem nem funcionários, nem maquinário suficientes para conseguir cumprir o contrato, aponta investigação

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Ruas esburacadas e sem asfalto na gestão de Marquinhos Trad: empresas sequer tinham maquinário para atuar (Reprodução, PIC MPMS)

Procedimento de investigação que resultou na Operação Cascalhos de Areia, no último dia 15, aponta a estreita relação entre as empresas Engenex Construções e Serviços (CNPJ 14.157.791/0001-72) e a A.L.S. Construtora (CNPJ 15.084.261/0001-04). André Luiz dos Santos, o Patrola, figura como real proprietário das empresas, como já noticiado pelo Jornal Midiamax.

Nas investigações, o Gecoc (Grupo Especial de Combate à Corrupção) identificou que a Engenex Construções contratava pessoal meses antes de vencer as licitações com a Prefeitura de Campo Grande. O primeiro contrato teria acontecido em 2012.

Reprodução PIC (Procedimento Investigatório Criminal)

Os contratos seguiram na gestão de Marquinhos Trad (PSD) em 2018. O primeiro contrato de 2012 teria sido para limpeza e manutenção de praças, conquistado 5 meses após a Engenex ser criada, na época pelo pai de Mamed Dib Rahim.

Os outros três contratos firmados com a prefeitura são para serviços relacionados com execução de manutenção de vias não pavimentadas e estão em andamento.  

Funcionários fantasmas

O que a investigação aponta é que em 2011 a empresa tinha apenas um funcionário. Já em 2012, contratou 33 funcionários, registrados com funções relacionadas à construção civil. A maioria, no entanto, foi desligada meses depois.

Já em 2018, a Engenex Construções contratou 11 funcionários, quando conquistou as duas licitações, objetos de investigação. Foram contratados 5 motoristas de caminhão, um motorista de furgão, um operador de máquinas, um apontador de mão de obra, um arquiteto e um inspetor de terraplanagem e um na função de limpeza e conservação de áreas públicas.

É citado o Pregão Presencial 003/2018, sendo que no edital consta que a empresa deveria ter 6 caminhões basculantes, um caminhão pipa, um rolo compactador, uma pá carregadeira, um trator de esteira e um trator agrícola.

Fato que chama atenção é que a Engenex não tinha nem funcionários nem maquinário suficiente para conseguir cumprir o contrato. “Tudo indica que a empresa não executou, nem executa, por meios próprios os objetos conquistados em 2012 e 2018, sendo que ficaria a cargo de terceirizada”, aponta trecho do procedimento.

ALS seria verdadeira vencedora das licitações

Ainda conforme detalhado na peça, na concorrência do pregão também participou a ALS, empresa de André Patrola – apontado na investigação como amigo íntimo de Marquinhos Trad.

Trecho da investigação – Reprodução

Porém, a ALS desistiu dos lotes 3 e 4, justamente os conquistados pela Engenex. Além disso, a ALS aparece como locatária de veículos e maquinários para a empresa vencedora. Ou seja, após o contrato, Mamed teria usado da estrutura da ALS para execução dos objetos.

Mesmo assim, a investigação apurou que a Engenex não cumpriu contratos e deixou ruas de Campo Grande sem asfalto, apesar de documentos constarem obras.

“Há fortes indícios de que a empresa AL dos Santos, antes concorrente da Engenex, é a atual responsável pela prestação dos serviços da Licitação 003/2018”, finaliza o documento.

Obras não foram feitas

Conforme o relatório de investigações do Gecoc, a Engenex teria feito – conforme documentos apresentados – intervenções no São Conrado no mês de julho de 2022.

Desta forma, teria feito a limpeza e aplicação de 558m³ de revestimento na Rua Cel. Athos P da Silveira, entre as ruas Maj Juarez Lucas de Jesus e Vinícius de Moraes, num total de 480 metros. No entanto, as equipes foram ao local e não identificaram nenhuma intervenção.

Moradores foram questionados e responderam que há muito tempo não era aplicado revestimento primário na rua. Ainda enfatizaram que alguns meses antes, equipes fizeram serviços de raspagem com motoniveladora, mas nunca foi aplicado o revestimento primário na rua.

Ruas do São Conrado não foram pavimentadas, conforme determinava contrato – Reprodução

Os trechos foram fotografados e apontam ruas de terra, sem qualquer tipo de cascalhamento. Para o Gecoc, estes foram indícios de fraudes nas execuções dos contratos milionários entre a prefeitura e a empresa.

Também no São Conrado, a Rua Vitória Zardo teria sofrido intervenções pela Engenex, no trecho entre a Valter Gustavo Escheneek e Praia Grande. Da mesma forma, no local onde era para constar 378m³ de revestimento, as equipes encontraram ruas de terra esburacadas.

Já no Jardim Carioca, o mesmo problema foi encontrado na Rua Silvio Aiala Silveira. Em julho de 2022, trecho entre a Avenida Cinco e rua sem saída teria sofrido intervenções em 12 dias. No entanto, 60 dias depois as equipes foram ao local e encontraram as ruas sem qualquer indício de obras.

Engenex muda de proprietário

O empreiteiro Mamed Dib Rahim vendeu a Engenex Construções e Serviços por R$ 950 mil para Edcarlos Jesus da Silva e Paulo Henrique da Silva Maciel. O negócio chama a atenção nas investigações da Operação Cascalhos de Areia porque, somente com a Prefeitura de Campo Grande, a empreiteira tem mais de R$ 37 milhões em contratos.

O flagrante está documentado na Junta Comercial de Mato Grosso do Sul. Assim, segundo denúncias que levaram até a Operação Cascalhos de Areia, os três empresários seriam, na verdade, ‘laranjas’ dos verdadeiros donos ou operadores do esquema de corrupção.

Todos foram alvos de mandados de busca e apreensão no dia 15 de junho. A empresa Engenex também foi alvo. Em abril de 2021, a Engenex Construções e Serviços deixou de ser Empresa Individual de Responsabilidade Limitada, para se tornar uma Sociedade Limitada.

Isso, porque Mamed a vendeu para Edcarlos e Paulo Henrique, segundo documentos obtidos pelo Jornal Midiamax na Junta Comercial.

Apesar dos contratos milionários, que desde o início em 2018 superavam os R$ 5 milhões, a Engenex constava no papel como Empresa de Pequeno Porte. Ou seja, empresa que teria faturamento bruto anual de até R$ 3,6 milhões.

No entanto, em abril de 2021, Edcarlos Jesus e Paulo Henrique passaram a ser os sócios da empresa, com a transferência de 950 mil cotas. Edcarlos passou a ser responsável por 855 mil cotas, enquanto Paulo Henrique teria 95 mil cotas.

Contratos milionários

Em 2018, enquanto era de Mamed Rahim, a Engenex ganhou dois contratos com a Prefeitura de Campo Grande na gestão de Marquinhos Trad (PSD).

O primeiro contrato da Engenex, hoje com valor de R$ 14.542.150,59, tem Ariel Dittmar Raghiant atuando como ‘responsável técnico’, na região do Imbirussu, bem como no segundo contrato, com valor de R$ 22.631.181,87, na região do Lagoa. Ambos têm como objetivo a conservação das vias.

Ainda conforme o Portal da Transparência da Prefeitura de Campo Grande, os contratos foram assinados pelo então secretário de Infraestrutura e Serviços Públicos, Rudi Fiorese.

Rudi, que atualmente atua na Secretaria de Obras do Governo de Mato Grosso do Sul, justamente lidando com contratos de obras públicas, também teve o celular apreendido na operação.

Laranjas de Patrola

A primeira fase da Operação Cascalhos de Areia já reuniu indícios que apontam para suposta rede de empreiteiras nas mãos de laranjas e supostamente usadas por uma quadrilha para desviar dinheiro da Prefeitura de Campo Grande, com contratos firmados durante a gestão de Marquinhos Trad (PSD).

Os indícios colocam André Luiz dos Santos, o Patrola, no foco da investigação. Ele é apontado como verdadeiro operador das empresas investigadas. Além disso, segundo denúncia anônima que deu início às apurações, supostamente seria sócio do ex-prefeito Marquinhos Trad (PSD) no ‘esquema’.

O político do PSD nega.

No entanto, as informações apuradas mostram que o empreiteiro teria acesso facilitado pela administração municipal a licitações, e usaria a rede de empreiteiras nas mãos de laranjas para desviar milhões dos cofres municipais com obras que nunca teriam sido realizadas e seriam difíceis de ‘conferir’.

Os contratos visados pela suposta quadrilha são de cascalhamento em vias não pavimentadas e de aluguel de máquinas. Não é a primeira vez que o setor de construção civil de Campo Grande se torna pivô de escândalo de corrupção, como no caso da Operação Lama Asfáltica.

Empreiteiras de Campo Grande: ‘dança de laranjas’ e farra

Segundo fontes ouvidas pelo Jornal Midiamax, André Luiz dos Santos seria o operador do esquema de ‘laranjas’ para comprar as empresas e, assim, vencer todas as licitações de cascalhamento na Capital, em possível conluio com o então prefeito de Campo Grande, Marcos Marcello Trad.

André, inclusive, teria ganhado o apelido de ‘Patrola’ justamente por usar basicamente uma patrola para ‘disfarçar’ os serviços contratados na hora da medição, que é sempre realizada por um fiscal do órgão público.

Porém, segundo fontes ligadas aos órgãos de controle externo que acompanham os contratos, há elementos colhidos na busca e apreensão que já devem comprovar a suspeita e implicar o ex-prefeito no esquema de corrupção.

A suspeita da investigação se deu a partir de indícios que comprovariam a transição dos contratos entre empreiteiros, para pessoas que não são do ramo, sempre a preços muito baixos.

Patrola e Marquinhos teriam revoltado servidores

De acordo com a denúncia, Patrola venceria licitações de cascalhamento de vias não asfaltadas, “para evitar fiscalização na execução dos trabalhos”, já que seria mais difícil de medir o serviço que sequer havia sido realizado.

A denúncia aponta ainda que o fiscal apenas tirava uma foto de uma única pá carregadeira no local, como ‘prova’ da medição do serviço. Com o dinheiro das licitações vencidas por Patrola, Marquinhos compraria imóveis, que seriam gerenciados pela esposa do empreiteiro, em Campo Grande.

O servidor aponta na denúncia que esquema semelhante é realizado em Corumbá, na licitação de maquinários alugados e limpeza de ruas, e o valor da licitação ganha foi utilizado para a compra de uma fazenda em Corguinho.

Por fim, o servidor desabafa. “Estamos cansados de nos submeter a esse sujeito na Prefeitura Municipal, pois nos obrigam a fraudar licitação, já que a ordem vem de cima”.

A partir dessa investigação, os promotores Adriano Lobo e Humberto Lapa Ferri, da 29ª e 31ª Promotoria de Justiça do Patrimônio Público de Campo Grande, começaram a analisar os contratos de aluguel de maquinários e cascalhamento na Prefeitura, que culminou na operação deflagrada.

Acionado pela reportagem, Marquinhos Trad afirmou não ter nenhum tipo de negócio com André Luiz dos Santos, o Patrola, mas admitiu que o conhece ‘como amigo’.

Marquinhos: ‘denúncia fala da execução, não da licitação’

Marquinhos Trad foi novamente procurado pela reportagem do Jornal Midiamax para comentar se conhece Mamed e Edcarlos e as movimentações suspeitas no quadro societário de empreiteiras que contratou quando era prefeito de Campo Grande.

Marquinhos Trad foi novamente procurado pela reportagem do Jornal Midiamax e, em ligação documentada, negou as suspeitas da investigação, mas admitiu que é ‘apenas amigo dos empreiteiros’, mas que não mantém nenhuma relação de negócios com nenhum deles. Ao ser questionado sobre Edcarlos, Marquinhos negou sequer conhecer o empresário.

Anteriormente, questionado se acompanhava a execução dos contratos de cascalhamento em bairros sem asfalto enquanto prefeito, Marquinhos desacreditou a denúncia e citou contratos do Governo de MS.

“Tudo pregão eletrônico. Não existe. Se você ler de fato a denúncia anônima de 8 linhas eles falam da execução, não da licitação. Além disso, faz o levantamento dos valores de contrato que ele tem ou teve durante meus 5 anos e o que ele tem no Governo do Estado. Por que vocês não fazem isso?”, desconversou Trad.

No entanto, ao contrário do que afirmou o ex-prefeito, o Jornal Midiamax divulga continuadamente informações sobre contratos públicos em Mato Grosso do Sul. O Jornal é pioneiro na cobertura profissional de atos oficiais e é um dos primeiros jornais brasileiros a criar uma editoria específica para o tema: Transparência.

Km de estradas é mais caro no Pantanal para empreiteira de Patrola

Assim, desde o primeiro dia da operação, o Jornal registra que, além dos R$ 24.705.391,35 em contratos com a administração municipal para serviços de cascalhamento na região do Prosa, Patrola mantém atualmente R$ 195,8 milhões em obras públicas na região do Pantanal.

A reportagem apontou inclusive que os valores pagos a outros fornecedores por quilômetro quadrado no interior do Estado são menores. Há menos de dois anos, um empreiteiro recebeu R$ 27,2 milhões para cascalhar 59,2 quilômetros de uma rodovia pantaneira.

Ou seja, a empresa fechou a licitação por R$ 459,6 mil o quilômetro de cascalhamento. Já a ALS Construtora recebeu da Agesul R$ 1,3 milhão por quilômetro, R$ 922,4 mil a mais por quilômetro de cascalho que o outro empreiteiro, para realizar exatamente o mesmo serviço em trecho semelhante da mesma rodovia.

Empreiteiro dos políticos

Segundo fontes que acompanham a atuação de órgãos de controle externo e combate à corrupção em Mato Grosso do Sul, ‘Patrola’ seria uma espécie de ‘coringa’ para políticos regionais.

Desta forma, as suspeitas são de que juntos implementariam supostos esquemas de desvio de verbas públicas em contratos de obras públicas com difícil aferição.

Como seria considerado ‘de confiança’, o empreiteiro assumiria a parte arriscada de colocar o CPF e o CNPJ à disposição, contando com mais aliados como ‘laranjas’.

Em troca, supostamente manteria verdadeiro propinoduto em Mato Grosso do Sul com devolução de parte dos lucros inflados para os ‘companheiros’.

Portanto, contratos estrategicamente visados por esquemas de corrupção, como locação de equipamentos, obras mais facilmente ‘disfarçáveis’, como cascalhamentos, manutenção de vias não pavimentadas, seriam os prediletos do esquema.

Com o avanço do sistema, supostamente para diversas prefeituras e órgãos públicos, ‘Patrola’ teria se tornado o “empreiteiro dos políticos”. No entanto, o estilo descuidado e fanfarrão do empresário teria colocado todos na mira de denúncias.

Há relatos de festanças regadas a churrascadas e outros tipos de prazeres que teriam se tornado verdadeiro palco para exposição de esquemas com detalhamento de como funcionariam e quem beneficiariam. Tudo sempre, segundo as testemunhas, intercalado com muita bravata.

André Luiz foi procurado pela reportagem do Jornal Midiamax em três ocasiões e não atendeu às ligações até a publicação da matéria. Todos os contatos foram devidamente documentados e o espaço segue aberto para manifestação.

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