O empresário Rafael Manella Martinelli, alvo de ação da Polícia Federal junto com os conselheiros do TCE-MS (Tribunal de Contas Estadual de Mato Grosso do Sul) Waldir Neves, Ronaldo Chadid e Iran Coelho, estaria negociando um acordo de não persecução penal.

Conforme despacho publicado nesta segunda-feira (26), a defesa de Rafael informou que o empresário “está em contato com o Ministério Público Federal para negociação dos termos do acordo de persecução penal”.

Ainda que o réu se compromete a informar o juízo assim que as tratativas se encerrarem. Outros quatro acusados também já apresentaram resposta à acusação, sendo eles Rolando Moreira Lima Bonaccorsi, Ricardo da Costa Brockveld, Paulo Antônio Morandi de Queiroz e Parajara Moraes Alves Junior.

Já a defesa de Ricardo Murilo Pereira pediu mais 30 dias para apresentar resposta, o que foi negado pelo ministro relator do STJ (Superior Tribunal de Justiça) Francisco Falcão.

O acordo de não persecução penal é um ajuste com a previsão de condições a serem cumpridas, ao final das quais se dará o arquivamento da investigação e a decretação da extinção da punibilidade.

Sigilo negado

No último dia 14, foi publicada decisão sobre pedido de sigilo nos autos do processo contra três conselheiros do TCE-MS. O pedido foi feito pela defesa de Ronaldo Chadid, por causa dos dados bancários inseridos no procedimento.

Os ministros da Corte Especial do STJ acompanharam o voto do ministro relator, Francisco Falcão. Conforme a decisão, a defesa de Chadid pediu o desentranhamento dos documentos relacionados às medidas cautelares, de afastamento de sigilo bancário e fiscal.

O pedido seria para o desentranhamento ou decretação de sigilo nos altos, alegando suposta violação dos princípios constitucionais da intimidade e privacidade. No entanto, para o ministro relator, não há necessidade de decretar o sigilo.

Além disso, lembrou que no pedido a defesa de Chadid alegou que “A exposição da privacidade e da intimidade é tamanha que acarreta riscos à segurança individual dos investigados, possibilitando que seus dados sejam usados para prejudicá-lo por terceiros e pessoas mal-intencionadas”.

Porém, não apresentou situação fática ou elemento concreto. Mais ainda, o ministro pontuou “Cumpre destacar que o agravante não demonstrou receio no tocante à sua segurança ao manter sob sua guarda e na posse de terceiros, no caso a assessora Thais Xavier Ferreira, vultosa quantia de dinheiro em espécie, apreendida no curso das investigações quando do cumprimento de medida de busca e apreensão, e que ensejou o oferecimento de denúncia pela prática do crime de lavagem de dinheiro em desfavor do agravante”.

Conselheiros continuam afastados

Na decisão que manteve o afastamento dos conselheiros do TCE-MS Waldir Neves, Iran Coelho e Ronaldo Chadid, o ministro Francisco Falcão citou por algumas vezes a gravidade dos crimes cometidos. Nas palavras dele, isso visto que o TCE-MS é visto como espelho e modelo de gestão pública.

Conforme o ministro do STJ, ainda se mantêm as motivações para que os conselheiros sigam afastados de suas funções. Inicialmente, o pedido feito pelo MPF (Ministério Público Federal) e deferido determinava 180 dias de afastamento.

No entanto, o ministro entendeu que continuam válidos os motivos. “Os fatos apresentados nos autos evidenciam a existência de graves irregularidades na contratação da Dataeasy”, aponta.

Também na decisão, o ministro relembra que fica evidente a atuação de Waldir Neves na contratação da empresa e ainda de Iran Coelho na execução, fiscalização e renovação dos contratos, aditados até mesmo após a primeira operação, em junho de 2021.

“Os crimes causam mácula na reputação, credibilidade e imagem do TCE”, aponta o ministro. Para Falcão, o afastamento dos conselheiros resguarda o prestígio da função pública exercida pelos integrantes do tribunal.

“Continuar nos cargos é incompatível com a gravidade dos delitos imputados”, diz. Ao fim da decisão, o ministro ainda afirma: “Entendo serem gravíssimas as irregularidades e ilegalidades na realização de certames licitatórios e na execução de contratos milionários identificadas no curso das apurações que, em tese, podem configurar os crimes de fraude a licitação e peculato, ocorridos no seio da instituição que deveria servir como espelho e modelo de gestão pública, visto que tem por finalidade precípua zelar pela probidade administrativa para evitar a malversação do patrimônio público”.

Denúncia do MPF

Na denúncia feita pelo MPF contra Waldir Neves Barbosa, ex-presidente do TCE-MS, é apontado que o conselheiro agiu com um primo para desvio de valores relativos ao contrato com a empresa Dataeasy. A denúncia pede a perda do cargo dos servidores públicos envolvidos no esquema de fraude de licitação e peculato.

Conforme apontado pela Procuradoria Geral da República, o inquérito em que Waldir Neves e o sucessor na presidência do TCE-MS, Iran Coelho, foram denunciados, aborda o esquema de fraude de licitação. Especificamente, no contrato feito com a empresa Dataeasy Consultoria e Informática.

A denúncia chega a apontar que a empresa contratada foi a que mais recebeu recursos do TCE-MS entre os anos de 2018 e 2022. Além disso, foi identificado um “espantoso aumento no quadro de funcionários da empresa”.

Desvio de recursos públicos

Conforme declarado na denúncia feita pela vice-procuradora-geral da República, Lindôra Maria Araujo, o desvio dos recursos iniciou a partir da execução do contrato 03/2018, com pagamento de serviços não prestados.

Entre os denunciados, é apontado que Waldir e Iran teriam desviado valores públicos pertencentes ao TCE-MS. Nas investigações da Polícia Federal, o entendimento foi de que o TCE-MS não tinha qualquer controle sobre as tarefas demandadas e executadas pela empresa.

Mesmo assim, as notas fiscais eram assinadas por dois servidores, também denunciados pelo MPF. “A própria empresa aferia a produtividade mensal, emitindo documento que materializa os serviços supostamente executados”, diz a peça.

Usou primo para desviar valores

Em certo momento, a denúncia indica que Waldir Neves teria desviado valores a partir do primo, Willian das Neves Barbosa Yoshimoto. Para contextualizar, este é indicado na denúncia como funcionário da Dataeasy, que prestava serviços ao TCE-MS.

Porém, o que ficou constatado é que ele passou a prestar serviços de assessoria pessoal ao primo, o conselheiro Waldir Neves. Assim, fraudou os registros do e-TCE, para gerar produtividade falsa no sistema, com auxílio de um servidor comissionado do gabinete do conselheiro.

A denúncia traz a ficha de Willian, que é advogado e tem várias empresas, sendo uma delas em sociedade com Waldir. Além disso, ele foi admitido como empregado da Dataeasy em março de 2018, como administrador de redes e sistemas computacionais.

“Seu último salário base registrado na Relação Anual de Informações Sociais (RAIS), em dezembro de 2019, foi de R$ 15.194,00, valor que nunca havia sido registrado pela empresa antes, para nenhum outro funcionário”, identificou a investigação.

Anteriormente, Willian trabalhou em duas empresas, que também já prestaram serviços para o TCE/MS. Fato é que Willian é identificado como advogado na denúncia, sem experiência registrada com redes e sistemas computacionais.

“Fica evidente, portanto, que os denunciados viabilizaram um esquema criminoso que permitiu que fossem feitos pagamentos à DATAEASY, sem a necessária contraprestação dos serviços, o que ensejou o desvio de milhões de reais ao longo de todo o período de execução do contrato 03/2018 – de 2018 até os dias atuais”, diz trecho da denúncia.